TRINTA

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Juliette Freire.

O domingo amanheceu frio e cinzento, combinando com a forma que eu me sentia.

Tomei café com Cecile e logo Carla apareceu para nos chamar para almoçar em sua casa. Outros vizinhos vieram ver como eu estava. Fiquei surpresa quando duas vizinhas, mais curiosas, perguntaram quem era a Sarah.

- Aquela bonitona, a dona da Mercedes. - Explicou Lucy, uma delas, muito curiosa. Falei seriamente que era meia-irmã de Bil e logo tratei de trocar de assunto. Nenhuma das duas insistiram por detalhes.

Passei o dia na casa de Carla, mas levei o celular. Sarah não ligou. Carla comentou que era preciso arrumar o quarto que Bil ocupava, dar os remédios que ela não usaria mais e suas coisas. Ela insistiu em me ajudar. Na segunda faríamos aquilo.

Cecile dormiu a noite toda e eu fiquei na sala sozinha, deitada no sofá vendo televisão. Pensava nas decisões que precisava tomar. Agora eu era viúva e precisava trabalhar, arrumar um emprego, sustentar a casa, dar o melhor para a minha filha. Talvez, quando tudo isso estivesse acertado, eu pudesse destrancar a minha faculdade de Direito e terminar os estudos. Faltava um ano e meio. Eu teria melhores oportunidades de trabalho depois de formada. Eu sabia que minha vida seria diferente depois dali para frente. Eu não estava mais presa a Bil, mas isso não significava que estava aliviada.

Eu nunca cuidei dele por obrigação ou o culpava por cuidar dele.

E ainda sentia muito falta dele, apesar de saber que eu o perdi há muito tempo para aquela doença e de que nossa vida em comum não foi exatamente o que eu imaginava.

Mas não foi mesmo.

Mas mesmo assim eu demoraria até me acostumar com a sua ausência. Do mesmo jeito que eu demorei para me acostumar com a ausência do meu primeiro filho em meu ventre.

Flashback on.

Nós havíamos acabado de chegar do hospital. A sensação de perda era bastante evidente em nossos semblantes, principalmente para mim, que estava carregando uma criança na barriga.

Eu havia perdido o meu bebê com apenas seis semanas de gestação.

Eu me sentia vazia, uma tristeza enorme tinha me tomado, um lixo que não conseguiu segurar o próprio filho dentro do ventre.

Quando dei a notícia de que estava grávida para o Bil, ele ficou sem reação no primeiro momento, mas depois saiu gritando igual louco pela casa dizendo que seria pai.

Foi um dos melhores momentos da minha vida, ele me mimou tanto, me encheu de carinho, sempre que podia acariciava minha barriga dizendo que nosso filho seria lindo, esperto, que nós iriamos dar todo o amor e atenção do mundo para o fruto do nosso amor.

Bil também sempre me dizia que era o homem mais feliz do mundo, e que ninguém estragaria sua felicidade. A empolgação de Bil em ser pai me contagiava de uma maneira surreal, ele saía contando aos quatro ventos que seria pai, que ele finalmente teria um herdeiro. Eu achava lindo todo esse amor que ela já sentia pelo filho que nem havia nascido ainda.

Mas... Tudo mudou quando em uma noite, durante o meu banho eu comecei a ter sangramentos e dores na região do abdômen.

Juntei todas as forças que não tinha e gritei pelo Bil, que logo entrou no banheiro apavorado. No primeiro instante ele havia ficado imóvel de frente para o box, olhando para o sangue que estava escorrendo pelo ralo. Ele só saiu do transe quando eu o chamei novamente em um baixo sussurro.

- Bi-Bil... - Dizia me escorando no porcelanato gelado do banheiro. As dores que eu sentia estavam ficando tão fortes que já estava começando a delirar e a ponto de desmaiar ali no meio do box.

CHANTAGEM - SARIETTEOnde as histórias ganham vida. Descobre agora