Solivagant

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Meu corpo doía tanto que minha mente só conseguia se focar nessa sensação, como se viesse de outro mundo conseguia ouvir sussurros ao meu redor, sentir a frieza do chão contra os meus pés, mas mais importante que tudo isso, conseguia sentir um poder me sustentando em pé. Não conseguia especificar quem era a origem daquilo, mas mesmo que pudesse seria inútil, meus olhos estavam embaçados e sem foco demais para que eu tivesse uma chance de lutar.

Eu me lembrava daquele bicho me atacando, as garras se enterrando no meu peito, os dentes raspando minhas bochechas, e então eu enterrei a espada no corpo dele, forçando-a com toda a minha força para cima e mais e mais fundo, até que ele parou de respirar e o calor do sangue dele estava se dissipando. Joguei o corpo para longe, vendo ele murchar, os olhos agora eram brancos e leitosos, como os olhos de um verme, os dentes eram agulhas negras, e a pele tinha um tom doentio e esverdeado.

Não tinha forças pra me levantar, meu corpo queimava onde as garras arranharam, e mover minimamente o corpo fazia minha cabeça girar. Não conseguia ouvir Sato, e por sorte eu imaginava que ele houvesse corrido de volta para o palácio. Com muito mais esforço do que deveria ser necessário, forcei o corpo a rolar e então eu afundei na água.

O frio me fez sentir os ferimentos mais claramente, enquanto eu lutava para não me afogar, até que o fundo do lago atingiu minhas costas, e eu encarei a superfície tão longe, a luz difundindo-se lá em cima, transformando a água ao meu redor em prata e escuridão. Fechei os olhos sentindo bolhas correndo pela minha pele, e afundei os dedos no leito lamacento misturado com pedras frias e lisas.

Estava completamente satisfeita em ficar ali, era um bom lugar para morrer. Até que o rosto do meu pai me veio à mente, a forma como ele me ensinou a lutar, a sobreviver. Como ele me segurou na primeira vez em que eu cavalguei, mas depois me deixou cair todas as outras vezes, como nunca deixou os criados me mimarem demais.

"Você é forte Luna, mais forte do que parece. Seja o que precisar ser para lutar e vencer. Você é uma filha do sol e do fogo. Mas também tem o rugido dos oceanos e a frieza que queima entre as estrelas no sangue."

Abri os olhos e o ar escapou pela primeira vez, e eu forcei o corpo a nadar, a subir para o sol lá em cima, a sobreviver. Puxei um fôlego doloroso assim que alcancei a superfície, o corpo queimando tanto quando meu peito enquanto nadava até a beirada, a grama sendo amassada pelos meus dedos, o frio espetava meu corpo com agulhas de gelo enquanto engatinhava pela terra, e eu daria tudo para afundar ali e não me levantar mais.

Neguei com a cabeça fechando os dedos em punhos, e comecei a rastejar, os joelhos doendo quando eu os forçava contra pedras, as mãos sendo rasgadas por espinhos e cascalho, e quando cheguei ao topo da colina, obriguei meu corpo a ficar em pé, notando finalmente que estava descalça. Não sabia exatamente quando havia perdido os sapatos. Comecei a andar cambaleando e caindo, as solas dos pés sendo arranhadas e furadas por tudo que encontrava no caminho.

Não havia ninguém no caminho, não havia ninguém e não haveria, então continuei andando e lutando a cada passo, sendo mais e mais difícil levantar a cada queda, mas eu continuei. Quando alcancei a estrada, lutei para não gritar ao sentir o chão queimando meus pés, apenas continuando a me arrastar. Não estava tão longe, podia sobreviver a isso.

Não sabia quando tempo havia se passado, minha noção de tempo havia se perdido, um zumbido incomodo fazia meus ouvidos doerem, há muito não sentia mais meus pés, e meus cabelos secava, caindo pelas minhas costas e sobre o meu rosto. Eu poderia estar andando a alguns minutos ou a horas não fazia tanta diferença. E quando minhas pernas falharam, não consegui levantar do chão dessa vez. Respirar doía, e minha visão estava borrada, com pontos escuros dançando diante dos meus olhos.

The Red Line of DestinyOnde histórias criam vida. Descubra agora