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Baile (parte 1)

FELINA

— Eu acho melhor você tomar muito cuidado enquanto corta esse cabelo — digo com raiva para o cabeleireiro. Ele está com a máquina de cortar, prestes a ligar, mas então para assim que eu abro a boca.

Levanto uma sobrancelha para ele.
O cara tem tipo o dobro da minha altura, mas engole seco de medo. Estou bem ao lado dele e Adora (que vai cortar primeiro).

— Felina! — Adora diz. — Tá deixando ele com medo.

— É bom mesmo, porque se não cortar direito... — aponto o dedo indicador para ele, mas Mara me puxa para trás.

— Calma, calma — a mulher diz e dá um sorriso constrangido para o homem.

Mara faz com que eu sente numa cadeira e espere com ela enquanto Adora tem as laterais da cabeça raspadas. Uma parte de mim fica morrendo de medo, mas a outra está amando isso. E Adora parece estar de boa.

O barulho da máquina me deixa nervosa. Fico me mexendo na cadeira, e não sei decidir se olho ou não.

— Tá nervosa pra cortar o seu? — Mara pergunta. Ela está super tranquila enquanto lê um livro.

— Tô nervosa por ela — abraço meu próprio corpo. Adora está com os olhos fechados, como se estivesse meditando. Um dos lados já foi. — Meu Deus, é muito cabelo no chão.

Mara ri e segura minha mão. É, devo estar nervosa por mim.

Quando o corte de Adora termina, ela abre os olhos e olha bem, sorrindo.

— Ficou lindo, Dorinha! — Mara mexe no cabelo dela várias vezes, olha cada canto. É só uma mãe preocupada, no fim das contas. Quando o cabelo fica solto mal dá pra notar, mas se ela jogar um pouco para o lado... é a coisa mais linda do mundo. — Você gostou?

Adora assente. Vejo pelo brilho de seus olhos que está mesmo satisfeita. Então olhamos uma para a outra, eu sorrio.

— Minha vez! — fico em seu lugar. O cabeleireiro me olha com nervosismo. — Relaxa aí, cara.

— Ok...

Acho que eu preciso manter a calma.
Eu quero fazer isso. Preciso fazer.

— O quanto você quer cortar? — ele pergunta.

Penso em tudo que Sombria puxou, os anos que ela pegou no meu cabelo como se fizesse carinho... Nunca mais vai acontecer.

— Tipo noventa por cento dele.

Adora, que ainda fica mexendo nas laterais da cabeça, especifica direitinho como eu quero. O homem assente e prende meu cabelo num rabo de cavalo baixo.

— Adora — chamo-a com medo. Ela ri e segura minha mão, olhando o homem pegar a tesoura.

Estou tão nervosa que sinto frio na barriga.

— Últimas palavras? — diz o cabeleireiro.

Eu vou bater nesse cara.

— Eu chamo esse corte de "Emancipação" — Adora diz convencida.

— E eu chamo de "Vai se Foder, Sombria" — respondo.

Aí ele corta. É a sensação mais libertadora que tive nos últimos dias.

Falta pouco para eu nunca mais ver a Sombria.

E nunca mais olhar para trás.

...

Noite do baile

— Você vai soltar essa merda e eu não quero saber, Adora! — tento puxar o elástico de sua mão. Ela foge de mim e corremos pelo quarto.

SUCKER PUNCH • (she-ra) catradoraOnde histórias criam vida. Descubra agora