Capítulo Único

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As noites de insônia já não eram mais tão raras como costumavam ser.
E ele já não conseguia lidar com elas tão bem quanto antes.
Não importava quantas xícaras de chá ele tomasse, quantos livros lesses ou manuscritos escrevesse ou até mesmo quantos carneirinhos contasse, Fyodor Dostoevsky não conseguia pegar no sono.

Ele havia tentado formas pacíficas de adormecer, mas sem sucesso.
Ele estava agora começando a pensar em formas mais brutas

Talvez se ele batesse sua cabeça com força na parede, um evenenamento inofensivo...
Ele até mesmo pensou em simplesmente não dormir, adicionar essa noite a longa lista das noites em claro.
Mas ele estava preocupado que o seu fraco corpo mundano não tolerasse tais ações.

Por fim, decidiu tocar o violoncelo.
Minutos se decorreram e Fyodor ouviu passos se aproximarem pelo corredor e antes mesmo de a porta se abrir ele já sabia quem era.

— Dos-kun! - Uma voz animada disse seu nome.
Nikolai Gogol entrou sem bater.

— Olá Kolya.

Eram quase duas da manhã, mas a estranha disposição de espírito de Nikolai permanecia intocada.
Caminhando pelo quarto, como se fosse seu, bagunçando os livros e retirando os papéis de seus lugares, quase quebrando uma xícara de chá encostada ao pé da cama.

— Eu ouvi música – Observou.

— Estava apenas passando o tempo. O que você faz acordado?

— Oh, você sabe. A noite foi feita para se fazer coisas que não são permitidas a luz do dia!

Fyodor lançou-lhe um olhar.

— Ah, é um segredo, mas eu posso lhe contar se quiser.

— Vamos deixar que continue sendo um segredo.

Nikolai sorriu.

— E você?

— Não consigo dormir.

— Entendo.

Não era a primeira vez que Gogol entrava naquele quarto esperando encontrá-lo completamente escuro e em silêncio, mas ao invés disso o encontrava com as luzes acessas.
A insônia era de fato uma experiência miserável.

Eles permaneceram em silêncio até Nikolai quebrá-lo.

— Dos-kun, vamos dar um passeio! Está uma noite agradável lá fora.

Fyodor olhou pela janela, a temperatura lá fora estava abaixo de zero, frio o bastante para matar um homem.

De repente seu quarto branco pareceu quente demais e o frio pareceu atraente.
Definitivamente mais atraente do que a insanidade da insônia.

Trocou as vestes de dormir pelas vestes de inverno e ambos partiram noite adentro.

Eles caminharam lentamente, as ruas silenciosas e vazias pelo horário tardio.
Exceto pelo ladrar de um cachorro aqui e ali, e um ruído de um pneu a deslizar pela neve.
O vento gelado cortando seu rosto e tremeluziando os cachecóis.
Ele respirou fundo, inalando o inverno. O ar frio purificando seus pulmões.
Ele já estava se sentindo bem melhor.

O caminho que tomaram era conhecido por Dostoevsky, ele caminhou por ali incontáveis vezes em diferentes noites e diferentes dias.
Já fazia alguns anos que ele havia se instalado em São Petersburgo e de todos os passeios, este era o seu preferido.
Só assim ele podia ver seus antigos amigos.

Não eram pessoas, claro.
E sim aquelas queridas construções.

Como o prédio que estavam adicionando mais um andar e o prédio que quase fora queimado pelo fogo.
E aquela casinha rosa que ele gostava tanto, a casinha rosa que se destacava entre suas vizinhas vulgares e fora cruelmente pintada de amarelo.

Noites Brancas - FyolaiWhere stories live. Discover now