Prólogo 2 - A deusa Arasy

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O reflexo do Sol na Lua iluminava seus olhos e corpo, e no momento, se alguém pudesse ver, eles passariam a impressão de que ela dormia serena, mas estava desperta.

Suas pálpebras fechadas, escondiam seus olhos de um castanho quase verde. Mas não a impediam de ver. Ela era uma deusa e não precisava dos olhos abertos para perceber qualquer coisa.

Visualizava a Terra com interesse. Todo aquele movimento que nunca parava. No entanto, não era isso que a mantinha imóvel.

Não.

Seu coração se apertava, pois sabia que o ciclo amaldiçoado havia recomeçado. Ela percebia os sinais. No tabuleiro eterno, as peças estavam, mais uma vez, posicionadas, e o véu entre elas se rasgava aos poucos.

Era inevitável: existência após existência, eles retornavam como uma mancha de sujeira, uma nódoa insistente. Não havia como impedir.

Para a deusa, escondidos entre a humanidade que os odiava e os temia, eles eram o resultado do que o amor entre seres de naturezas diferentes produzia: Monstros! Abominações! Imperfeitos!

Desde o começo do mundo a história seguia todas as vezes o mesmo enredo: vergonha e tragédia! Mas agora havia algo diferente. E Arasy estava disposta a interromper de vez esse ciclo. Ela estava cansada daquela situação.

Por mais que ela tentasse negar, o sentimento sujo de inveja e recalque por causa da perfeição e beleza de uma humana, a corroía mais uma vez.

Achava que tinha a resolução perfeita para a situação e pouco tempo para pôr em prática o plano. Nem meu marido Tupã, me impedirá, pensou.

O resultado da traição de Tau e Kerana havia produzido medo e incertezas para todos os deuses e semideuses. Era impossível romper com a natureza bestial daquelas criaturas, filhos que nem os patamares celestiais aceitavam.

A deusa do firmamento, abriu os olhos, se levantou e começou a se mover flutuando. Seus pensamentos estavam envoltos em uma certeza. Acreditava que agora poderia corrigir aquilo para sempre: os sete monstros lendários seriam destruídos de uma vez por todas e a "mais bela de todas", aquela a quem rendiam homenagens em forma de lendas, seria apagada de toda existência para sempre.

Os pais já tinham sido punidos, porém os seus filhos e ela ... Porãsy, ainda insistiam.

Não conseguia sequer repetir seu nome.

Porãsy já havia nascido, ela sabia com certeza, e conhecendo bem a profecia não existia como impedir o ciclo.

A raiva fugia ao seu controle, mesmo passado eras, como a geada que queima a vegetação, a tomava.

Isso a fez descer pelos patamares celestiais. Chega dessa história! Explodia em seu interior.

Matando esse círculo vicioso de abominação, a beleza e a normalidade seriam restabelecidas; quase podia sentir as cordas da vida afrouxando seu pesar.

O ciclo se encerra aqui, assim promete Arasy! Disse por fim.

E para sacralizar o juramento, um eclipse lunar cegou a noite por instantes. As marés se alteraram e as sementes demoraram a frutificar. 

Quem olhou para cima viu um círculo dourado ao redor da Lua e rezou para que a Grande Mãe estivesse calma, pois sua benevolência era sempre bem-vinda, mas seu azedume era um péssimo sinal. 


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Porãsy e o estranho mundo das histórias de seu avô indígenaOnde histórias criam vida. Descubra agora