Prologo

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O dever da vilã é terminar a sua vida em sofrimento. Ela deve pagar pelo dobro de dor que causou nas outras pessoas. Pouco importa quais são as suas motivações ou se ela chegou a se arrepender, uma vez que o estigma é cravado em sua alma, nada poderá compensar as suas crueldades. Essas são as regras. Esse é o carma da vilã.

Respiro fundo pela décima vez e volto a me concentrar na passagem escura do corredor por qual eu caminhava. Meus sapatos altos batiam com força no concreto seco e mal-acabado, alertando a todos os condenados da minha presença. E eles não gostavam de me ter ali, mas os moribundos em suas celas não passavam de obstáculos facilmente ignorados, o meu objetivo se encontrava no final do corredor, me esperando para mais uma rodada de tortura.

Eu já estava farta dessa repetição, afinal, quatro vezes é demais.

A cela dá prisão estava escura, o cheiro da umidade e dejetos humanos preenchia todo o ambiente, quase anulando o odor pungente da habitante suja do outro lado das grades. Ela não se mexeu ao notar a minha presença. O guarda que me acompanhava se prontificou em acender as tochas penduradas nas duas extremidades do carcere, e sem que eu precisasse emitir qualquer ordem, ele deixou-me a sós após uma longa reverência.

Peguei o delicado lenço de seda com bordados de fios de ouro de dentro do bolso da saia do meu vestido e o posicionei em frente ao meu nariz. O cheiro ainda era insuportável.

- Sinto que não se lavou hoje - disse em direção a sombra tremulinante.

- Sarcasmo não lhe caí bem, deveria saber. - A voz rouca e quebrada ainda estava altiva, os cem dias encarcerada na escuridão ainda não havia quebrado a sua alma.

Por enquanto.

- Tem razão, é um método ineficaz de se conduzir uma conversa.

Conforme meus olhos se acostumavam com a iluminação precária das tochas, o cenário começou a tomar forma. Não era uma visão agradável. Ela estava sentada no chão, com a cabeça apoiada na parede e os braços soltos ao redor do corpo, estava no mínimo dez quilos mais magra, os cabelos estavam cortados acima da orelha em um corte desigual e maldoso. Os fios que antes eram de um tom loiro dourado e brilhoso, agora estava opaco e encardido. Ela não se parecia mais com a gloriosa primogênita do marquesado. Agora não passava de uma sombra da brilhante amada herdeira que um dia foi, subjugada para que a minha felicidade prevalecesse. Para que eu vencesse.

- Não entendo o que faz aqui. - Ela limitou-se apenas a encarar as grades que nos separavam.

- Existe algo de perturbador em vê-la nessas condições. - Finalmente ela olhou em minha direção com as sobrancelhas franzidas. Seus olhos cravaram nos meus. - E eu devo admitir que gosto dessa sensação.

Longos minutos se passaram em silêncio. Olhos castanhos e azuis se encaravam em uma tentativa de desvendar quais pensamentos rondavam por ali.

- Finalmente resolveu mostrar quem realmente é?

Ela se arrastou em direção as grades da sua cela e as agarrou com ambas as mãos.

- Eu sempre fui sincera, ao contrário de você, fingindo ser boa e caridosa. - Me aproximei mais de seu rosto e com a minha mão enluvada agarrei o seu cabelo em um movimento rápido. - Deve ser doloroso estar atrás dessa cela dia a após dia, entendo que me olhe como a vilã por colocá-la aí, mas é o seu destino. Então, sim, irmã, talvez eu seja a verdadeira vilã.

Soltei o seu cabelo e alguns fios ficaram em minha mão, guardei-os com o lenço no bolso do meu vestido. E me afastei para longe da mulher que arquejava de dor na escuridão. Refiz o caminho silencioso sozinha. Apesar da ausência significativa de sons, minha cabeça estava barulhenta, mas isso era passageiro, porque logo eu desligaria qualquer ruído de consciente da mente e trilharia o caminho que me esperava e aguardaria o meu glorioso final.

O final da vilã.


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Boa tarde! Espero que gostem desse novo projeto!
Aviso desde já que esse capítulo é uma prévia, ou seja, as postagens semanais começarão a partir de janeiro!
Então já favoritem para não perder as atualizações!

Obrigada!

O carma da Vilãحيث تعيش القصص. اكتشف الآن