Capítulo 7

772 50 79
                                    


  Conforme o tempo passava, as coisas pareciam realmente se encaixar. Em todo aquele tempo que havia passado, Rafael só conversava comigo. Eu sentia algo estranho em relação a ele e a sua vida social, era claro que ele confiava em mim, mas eu era a única pessoa que ele conversava da nossa casa. Ele não falava mais com a mamãe, nem com o Fernando. Era como se eles não existissem. Ele passou a confiar tanto em mim e sentia felicidade por ficar mais tempo longe do quarto, estava comendo direito e fazendo o tratamento, mas quando o Beto, namorado da mamãe, chegava na nossa casa, ele ficava tão triste a ponto de não sair do quarto até que ele fosse embora. Fernando dizia que era frescura, que se ele não parasse com aquilo, ele morreria dentro do quarto porque o Beto ia se mudar para a nossa casa. Eu não havia falado pra ele aquilo, era óbvio que não sabia, então deixei que as coisas andassem com naturalidade até que ele descobrisse sozinho. Ele havia repetido o ano, mas não se importou muito com aquilo, acho que nem minha mãe. Ele ficou feliz por saber que alguns garotos que batiam nele tinham mudado de escola. Acho que agora as coisas ficariam bem até no colégio.

Saíamos mais, nos divertíamos muito e ele dizia que estava mais animado e que eu era seu novo amigo. No dia em que ele fez aniversário, comprei um box de uma série que achei que ele fosse gostar. Ele amou e estava ansioso para começar a ler todos e me dizer como era, porque era só daquela maneira que eu saberia da história mesmo...

– Você acha que o Rafa vai se dar bem com o Beto? Ele era tão grudado com o papai, acho que ele não vai gostar da ideia de ter outro cara tomando as rédeas e mandando nele, como da última vez. Pra falar a verdade, nem eu gosto muito dele... – comentei com o Fernando.

– Eu acho que ele deveria calar a boca e aceitar, a casa não é dele e o papai não está mais aqui.

Baixei o olhar.

– Nós temos que ser pacientes com ele, afinal é o mais novo e era mais grudado com o papai.

– Olha bem pra minha cara de quem se importa. Daqui a poucos meses, minha casa estará pronta e depois disso, vocês se virem, eu não vou estar mais aqui e eu não quero saber desse menino. Ainda bem que o papai não está mais aqui pra saber das safadezas que ele faz.

– O que ele tá fazendo? Para de ser tão ignorante, Fernando!

– Essa frescura que ele anda tendo. Nenhuma das surras resolveram, nem aqueles otários daquela escola idiota sabem fazer uma coisa bem feita.

– Do que você tá falando? – o encarei.

– Você acha que se não fosse pela mamãe, esse viado ainda estaria dentro da nossa casa? Por que ele não se mata logo de uma vez e para de bancar o dramático! – ele me fuzilou com os olhos e depois saiu.

Quando entrei no quarto, vi o Rafa encolhido no canto da cama com as mãos no rosto, como se estivesse rezando. Ele tremia e os olhos estavam cheios de lágrimas. Temi que ele tivesse escutado o que o Fernando havia falado.

– Rafa, tudo bem?

Ele balançou a cabeça em negação e algumas lágrimas escorreram dos olhos.

– Eu não consigo... eu não consigo parar, é como se tivesse um monte de vozes dizendo coisas que eu não consigo entender, é como se algo quisesse e tivesse me esperando para me matar assim que eu pisar os pés no chão.

Engoli em seco.

– Tá tudo bem. Eu estou aqui agora.

Ele não olhou para mim.

– Ninguém quer te matar.

Ele começou a chorar e dizia que estava com medo. Droga, eu não sabia o que fazer. Fiquei o tempo inteiro ali, até as três da manhã, quando ele conseguiu pegar no sono. Eu sentia que havia passado por um desafio que me fez abrir os olhos para ele e me preocupar mais.

Antes de você partir - conto LGBTWhere stories live. Discover now