Capítulo 19

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As luzes vermelhas e azuis não são um bom sinal, o barulho de sirenes - não importa se são da polícia ou de alguma ambulância - me assustam e o fato de eu não poder abrir os olhos também. A dor e queimação no lado esquerdo da minha cabeça não podem ser reais, as cores psicodélicas brincando em minha imaginação também não. Gritos são ouvidos, rolo meus olhos por conta do som horrível que chega em meus ouvidos, mas sei que ninguém pode ver pelo fato de minhas pálpebras estarem fechadas.
Por que elas estão fechadas ?
Tento mexer meu corpo, a dor se apossando de todos os meus ossos e músculos de uma só vez.
- tem um garoto dentro do carro !
Rio internamente, meus pulmões queimando a cada partícula de ar que entra ou sai. Mãos encostam em meu peito, se encaixando por baixo das minhas axilas e me puxando para fora. Minhas costas entram em contato com o chão e nesse momento é como se a toxina que impedisse meus olhos de se abrirem fosse dissipada. Três bombeiros estão a minha volta, cada um deles mexendo em algum lugar diferente do meu corpo, hora pernas, hora os braços e abdômen. Um cara vestido de branco se aproxima, deixando a maleta ao lado da minha cabeça e pegando uma pequena lanterna. A luz clara chega em meus olhos, o rosto do médico se contorcendo em minha visão.
- o garoto está sob efeito de álcool e drogas, precisamos levá-lo para o hospital logo.
Drogas ?
Eu não uso essas merdas !
Ainda sem conseguir me mexer vejo em meio as alucinações os bombeiros me colocando dentro da ambulância, uma máscara de oxigênio é colocada em meu rosto e finalmente eu pude fechar os olhos sem sentir aquela dor de novo.
Sem dor...

O barulho da máquina é extremamente estressante, os desenhos formados na tela me dizem que meu coração está fazendo um ótimo trabalho em me manter vivo depois de todo o álcool que despejei em meu sangue. A porta é aberta com rapidez, os cabelos escuros da minha mãe são os primeiros a aparecer quando a mesma entra no quarto do hospital com os olhos vermelhos. Meu pai segura em uma de suas mãos e me parece abatido, as rugas finalmente são parentes em baixo dos olhos.
- Andy ! - minha mãe se deixa sentar ao meu lado, soltando de meu pai e apanhando minhas mãos. - por favor Andy ! Nunca mais faça isso comigo ! Está me ouvindo ! Nunca mais !
- eu estou bem mãe, desculpe por isso .- digo baixo, envergonhado pela situação.
- está bem por uma benção de Deus Andy ! - ela me puxa para deitar em seu peito, me fazendo um carinho na cabeça. - eu não suportaria a ideia de perder você de novo.
- desculpe mãe, eu sinto muito.
Eu sou mesmo um idiota, errar é da porra da natureza humana mas ... Cometer o mesmo erro duas vezes já é burrice da minha sorte. Ver minha mãe assim, desesperada como na noite do meu primeiro acidente, é uma das piores visões que eu poderia ter na vida. Meu pai ainda está ali, parado com as mãos enfiadas no bolso com uma cara nada boa.
Ele vai me matar.
O carinho da minha mãe não dura muito tempo, a entrada do médico no quarto chamou sua atenção.
- senhor e senhora Grayson, que bom que vieram o quanto antes. - o cara de branco cumprimenta o meu pai, em seguida dando um aceno com a cabeça para a minha mãe. - creio que estão cientes do que provocou o acidente.
- não doutor, só fomos informados de que ele estava em observação. - a voz dela está tremida.
- os exames do seu filho apontaram uma alta porcentagem de álcool na circulação sanguínea, creio que seria o equivalente a uma garrafa inteira de whisky. - os olhares fulminantes dos meus pais sobre mim começam a me fazer pensar que não deveria ter encostado nesse carro.
Maldita ruiva.
- além disso, encontramos zero vírgula zero dois miligramas de MDMA no organismo dele.
- e o que é isso ? - minha mãe pergunta.
- é um princípio ativo da droga mais conhecida como LSD, seu filho ingeriu isso junto com o álcool o que pode ter causado uma leve distorção da realidade e causado a batida. Creio que como a porcentagem desse princípio foi muito baixo perto das tradicionais as alucinações não duraram muito tempo, já que no instante em que terminamos os exames ele já se consciente do que estava acontecendo.
- eu não usei essa merda. - digo baixo, encarando o médico e sabendo que o mesmo pode ter uma boa resposta para convencer meus pais de que eu sou um drogado.
- se não usou como isso foi parar na seu corpo ? - meu pai pergunta irritado.
- eu estava com uma garota e provavelmente ela se aproveitou do tempo em que joguei o whisky na boca para colocar essa merda na minha língua. Eu posso até beber pai, mas não sou a favor de drogas.
- e quem é essa garota Andrew ? Me diga ?
- não sei, depois que ela me drogou eu não lembro do rosto dela.
Só sei que ela tinha cabelos vermelhos.
Não como os dela ...
Mas a voz era tão parecida.
- ela estava no carro comigo.
- desculpe senhor Grayson, mas você foi encontrado sozinho.
- ela foi embora e me deixou ali, eu estava drogado pai, se ela fujiu você já sabe o porquê.
Ambos parecem pensar, o médico puxa meus pais para fora da sala, minha mãe me mandando um olhar acolhedor antes de fechar a porta.
Eu estou fudido.
Os minutos que passam são quase torturantes, as gotas de soro caindo devagar me convencem de uma verdade que eu não queria aceitar : a madrugada vai ser mais longa do que eu imaginava. Estalo minha língua, perdido no som que ela produz e me recordando de quando Mia costumava acariciar meu abdômen depois de fazermos amor.

Os dedos dela passeiam em meu peito, as unhas arranhando de leve minha pele ainda quente.
- você ainda tem aquele vestido rosa ? - ela sorri, mostrando os dentes perfeitos.
- sim, ele está guardado no closet.
- acho que gostaria de ver você usando ele novamente.
- gostaria é ? - Mia se levanta, permanecendo sentada em meu colo com um dos braços segurando o lençol para cobrir os seios.
- iria ser bom relembrar aquela noite, seu primeiro beijo e eu ainda não tive a oportunidade de tirar aquele pedaço de pano do seu corpo. - ergo o tronco, me apoiando nos cotovelos.
- não é um pedaço de pano, é um vestido.
- um vestido que me deixou com um puta vontade de te agarrar.

Abro os olhos, encarando com ardor o meu odiado irmão.
- veio ver se eu tinha morrido ? Sinto muito mas não foi dessa vez.
Ele ri ironicamente, cruzando os braços após deixar a jaqueta de couro ao lado dos meus pés.
- ah, não dá para ser o feliz o tempo todo né.
- o que você quer ? - digo sério.
- vim ver se você estava inteiro.
- não acredito em você.
- problema seu. - ele diz simples.
Antes que eu possa rolar os olhos meu pai entra no quarto furioso e sem a minha mãe, ele nem ao menos se dá o trabalho de perguntar o que Anthony está fazendo aqui.
Seu foco está em mim.
- agora vamos conversar Andrew, colocar as cartas na mesa e tentar concertar a merda que você fez. Consegui contornar a situação com a polícia, para a sua sorte não vai ter mais uma infração grave para sujar a merda do seu histórico policial. - ele passa a mão direita pelos cabelos, visivelmente irritado por ter tido tanto trabalho sem ao menos estar em seu escritório. - essa é a última vez que você comete uma idiotice dessas, a partir de hoje você trabalhar comigo para pagar o carro que bateu.
- trabalhar ? Sabe que eu não entendo quase nada de como administrar uma empresa. - não me exalto, sabendo que terei de fazer o que ele mandar.
- pois vai entender e vai pagar o prejuízo do seu carro, vai aprender que nem tudo na vida é fácil e além disso, se você teve coragem de pegar no volante bêbado mais uma vez depois daquele acidente com certeza me ajudar no trabalho não vai te matar. Aprenda a ter responsabilidade com as coisas e entenda de uma vez que eu não estou aqui para arrumar cada merda que você faz na vida, cresça Andrew.
Anthony apenas observa a cena, os olhos azuis tão incertos quando os meus sentimentos. Meu pai abre os dois primeiros botões da camisa, suando um pouco por conta do nervosismo.
- desculpe pai.
- te vejo no escritório amanhã depois da aula, use um terno.
E assim ele sai, levando toda sua razão e deixando um grande ar de decepção no quarto.
- é fratellino (irmãozinho), parece que alguém ficou de castigo e agora vai virar gente grande.
- que tal se você calar a boca !
Ele ergue as mãos em sinal de rendição, o olhar de lado se mostra brincalhão mas a real intenção é desconhecida. Anthony caminha devagar até a ponta da maca, pegando a jaqueta antes de se virar e deixar o quarto.
- eu realmente me fodi.

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