𝙰 𝙴𝚜𝚝𝚛𝚊𝚍𝚊 𝚅𝚎𝚛𝚖𝚎𝚕𝚑𝚊

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Sabe aquele momento em que o protagonista do filme está passando por algo terrível e deseja com todas as forças acordar desse pesadelo?

Bem, caro leitor, pode parecer tolo, mas foi exatamente assim que me senti ao parar no cruzamento da Av. Padre Leonel Franco.

A cidade estava mergulhada no caos absoluto. Carros amontoados obstruíam o cruzamento, alguns deles envolvidos em acidentes terríveis, outros simplesmente abandonados. Minhas mãos se apertaram no volante quando um homem desesperado bateu na minha janela, implorando para ser deixado entrar.

Luhan estava me instigando a continuar dirigindo, e Trix gritou, levando as mãos à boca quando outro homem se lançou contra o primeiro, arrancando um pedaço de sua orelha. O sangue espirrou no vidro, manchando-o de vermelho vivo. O homem atacante estava completamente fora de controle, agindo como um animal enlouquecido. Dois estrondos de tiros ecoaram, minhas mãos apertaram mais o volante. Todo carioca estava acostumado a ouvir tiros, era rotineiro, mas dessa vez algo era diferente. Aqueles disparos fizeram-me tremer incontrolavelmente. Eram tiros de sobrevivência, o som angustiante do desespero, pessoas lutando para proteger a própria pele contra criaturas furiosas que, com dentes afiados, buscavam arrancar-lhes a carne. Engatei a marcha a ré e subi na calçada, por pouco não caindo no córrego. Troquei a marcha novamente e avancei pela contramão, passando perigosamente perto das árvores.

Trix estava abraçada a Luhan, cujos olhos estavam fixos na cena que se desdobrava do lado de fora da janela. Pessoas em estado de completa desespero corriam pelas ruas, algumas gritando, outras atacando umas às outras. Era uma loucura que não fazia sentido algum, algo saído diretamente de um pesadelo distorcido. Eu não conseguia acreditar no que estava vendo. O caos havia tomado conta das ruas, nossos corações batiam em ritmo acelerado, nossas mentes em estado de choque. O mundo que conhecíamos tinha desmoronado diante de nossos olhos, e estávamos apenas começando a compreender a extensão do horror que nos cercava.

Dirigi por mais 20 minutos, com os nervos à flor da pele e os sentidos aguçados ao máximo. Luhan gritou um aviso, mas meus reflexos falharam, e o impacto foi inevitável. O carro colidiu violentamente com alguém, os pneus rangendo no asfalto enquanto eu lutava para evitar que o veículo atingisse o muro.

- Ai, não, não, não... - Ouvi Trix abrir a porta do carro e sair, ignorando os gritos desesperados de Luhan que tentava fazê-la voltar. A teimosa garota se afastou do carro, e Luhan, em um gesto de pânico, soltou o cinto de segurança e correu até ela.

- Perderam o juízo, voltem para o carro! - Gritei, minha voz carregada de desespero. Luhan conseguiu puxar Beatriz, quando a menina que eu havia atropelado começou a se erguer do chão, mas sua condição era terrível. Seu braço esquerdo estava fraturado, com o osso exposto, e sua perna direita estava dobrada em um ângulo completamente errado. Trix, após vomitar, se recompôs e Luhan a arrastou de volta para o carro.

No entanto, a verdadeira dimensão do horror que enfrentávamos só se revelou quando chegamos à Rua 50. Era impossível prosseguir. Ambulâncias bloqueavam a estrada, portas abertas e macas ensanguentadas espalhadas pelo acostamento. Cadeiras de rodas viradas jaziam por ali. Centenas de pessoas vestidas com roupas hospitalares vagavam sem rumo, arrastando os pés no chão, alguns batendo seus corpos em uma barricada como se pudessem simplesmente atravessá-la por força de vontade.

O cenário era de completa devastação. Partes de corpos estavam espalhadas pelo chão, alguns carbonizados, outros visivelmente atropelados. A visão era tão horrível que senti meu estômago revirar, e minha mão apertou o volante com tanta força que meus dedos ficaram brancos.

As imagens diante dos meus olhos evocaram lembranças dolorosas do passado. Recordações da morte dos meus pais, da minha passagem pelo juizado de menores, dos olhares de pena e condenação das pessoas ao meu redor. Mas nada, absolutamente nada, podia se comparar à cena de horror que agora testemunhávamos.

𝚂𝚝𝚊𝚢 𝙰𝚕𝚒𝚟𝚎Where stories live. Discover now