20. Voltar a ver

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Josh Beauchamp

Alguns dias se passaram e o pai de Any finalmente encontrou um emprego. Ele iria servir mesas em uma lanchonete e parecia satisfeito com isso. Ainda não poderia sair da casa de Any, mas faria isso assim que tivesse acumulado uma boa quantia em dinheiro.

Eu e Any fomos comer lá um dia para ver como ele estava se saindo. Ela leu o cardápio para mim e só por piada eu pedi que ela repetisse a leitura algumas vezes. Mesmo respirando fundo e falando cada vez mais devagar, ela não demonstrou estar irritada e nem percebeu que eu estava apenas brincando, isso até eu começar a rir.

— Qual é o seu problema? — deu um tapinha em meu ombro.

— É incrível como é difícil você perder a paciência comigo.

— Não abuse. — riu. — Ei, uma curiosidade. Você se lembra de como são as letras?

— Vagamente.

— E as cores?

— Algumas mais do que outras. Eu sinto dificuldade em lembrar da diferença entre o azul e o verde, mas lembro muito bem do amarelo e do vermelho. Acho que as cores quentes são mais fáceis para mim.

— E o rosto das pessoas?

— Posso não lembrar com exatidão, mas tem detalhes específicos que ainda estão na minha memória.

— Isso te faz se sentir mal? Esquecer de como as pessoas se parecem?

— Acho que ninguém lida bem com isso. — sorri fraco. — Mas antes era bem mais difícil. O pior é querer saber como é uma pessoa que eu nunca vi. Como você. Eu nunca vi você.

— E se eu fizesse uma foto em auto relevo? Aquele museu faz isso, não é? Ajudaria?

— O auto relevo é mais uma sensação. Não dá para eu saber como você é apenas tocando em uma foto. É mais prático quando toco em seu rosto e ainda assim não é eficaz.

Any segurou minha mão e deitou a cabeça em meu ombro, finalizando o assunto. Encostei minha cabeça na dela e abri um pequeno sorriso. Eu não precisava vê-la para amá-la e isso fazia eu me conformar com a situação. Minha vida agora era aquela e eu já havia aceitado, acho até que não me acostumaria mais de outra forma.

Foi o pai de Any quem anotou os nossos pedidos e os trouxe depois de prontos. Ele estava feliz e falou a todo momento que era bom fazer algo digno pela primeira vez na vida. Me aliviava saber que ele estava mudando e que Any não teria que se preocupar.

Nos dias que se seguiram, eu esperei pela visita da minha mãe, mas já estava começando a achar que ela não viria. Porém, em uma tarde qualquer, enquanto eu ouvia música, alguém bateu em minha porta.

— Quem é? — perguntei antes de abrir, como fazia de costume.

— Sou eu, filho.

Era mesmo a voz dela.
Travei por alguns instantes com a mão sobre a maçaneta. Tudo bem, eu estava preparado. Respirei fundo e finalmente abri a porta. Antes de dizer qualquer coisa, minha mãe me deu um abraço apertado e um pouco aflito. Notei que seu cheiro ainda era o mesmo, algo como o aroma de Jasmin ao desabrochar durante a primavera.

— Ah, céus, eu estava tão preocupada! — ela disse com uma voz chorosa. — Você está bem? Que cicatriz é essa na sua testa!? — segurou meu rosto entre suas mãos.

— Não foi nada demais. — tirei as mãos dela do meu rosto. — Por favor, entre. — abri espaço para ela.

Nós dois entramos e eu ouvi os sapatos dela batendo contra o piso, aproximando-se e afastando-se, indo de um lado para o outro. Eu tinha certeza que ela estava analisando a minha casa.

Your Skin (Adaptação)Onde histórias criam vida. Descubra agora