DEGUSTAÇÃO

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Claudinha,

Eu morri, estou morta. Ainda respiro, mas não sinto nada. Essas últimas semanas estou como uma morta viva. Não falo, não como, não sinto, apenas existo.

Faz duas semanas que perdi meu bebê
No dia que quebrei a minha casa dos sonhos, acabei perdendo o controle, me esforcei demais, meu bebê não aguentou. Eu matei meu filho.

Naquele dia, sair de lá disposta a pegar o primeiro avião para a Bahia, estava certa de que essa seria a melhor saída. Entrei novamente em meu carro, Rita veio comigo, assim que cheguei em casa, percebi que estava com cólica, me sentei no sofá e a dor só foi aumentando, depois de alguns minutos, Rita me olhou assutada, me avisando que eu estava sangrando, depois disso  apaguei.

Acordei em um hospital, mainha estava ao meu lado segurando minha mão, Rita estava sentada em uma cadeira com a cabeça baixa, assim que as duas perceberam que estava acordada, me olharam preocupadas, perguntei sobre meu bebê, mainha me disse que eu tive um aborto espontâneo, naquele momento foi como se um pouco de esperança que ainda existia aqui dentro, havia morrido.

Sentir uma dor muito forte, me sentir culpada. As lágrimas foi escorrendo, balançava minha cabeça em negação, eu matei meu filho; eu não havia pensado nessa possibilidade, fiquei cega por um momento e só queria vingança.

Depois desse dia, não falei com ninguém, vim para a minha casa e me tranquei em meu quarto, me sinto fraca, me sinto perdida.

Estou sentada na cama com as pernas dobradas, ascendo mais um cigarro é o quinto só dessas últimas meia hora, eu nunca fui de fumar, mas nesses últimos dias tem sido minha única saída.

Me ajeito na cama esticando minhas pernas, já estava ficando adormecida, olho em volta e meu quarto está todo destruído, me olho e estou com uma camiseta branca, ela está manchada de sangue, está suja, tem algumas gotas de bebidas, analiso e minha perna estão roxas, tem alguns arranhões também, não faço idéia de como surgiu todos esses hematomas.

Encosto minha cabeça na cama, fecho meus olhos, faço uma promessa comigo mesma, hoje será o último dia que viverei esse luto. Amanhã vou levantar dessa cama e tudo será diferente. Por mais difícil que seja, eu preciso reagir.

Amanhã vou acordar uma  nova Claudinha, não vou me permitir sentir mais nenhum tipo de sentimentos. Sentir demais só te faz ser uma pessoa fraca.

Estico meu braço até a cômoda e pego a garrafa de tequila, dou um gole, deixo derramar um pouco, limpo ao redor da minha boca com a mão.

Me olho no espelho, solto um sorriso, sinto como se meu corpo estivesse anestesiado. Vou engatinhando até a ponta da cama, ficando mais próxima do espelho quebrado, sem perceber acabo caindo no chão, solto uma gargalhada fracassada. Vejo um batom vermelho no chão, pego me levantando, fico olhando fixamente para o espelho, eu não me reconheço mais.

Faço um desenho de um coração, sem pensar duas vezes dou um soco no espelho, fazendo quebrar e o coração se partir. Olho para a minha mão e ela está sangrando, a levo até a minha boca, passo a língua sentindo o gosto metálico do sangue.

Vou indo em direção a cama, vou me jogando, caiu de braços abertos, fico de olhos fechados mentalizando que amanhã será um novo dia, preciso sair desse fundo do poço.

DIA SEGUINTE...

São apenas oito horas da manhã e já fiz mais coisas do que muita gente faz o dia todo. Levantei com uma disposição fora do comum, limpei meu quarto todo, estava um chiqueiro, parei pra reparar, fumei cinco carteira de cigarro nessa semana, as dez garrafas de bebidas estão todas vazias.

MINHA RENDENÇÃO (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now