Capítulo 1: Eu sou...

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Meu nome é Samantha Sousa, tenho 19 anos e moro na Ceilândia Norte. Não sou muito alta, tenho 1,70, porém sou a segunda mais alta do meu grupo de amigos. Estamos naquele limite após o Ensino Médio, o grande momento para decidir sua carreira e dar direção à jornada de trabalho ou acadêmica. A Carol e a Júlia entraram na faculdade, o Pedro e o Luis estão trabalhando, já a Amanda está no curso técnico. Eu finalizei o Ensino Médio com 17 anos, mas ainda não decidi o que fazer da vida, não sei o que fazer no futuro.

Não é por falta de vontade, mas de oportunidade. Sinto que eu gostaria de ser muitas coisas, inclusive, escritora. Eu gostaria de escrever artigos, revistas ou livros de contos e talvez, romances. Já criei até blogs na internet para falar sobre as novidades da escola e da vizinhança, com um tom mais elaborado, trazendo um maior gosto ao que seria lido, no entanto, não tinha nada exageradamente bom.

Algumas pessoas leem o que eu escrevo, meus amigos, meus pais e alguns conhecidos. Os anônimos são meus seguidores especiais, alguns me odeiam gratuitamente e me insultam na maioria das publicações. Eu tenho certeza que é algum colega irritante da escola ou alguém que não me superou. Incrível como as pessoas passam pela nossa vida, não são mais necessárias e ao invés de sumir, elas preferem se tornar sombras da experiência de alguém. Não faz sentido nenhum ficar perseguindo alguém que eu não goste, faz mais sentido eu apagar completamente esse alguém da minha vida e nunca mais ir atrás.

Eu sempre reflito sobre isso toda vez que vejo esse tipo de coisa. Meu pai, George, fala para ignorar essas pessoas que uma hora elas param. Minha mãe, Vanessa, diz que eu deveria sair das redes sociais, porque só tem o que o não presta. É, eu sinto que gosto mais de conversar com meu pai, além de parecidos esteticamente, ele é um homem negro, forte e alto, eu também sou parecida mentalmente, porque sempre estou adepta as novas experiências, principalmente do mundo digital.

Meu pai sempre foi muito gentil e não me cobra perfeição. De forma alguma, ele vive falando que eu deveria ir no meu ritmo e escolher aquilo que eu realmente goste de fazer. Rotineiramente, escuto sua frase ressoando na minha cabeça toda vez que vou pensar no meu futuro:

"Não adianta encontrar um emprego ou estudar algo que você não goste. Não vale a pena gastar tanto tempo da sua vida e odiar aquilo que faz. É melhor decidir quando estiver preparada para fazer aquilo que gosta, porque mesmo que não seja fácil, ainda vai ser algo que você queira."

Meu pai sempre me aconselha nessas decisões, sempre deixa que eu cresça por minhas próprias escolhas. Mas ele diz isso a partir do seu ponto de experiência. Ele pode ter uma vida bacana, morar numa casa simples de três quartos, uma cozinha, uma sala e dois banheiros, uma esposa que é dedicada e amorosa, uma filha esforçada e comunicativa, ser dono do próprio negócio, mas sinto que ele não se sente tão realizado.

Em qualquer brecha, ele conta que seu sonho era ser da polícia, ser alguém que serve a pátria e protege seu povo. Porém, sua frustração aparece quando chega na parte que machucou gravemente o joelho por besteira e durante o processo de seleção, ele teve que operar. Meu pai é formado, ele atua na área comercial e por isso conseguiu se sair bem com seu negócio.  Um plano B que não arriscaria deixar sua família passando necessidades, mas que contrapôs os seus sonhos. Ele teve medo de falhar completamente, medo de não suprir as expectativas sociais, por isso desistiu sem pensar em outros meios de alcançar aquilo que desejava.

Por isso me sinto ainda mais parecida com ele. Tenho medo de tomar a decisão, ela ser errada e eu não ter forças para continuar, porque quando eu alcançar o famoso 30 anos, quero uma vida estabilizada, o emprego dos sonhos e se possível, a minha família. Quem não quer chegar nessa idade e ter conquistado tudo? Quem não quer atender essas expectativas? Todavia, o primeiro passo eu ainda não dei e é por isso que eu não quero errar, porque eu não sei se saberia recomeçar.

Mas há algo que eu goste de fazer, algo que eu gosto muito. Diria ser um hobbie bem estranho, mas no meu tempo livre eu fico anotando, escrevendo e compondo textos, trechos, frases, poemas, enfim, escrevo sobre a vida, sobre o dia a dia, sobre tudo aquilo que me encanta e me interessa. Eu amo terminar meus afazeres e sentar na praça ou em pontos convenientes para fazer essas escritas. No entanto, vou só nos  tempos livres mesmo, tenho que ajudar minha mãe em casa, fazer parte das tarefas domésticas e ajudar meu pai no trabalho, eu recebo por isso. É quase como um apoio que ele considerou importante quando eu ficava no caixa ou ajeitava as prateleiras para passar um tempo com ele, atualmente é oficial, um quase emprego!

Eu fico das 13h até às 16h e depois vou passear, parecido com os cinco patinhos, mas eu não fico por lá, contudo, só precisa do chamado da minha mãe por mensagem e eu corro de volta para casa. Nessas saídas, além de escrever, encontro meus amigos e às vezes eles me levam para conhecer lugares que não constumo ir, festas, baladas, parque de diversões e o meu favorito, o shopping. Não há nada melhor do que ficar horas na biblioteca, lendo as capas dos livros que eu não pretendo comprar e comparar os preços, sempre dizendo que seria melhor comprar pela internet. Tenho certeza que os funcionários estão cansados de ver nossos rostos cheios de satisfação e as mãos vazias sem nenhuma sacolinha.

Em uma dessas, acabei encontrando livros com textos e frases para superação e autoajuda, nunca considerei algo tão agradável como observar a vida por outro ponto de perspectiva, algumas coisas eu tenho certeza que já senti e parece indireta feita por um stalker, mas outras não se encaixam nas minhas experiências e eu me pergunto, será que vivi o suficiente? Será que me apaixonei ou amei da forma correta? Enfim, acho que a coisa mais divertida que podemos fazer no nosso dia a dia, é nos perder em mundos e histórias que talvez nunca iremos viver.

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⏰ Last updated: Mar 08, 2023 ⏰

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Por Uma NoiteWhere stories live. Discover now