Porque eu sei que é amor

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A maternidade ainda era um terreno que eu lutava para desbravar. Era delicado e às vezes parecia impossível, já que em boa parte da minha vida eu sequer me imaginava protagonizando este papel.

Era claro que os primeiros meses com a Maria estavam sendo transformadores. Uma intensa oscilação entre "ficarei mais forte do que nunca" com "provavelmente não sobreviverei a isso".

Era aterrorizante os momentos em que Maria chorava sem parar no meio da madrugada, e eu não conseguia distinguir o que a minha própria filha sentia.

Fome? Mas ela acabou de comer! Cólica? Ela já foi medicada! Sono? Ela simplesmente não dorme! E lá estava eu, me sentindo mais sozinha do que jamais estive.

Então, no primeiro mês, chorar junto dela havia virado rotina. Me sentia frustrada, uma péssima mãe. Pobre bebê, se é de fato verdade que quando viemos

ao mundo estamos cientes de nossos pais, essa criança provavelmente veio a esse plano ludibriada.

Eu me sentia desanimada, cansada e triste. Meus dias semi-caóticos só clareavam quando Rebeca ou Gabriela apareciam para me ver.

E depois, tudo era confuso e eu me sentia perdida novamente.... Até que Gabriela ofereceu-se para me ajudar com Maria, aí sim as coisas começaram a melhorar. Principalmente dentro de mim.

Sua companhia me reconectava comigo mesma. Passar horas conversando e rindo com Gabriela era a minha válvula de escape. Falávamos sobre tudo. Sobre nossos gostos parecidos, conhecidos da juventude que não fazíamos ideia de qual parte do planeta estava, e sobre nós. Ela me fazia relembrar quem eu era, e que eu era sim capaz de lidar com meus medos e inseguranças.

Era no seu abraço, (que ironicamente mal me cabia), que me sentia em casa, que eu me achava e tranquilizava aquele amontoado de aflição que tirava a minha paz. Nos momentos de desequilíbrio era a sua voz suave que me trazia a superfície, afastando a culpa que eu sentia. Ela segurava Maria no colo e dizia com um sorriso doce que eu era a melhor mãe que a minha filha poderia ter. E eu acreditava nela. Ali eu tinha certeza que tudo ficaria bem.

Seguíamos assim, os dias com Gabriela eram fáceis e felizes. Ela começou a dormir em minha casa para me ajudar com a recém nascida por livre e espontânea vontade.

No fundo me sentia em dívida, não era justo que ela trabalhasse durante o dia e me ajudasse com a bebê durante a noite, mas Gabriela era teimosa, jurava que não era incômodo algum e que ela estava plenamente acostumada com esse ritmo. Sendo assim, aceitei.

Com a nossa rotina era notável que a sintonia dela com a menina era infinitamente melhor que a minha, mas eu não me sentia enciumada, pelo contrário, me sentia sortuda. Meu peito se enchia de ternura ao vê-la embalar aquele neném minúsculo, todo empacotado.

Ela dizia que fazer do bebê um pacotinho fazia com que ele se sentisse quentinho e abraçado, e que provavelmente aquela manta macia confundia a cabecinha de Maria e a fazia dormir como se estivesse no útero. Eu ria. Gabriela tinha um jeito surreal com bebês. Domadora de criaturinhas. Minha Maria que o diga.

Desta forma, em um trato silencioso, vivíamos as três. E muito bem.

Eu fazia café toda manhã como forma de demonstrar minha gratidão e ela me ajudava quando eu precisava ficar sozinha para me repor. E essa presença era cada vez mais frequente. E era bom saber que ela estava ali, no quarto ao lado.

E a cada dia que passávamos juntas, sentia que a necessidade de tê-la por perto apenas aumentava. O bater exagerado do meu coração ao saber que a tinha ao alcance da minha vista me alarmava silenciosamente coisas que eu não arriscaria verbalizar nem para minha própria sombra.

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