ENVELOPE AMARELO

763 17 9
                                    

– Recebeu resposta de alguma faculdade? – Meu pai me pergunta pela quinta vez só essa semana.
Desde o fim das férias de inverno, Simon e eu havíamos pesquisado sobre quais Universidades nos candidatar. Foi uma pesquisa séria, onde analisamos quais das Universidades tinham um melhor programa de ensino. E claro que mandamos para as mesmas, afinal somos praticamente gêmeos. Enquanto Simon havia escolhido o curso de direito, eu escolhi o de arquitetura.
-Não, ainda não. – respondo, o que não é exatamente uma mentira, já que eu havia recebido as cartas de três Universidades mas não tinha visto a resposta de nenhuma. Simon e eu fizemos um acordo de abrir todas as cartas juntos, e ainda faltava uma. A que mais me fazia arrepiar.
– Hum. Essas cartas demoram sempre assim?
Odeio esconder as coisas do meu pai, mas não quero dizer a ele que recebi as cartas. Ele com certeza me fará abri-las ,e eu não suporto a ideia de vê-lo desapontado se eu não conseguir entrar em nenhuma. Por um lado eu penso que é meio difícil, já que eu tenho quatro chances. Mas considerando minha deprimente sorte, eu preciso admitir que corro seriamente o risco de não conseguir.
– Não se preocupe pai, em breve vamos receber.
  Bem nesse exato momento meu celular vibra com uma mensagem.
Simon.
“Recebi a última. Olha seu correio e corre pra cá.”
   Meu coração imediatamente pula no meu peito e sinto dificuldade em fingir que estou bem para o meu pai. Minhas mãos estão suadas e quase não consigo enviar a resposta ao meu melhor amigo dizendo que estou a caminho.
– Estou indo até a casa do Simon. Volto para o jantar. – digo, já pegando minha bolsa que foi o esconderijo secreto para as cartas durante todo esse tempo. Planto um beijo na cabeça do meu pai ao passar por ele, e corro para fora.
Minha caixa do correio nunca pareceu mais assustadora. Engulo em seco só de imaginar que essa pequena caixa vermelha guarda o meu futuro.
Respiro fundo e abro lentamente a pequena porta, revelando um grande envelope amarelo.
  Droga! O que significa amarelo?
“Seja bem-vinda” ou  “ Desculpe, mas você não é boa o suficiente para nós” ?
Guardo o envelope embaixo do braço e saio do jardim antes que meu pai me veja pela janela.
Assim que passo pelo portão da casa dos Reed, lembranças voltam para atormentar minha mente. Lembro de uma época onde vir aqui significava Daniel. Tentei evitar voltar a casa dos Reed desde que ele foi embora. Por mais que eu tenha praticamente crescido nessa casa, ela passou a ter outro nome para mim: a casa do Daniel.
Na primeira vez que vim aqui depois da sua partida, não consegui impedir minha mente de vislumbrar suas coisas onde elas costumavam estar. A garagem com manchas de óleo e suas ferramentas, sua monstruosa moto estacionada do lado de fora, seu quarto com a janela sempre aberta para o caso de eu precisar fugir novamente... não que eu precisasse mais.
Meus olhos vão quase que involuntariamente para a janela do seu quarto, e meu coração quebra quando a vejo fechada. Nada de ferramentas, nada de moto, nada de Daniel.
– Ei, Alissa.
Olho para a porta de entrada e encontro meu amigo acenando com a mão para que eu me apresse.
– Tô indo, Tô indo.
– Trouxe suas cartas? – ele me pergunta enquanto subimos a escada
– Com certeza. – dou uma tapinha na minha bolsa, indicando.
Arrumamos as cartas ao nosso redor na cama dele, e sinto como se elas nos encarassem de volta.
– Cara, eu tô tão nervoso. – Simon enxuga a testa, como se uma gota invisível escorresse por ela.
– Nem me fale.
– Qual abrimos primeiro? Brown, Bentley ou Universidade de Boston?
– Por que não essa? – aponto para o envelope amarelo, e só então percebo que o envelope dele é branco.
Droga em dose dupla. Ele entrou e eu não?
– Vamos deixar essa por último. – Simon responde.
Não consigo me imaginar indo para uma Universidade sem ele, somos inseparáveis. Ele sem dúvida conseguiu e eu não. Minha sorte é definitivamente lamentável.
– Alissa?
Simon me chama, e então lembro que devo uma resposta.
– Bentley
Ele rapidamente abre seu envelope, mas espera pacientemente que eu abra o meu.
– Pronta?
Não!
– Pronta.
Rasgo o envelope, e meus olhos passeiam pela carta sem realmente ler. Mas rapidamente meu desespero morre, quando encontro as palavras que dizem que não fui aceita.
– Eu consegui! – Simon pula animado na cama
– Parabéns! – Forço meu tom mais feliz. – Eu não consegui.
O sorriso desaparece do seu rosto no mesmo segundo.
– Vamos para o próximo então. – ele pega o envelope da Brown e eu faço o mesmo.
Lemos em silêncio nossa carta, e quando vejo seus ombros caírem sei que ele também não entrou.
Estou começando a ter certeza da minha má sorte. Já se foram duas Universidades e nenhuma carta me felicitando.
Meus olhos já estão tão acostumados com a recusa, que preciso ler duas vezes a carta da Universidade de Boston para ter certeza que li certo na primeira vez.
– Eu consegui! – grito, completamente entusiasmada.
– Que bom, porque... eu também consegui. – ele grita de volta
Finalmente uma notícia boa. Fomos aceitos na mesma Universidade.
– Agora já estou mais despreocupada.– digo, mas sinto que no fundo não é totalmente verdade.
– Vamos a última então.
Simon abre seu último envelope branco, e respiro fundo antes de fazer o mesmo. Minhas mãos estão suadas enquanto tento abrir o envelope amarelo. Vejo meu nome em destaque e mais embaixo as palavras que fazem meu coração parar.
– É, não consegui. – Simon suspira. –E você?
Não consigo afastar meus olhos da carta para olhar para ele.
O que devo fazer agora?
Meus olhos deixam a carta e encaro meu melhor amigo.
– Eu fui aceita em Harvard.

Sempre foi você!Onde histórias criam vida. Descubra agora