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Gabriel

Eu não sabia como eu estava conseguindo levar a normalidade de ter Lia morando comigo. Era como ter chegar do outro lado da ponte e não pegar o pote com o tesouro. Eu me sentia casado, mas sem ter acesso à minha esposa.

Acompanhar a gravidez da Lia de perto tinha sido o maior presente que ela poderia ter me dado. Lembro-me que a primeira vez que ouvi o coração de Valentina bater, eu quis soltar fogos de artifícios e mostrar a todos o tamanho da minha felicidade. Outro presente foi Lia ter me deixado escolher o nome, me levando ainda mais para dentro do seu coração.

Então os meses passaram rápidos e tudo o que acontecia com elas, eu estava por perto. Ana havia começado a me dar mais um pouco de crédito depois de ver que sua amiga aos poucos nem lembrava mais os motivos que a fizeram chorar.

Eu sabia que a relação com seus pais ainda pesavam, mas como ela não tocava no assunto, eu não insistia, mas queria de alguma forma tentar fazer com seu relacionamento ultrapassasse a barreira da ignorância religiosa e pudessem curtir a preparação para a chegada de Valentina.

Na empresa, eu estava quase finalizando a primeira fase do projeto para enfim passar para a parte mais divertida: a criação. Tive algumas divergências com André pelo caminho, tudo porque ele estava querendo se meter no meu projeto e eu o vetei. Sentia uma certa tensão quando ele e Malu estavam no mesmo ambiente, mas desde que ela não me revelasse um bom motivo para mandá-lo para o hospital, eu apenas acompanhava de longe.

Lia estava pirando com seu TCC, na verdade, o seu professor estava pirando com ela. Cheguei até sugerir que ela trancasse o semestre para cuidar da gravidez, mas irredutível como sempre, achou que eu estava forçando-a a desistir por não sentir que ela conseguiria dar conta de tudo.

Às vezes, só às vezes, eu tinha vontade de segurar Lia pelos ombros e gritar e exigir que ela parasse de tentar ser durona quando estava na cara que não estava indo muito bem nisso. Mas bastava me olhar com aqueles olhos de cachorrinho que caiu da mudança e eu logo esquecia toda a raiva.

Fazíamos passeios, caminhadas, sessões de cinema, como se fossemos um casal de verdade. Era tudo o que eu queria, mas sentia um verdadeiro pânico só de pensar em falar sobre meus sentimentos e ela simplesmente ir embora. Então eu me segurava ao máximo para não estragar tudo.

— Que tal um filme e uma bacia de pipoca? – perguntei ficando de pé novamente e afastando minhas mãos de sua barriga.

— Posso escolher?

— Contanto que não seja Um amor para recordar, P.S. Eu te amo e nem Antes que termine o dia. Juro que já sei as falas decoradas de tanto que já assistimos.

O quinto mês de gestação havia sido o pior, até mais do que a fase dos enjoos. O corpo de Lia estava sofrendo com as mudanças e isso a deixou ainda mais sensível. Tínhamos horas a fio de filmes tristes e com muitas lágrimas. E quando por milagre, eu conseguia escolher uma comédia, tinha que ser A verdade nua e crua ou Muito bem acompanhada. Ou seja, de qualquer forma eu sofria.

— Você sempre tem péssimas escolhas – disse Lia baixando a blusa cobrindo a barriga.

— Só porque prefiro filme de ação ao invés dessas coisas melosas?

— Você não é nada romântico. Deve ser por isso que não arranjou uma namorada até agora.

— Filmes melosos não são os meus motivos para estar solteiro.

— Não?

— Não.

Meu único motivo por nunca ter me interessado por uma garota era porque Lia dominava cada pedaço do meu coração, não deixando espaço para mais ninguém, e olha que eu tentei. Quando vi que era inútil lutar contra, eu desisti.

A sua esperaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora