Capítulo 16

3.4K 317 19
                                    

Voltar ao quarto de Enzo, exigia coragem. Limpou os olhos e respirou fundo. Já havia dito que pretendia mudar de vida, mas ele parecia insensível a isso e não bastava o castigo que tinha lhe imposto há mais de dois anos, ficando noivo de outra?!
Impossível, não trazer o sentimento, que tinha trabalhado arduamente para eliminar com muita terapia, à tona: o de ter pena de si mesma.
Sentindo-se a pessoa mais desprezada do mundo, lembrou de quando saiu do hospital com Alice nos braços e junto uma enorme dívida com Miguel.
Alice e ela foram assistidas todo o tempo, no hospital por médicos particulares. O hospital público, apesar de ser bom, era carente de verbas e não tinha os remédios necessários receitados por eles. Miguel bancou tudo e ela precisava pagar suas dívidas. Jamais pensou em se escorar nos amigos, usando sua situação de saúde.
Brian, vendo o seu desespero, em ter que depender deles, até mesmo para comprar o leite caro e especial para prematuros, que a filha necessitava, pois o que ganhava de auxílio maternidade não cobria todas as despesas da criança, então lhe fez a proposta para dançar na boate, ganhar melhor e obter dinheiro mais rápido. Quando saiu do resguardo, o amigo começou a lhe dar aulas de aperfeiçoamento em danças e unindo a técnica ao talento dela, a transformou na Borboleta Rainha Alexandra, a mascarada.
As consultas com Flávio também foram pagas por Brian, mas por último, foram transformadas em encontros fora do consultório. Ele tinha se tornado também alguém especial na vida dela, um amigo que a entendia, um confidente. Por fim, quitou tudo o que devia apenas dançando.
Respirou profundamente, mais uma vez e afastou aqueles pensamentos, não era hora de chorar suas mágoas. Agora, tinha que pensar na filha, lutar contra o amor e o desejo por Vítor e esquecer de si mesma.
Pegou uma das mamadeiras com determinação e foi ao encontro dos três.
Alice no colo do pai, brincava num joguinho educativo para bebês no celular e Vítor a incentivava guiando onde tocar para jogar. A expressão de alegria dos dois não deixava dúvidas que gostavam da companhia um do outro. Enzo ainda dormia.
__ Alice, - ela chamou baixinho. __ mamadeira! - e balançou mostrando o frasco de tampa rosa decorado com desenho de princesas da Disney.
Vítor pousou seus olhos tentadores em sua face, analisando enquanto entregava Alice, liberando a poltrona para que sentasse com a menina para alimentar.
O corpo forte, sem camisa, se agachou na frente das duas, criminosamente lindo.
Ele observava a filha e era nítido no olhar carinhoso, o quanto ele estava encantado com a menininha.
___ Ela se parece com minha mãe, não acha?
Dany pensou em não responder, mas achou que seria infantilidade demais ficar fazendo birra. Ela acariciou a mãozinha de Alice com a cabeça inclinada, admirando ternamente a inocência da garotinha.
___ Elas têm os mesmos olhos... Você também se parece com sua mãe. Às vezes, eu te enxergo em alguns trejeitos de Alice. Da minha família as lembranças não são muitas, se bem que ela tem também alguns traços meus, as covinhas no rosto.
Ele ergueu a mão encostando os dedos no queixo de Dany, o erguendo. Seu olhar penetrante, querendo desnudar sua alma, descobrir o que estava escondido dentro dela. A voz saiu baixa e as palavras proferidas quase como uma carícia.
___ Não tem raiva por ela ser parecida comigo?
___ Alice não é fruto de um erro. Foi a melhor coisa que me aconteceu na vida... Eu amei você...e por muitas noites, eu a imaginei, antes de nascer, com seus traços... - Dany o fitava e uma vozinha lá no fundo, lhe dizia que precisava tratar com cautela o homem que tinha seu coração nas mãos.___ E eu sinto tanto que tenha mudado nesses anos... mas não tenho raiva de você, acho que a palavra certa é mágoa, mas tenha certeza que não será para sempre. O tempo cura muitas coisas. Alice merece o melhor de nós dois.
___ Não sei o que aconteceu com você depois que saiu da fazenda... Espero que me conte um dia, quem sabe assim a gente possa se magoar menos.
Seu coração pulsou mais forte.
" Que droga é esta, que ele traz no olhar e na voz, que faz meus sentimentos oscilarem desta forma? Como ele podia ser tão cínico, puxando assunto de um jeito tão carinhoso? Talvez queira me enlouquecer."
Dany sentiu um nó se formar na garganta. Vítor, acariciou sua face com as costas da mão e ela se perdeu, por segundos no azul daquele olhar e na suavidade do seu toque. Não havia mais a frieza de antes.
___ Desculpa meu comportamento da madrugada. Disse coisas que não saíram do meu coração. Sonhei com aquele momento a cada minuto desses anos e estraguei tudo por ser orgulhoso. Me senti tão revoltado, que quis puni-la de alguma forma. Perdi a razão. - ele passou a mão na testa num gesto de desânimo.
Dany tinha a surpresa e a confusão expressa dentro de si. Que jogo era aquele? Porque estava fazendo aquilo com ela? Qual o motivo de ter se revoltado?
Será que ele percebia o estrago que fazia com seus nervos quando agia daquela forma carinhosa, lembrando o antigo Vítor?
___ Sei que nada será como antes e não tenho a pretensão que me aceite. Só queria que ao menos me respeitasse. Temos uma filha, teremos que conviver bem, por ela. Só peço que se contenha quando estiver com Alice por perto e finja ter respeito por mim. Não use de rispidez na frente dela, como há pouco, quando entrei no quarto. Alice não está acostumada com este tom.
Durante o tempo que estiver aqui, não peça desculpas, pense antes de falar e agir e me poupe de suas humilhações. Não vim para cá para você me humilhar! - limpou rápido uma lágrima que escorreu.
Os dias perto dele estavam se tornando quase insuportáveis.
___ Não sou culpada se não conseguiu superar a descoberta de que não sou mais a pessoa que pensava. Não sou mais a garotinha inocente que entregou o coração e a virgindade, naquela tarde a você. Está na hora de encarar os fatos. Sou uma mulher com desejos. Ontem, claro que foi bom, que me deixei levar pela sua sedução, mas há de convir que quando estávamos juntos era ótimo e estou há um tempo sem sexo. - cada palavra dela, mesmo que mentirosa lhe dava o prazer da vingança. Não deixaria Vítor pensar que ela estava morta por dentro por causa da rejeição. Tinha também seu orgulho.
Vítor levantou, o momento de enlevo passou, aborrecido pela resposta firme dela.
___ Seus olhos inchados não mentem. Está magoada. Eu sei que ainda sente algo por mim. Vou repetir o que disse certa vez, quem está com você não te satisfaz... Quando te toco eu sinto isso, não posso estar tão enganado assim.
___ Não se iluda. O choro sempre nos faz refletir sobre o que queremos da vida e eu lhe disse, quero a minha vida de volta. Apenas isso e nada mais. Ficar longe de quem a gente ama e nos compreende é horrível!
Ele lançou um sorriso amargo, uma veia visivelmente pulsando no pescoço.
___ Vou me controlar, mas não é uma promessa.
Danyelle continuou, demonstrando serenidade nas palavras, acariciando Alice, enquanto a menina alheia ao momento tenso, sugava o bico da mamadeira. No íntimo, sentia-se desesperada.
___ Eu tenho a plena consciência do que faço para ganhar a vida, não precisa me lembrar o tempo todo, no entanto, foi a única alternativa que se apresentou a mim num momento de desespero. O que importa é que Alice está bem e eu estou viva para cuidar dela e que tenho alguém que está disposto a reparar as minhas burradas para que eu possa ter Alice de volta. O que conta pra mim são as opiniões de quem me tirou do fundo do poço. A sua ao meu respeito é irrelevante. - ela mentiu.
As palavras dela o empalideceu e uma sombra transpareceu em seu olhar, o maxilar cerrou, estava sendo devorado pelo ciúme. Mais uma vez, ela mencionava o quanto o outro não se importava com a vida pregressa que levava.
Aceitou o conselho dela em não ser estúpido na frente da filha, virou de costas e saiu. A conversa já tinha acabado e em vez de diminuir as distâncias, o abismo crescia entre os dois, apesar do desejo que os consumia.
Quando Enzo acordou, mais tarde, ela cuidou dele com carinho também. Não importava se o menino era filho de sua antiga rival. Ninguém merecia ser maltratado, muito menos uma criança e ele tinha o sangue de sua Alice e era filho do homem que ainda amava, mesmo que estivesse lutando contra esse sentimento.
Depois de algum tempo, os levou para a sala com a cesta de brinquedos junto e os acomodou de modo que pudesse vê-los da cozinha enquanto bebia um café.
Vítor tinha se trancado no escritório, não que não quisesse ajudá-la com as crianças, mas achou melhor dar um tempo para que as coisas entre eles se acalmassem.
Alice e Enzo brincavam e Dany lendo um livro não notou quando o sofá afundou ao seu lado.
__ Daqui a pouco entregarão a cama que compramos ontem. Acha que ela vai se acostumar a dormir sem a sua presença?
Dany balançou a cabeça afirmativamente, sem tirar o olho do leitura.
___ Alice dormia na minha cama sozinha quando estava nos shows. Nanete apenas ficava no apartamento. Também tínhamos uma babá eletrônica. - contou.
___ Então não será um problema. Podemos conectar mais um aparelho no quarto, assim poderá ouvir se chorar à noite.
___ Claro, seria ótimo. - concordou.
Vítor displicentemente, indagou e ela teria achado cômico, se a curiosidade não envolvesse emoções conflitantes dentro dela.
___ E como fazia? Você sabe...quando trazia seu namorado pra transarem lá? - ele não conseguia tirar a imagem de Dany se submetendo às carícias de outro homem. Sentia-se inseguro pela primeira vez na vez na vida, a respeito de sua performance como amante.
__ Minha vida não lhe diz respeito, Vítor. - ela disse baixo, furiosa, vendo a filha se achegar oferecendo um bloco de montar a ele, que sorriu e sentou no chão, escorando as costas no assento do sofá para brincar com os dois. Ambos subiram por suas pernas, sentando nelas.
Ele beijou a cabeça de um e depois do outro, externando o pensamento que passou por sua mente.
___ Minha mãe teria adorado conhecer os netos... - passou os dedos nos cachinhos sedosos de Alice.
___ Já contou ao seu pai sobre Alice?
Ele suspirou.
___ Ainda não.
Danyelle o encarou como se exigisse uma explicação.
___ E porque? Está com vergonha de ter que dizer que sou a mãe dela?
___ Assim que ele se recuperar totalmente do infarto, eu levarei Alice para que ele conheça e se quiser me acompanhar será bem vinda. Alice é neta dele e sua filha, esses fatos não têm como mudar. - ele explicou, ignorando o tom de desaprovação de Danyelle.
___ Acha que ele vai aceitá-la, assim como aceita Enzo, afinal ela é minha filha? Lembra, que me disse que se eu engravidasse, talvez achassem que fiz de caso pensado?
___ Esse foi um dos motivos pra não ter me contado que esperava um filho meu? Medo de ser julgada?
___ Também, mas não o principal. Não queria atrapalhar sua felicidade com Priscila. - ela explicou com calma.
Vítor olhou-a pensativamente e então, proferiu:
___ Por último, apenas a amparei cumprindo com minhas obrigações de pai.
___ Algumas vezes, vi fotos de vocês em eventos...vi também, um ensaio de gestante...pareciam ser o casal perfeito. - ela confessou. __ Tive curiosidade de saber sobre vocês...apenas isso, nada demais. - mentiu.
Não poderia dizer que morria por dentro, aos poucos, a cada foto de felicidades dos dois.
Ele balançou a cabeça parecendo expressar uma certa amargura.
___ A política é um jogo, Dany... e naqueles momentos, eu estava jogando. Nada do que viu era sincero.
Dany soltou uma exclamação abafada, pasma.
___ Como você pode ser tão insensível, Vítor? - levou as mãos às têmporas que começavam a latejar. ___ Você lida com as pessoas com se fossem fantoches, manipulando e jogando de lado quando não são mais úteis! Priscila carregava um filho...o seu filho! Como pode usá-lo desta maneira sórdida?!
___ Está enganada! Amei Enzo desde o dia, em que soube que seria pai! Se viu amor naquelas fotos, era por
Enzo.
Ouvindo seu nome, o garoto estendeu a mãozinha, num convite à Dany, que saiu de onde estava sentada para ajoelhar-se perto deles. O menino se desvencilhou do colo do pai e passou para o dela. Dany beijou sua face rosada.
Vítor continuou, aproveitando os momentos de trégua.
___ Nunca fui feliz com ela, Dany. Até hoje, me pergunto, como foi que a engravidei?!
___ Exatamente como fez comigo! - ela riu, disfarçando o quanto aquela confissão mexia com seus sentimentos.
___ Estou falando de prevenção. Transamos uma única vez, em Londres, e usei preservativo.
___ Preservativos não são totalmente seguros. Ele é seu, não é? Como aconteceu, não importa.
O interfone tocou interrompendo a conversa e Dany saiu para atender. Os entregadores estavam subindo.
Enquanto Vítor, no quarto, conversava com os montadores do móvel, ela fez por telefone, um pedido de almoço no restaurante ali de perto.
Enfim, depois de alimentar as crianças, os dois puderam sentar à pequena mesa da cozinha para almoçarem.
___ Não me respondeu se quer ou não ir à fazenda comigo. - ele serviu um copo de suco a ela. ___Mas se não quiser ir, entenderei perfeitamente.
___ Vou pensar com carinho no convite, eu prometo. Gostaria muito de rever Rute e meu padrinho, mas temo que ele não me perdoe por ter saído fugida de lá, ainda mais quando recai sobre mim a suspeita de um roubo. Celeste não me receberia.
___ Talvez, ela não fique feliz com sua presença, mas meu pai ainda manda na casa dele. Por isso vou dar um tempo para ele se recuperar, caso queira me acompanhar. Tenho consciência que será constrangedor.
Para Dany não havia nada que pudesse dizer depois disso. Argumentar que não tinha sido ela que roubara o dinheiro não adiantaria, pois Vítor quando a reencontrou, condenou sua conduta, na manhã que fora embora da fazenda.
Numa outra ocasião perguntaria se ele realmente, achava que ela, além de vadia, era uma ladra.
Revirou a comida no prato, a palavra vadia quando proferida por ele, era como um chicote a açoitar seu coração e discutir o assunto só faria com que a dor de cabeça que havia começado fraca pela manhã aumentasse mais ainda.
No silêncio que se seguiu, ambos almoçaram com tranquilidade, evitando que os sentimentos interferissem naquele momento e conversaram sobre assuntos triviais, até que Alice, veio para o lado deles, pedindo colo, se aninhando nos braços da mãe, sonolenta.
À tarde, ela tentou descansar, mas a dor aumentou muito e saiu à procura de um analgésico. Na correria de vir à Brasília, acabou esquecendo de trazer o que sempre tomava, quando a enxaqueca lhe atormentava quase todo mês.
Na cozinha, pôs a xícara no microondas e procurou, abrindo as portas dos armários aéreos, por algum chá, que talvez, pudesse amenizar a dor. Não tinha encontrado nenhum remédio por ali.
Ela segurava a cabeça entre as mãos, o rosto crispado pela dor quando ouviu passos e levantou os olhos, se deparando com Vítor na porta.
Vendo a sua expressão ele franziu a testa, preocupado.
___ Está bem?
Ela fez sinal negativo com o dedo indicador.
___ Estou com uma tremenda dor de cabeça. Não trouxe o remédio que costumo tomar quando isso acontece.
Ele passou o braço por sua cintura e a levou até a cadeira mais próxima.
___ Senta aqui. Tenho alguns analgésicos no meu banheiro. - saiu e logo voltou com uma nécessaire cinza.
___Pegue este. - alcançou a cartela a ela. ___ Sempre tenho alívio quando tomo. - disse retirando a água quente de dentro do micro e mergulhando um saquinho de chá, que Dany tinha encontrado no balcão.
___ Todo mês é assim. Ser mulher não é fácil! - ela se queixou, enfiando dois compridos na boca, bebendo o chá quente.
___ Não é demais a quantidade? Eles são fortes.
___ Não. Vou tentar deitar e ficar no escuro até passar. - levantou, sentindo a cozinha rodar e para não cair se segurou no tampo da mesa.
Vítor lhe amparou, segurando firme em sua cintura. Ela estava pálida e ele lhe levantou no colo e a carregou até a cama. Dany não ofereceu resistência. Estava com muita dor para dispensar ajuda. Ele ajudou com os travesseiros, os ajeitando e usou uma coberta fina para cobrir seu corpo, ligando o ar condicionado.
Dany fechou os olhos, passando o braço por cima do rosto, na esperança de melhorar.
___ Quero que descanse, Dany. Não se preocupe com Alice, consigo tomar conta dos dois tranquilamente. Caso, não melhore, vou chamar um médico.
Ela protestou.
___ Imagina, tenho essas dores seguidamente! Com certeza, vai passar.
___ Vou apagar a luz e ficar aqui, com você até as crianças acordarem. - se recostou na cabeceira da cama ao seu lado e a puxou de encontro ao peito. Dany se aconchegou nele, sentindo seu corpo amolecer devido ao efeito do analgésico.

Para Sempre No Meu Coração🔞‼️Onde histórias criam vida. Descubra agora