Capítulo 01: O louco selvagem

184 31 205
                                    


Mais um dia tedioso em Shady City, uma cidade fria e cinzenta. O clima constantemente chuvoso transmite uma sensação sombria. E as árvores aparentemente velhas, tornam a cidade ainda mais assustadora, sem falar nas casas com tons de verde musgo e betume.

No meu auge dos 30 anos, eu me sentia vazio e perturbado. Mesmo tendo tudo, eu não tinha nada. Ainda trabalho na central do maior hotel da cidade e com isso vem todo tipo de cobrança. Sempre penso que o diabo passa por atendimento ao público. Ou talvez lidar com pessoas não seja o meu forte. Sinceramente, não sei como não gastei meu réu primário.

Em uma sexta à noite, dia da minha folga, resolvi ir ao bar menos frequentado de Shady City. Minha intenção era esvaziar a minha sensação de fracasso, tentar a todo custo fugir de mim mesmo. Beber não era a solução, qualquer pessoa decente diria. E quem precisa de decência aqui em Shady City?

Ainda pensava nisso quando senti um arrepio eriçar minha pele. Sabe aquela sensação de alguém estar te observando? Sentia até a minha espinha arrepiar!
Alguém também está vendo essa criatura? Não sei ao certo dizer se essa sensação era de fato boa ou ruim. Pretendo descobrir. Que seja em breve.

Era um rapaz alto, de pele negra, cabelo raspado e olhar afiado. Fazia anos que não saía com ninguém, ou ao menos interagia para passar o tempo. Eu me fechei. Meu psicólogo não teria tanto orgulho de mim por isso, mas do que eles sabem?
O tal rapaz, sorria pra mim, e quando dei por mim ele já estava na minha mesa. Acho que fiquei hipnotizado com sua beleza. Ou pelo menos encantado.

A partir daí, Fábio - o nome do rapaz - me chamou pra ter a melhor noite da minha vida. Eu sabia que tudo apontava para uma cilada, porém, com sua proposta de me tomar em suas mãos negras, grandes e frias, eu me entregava e refletia "espero não me arrepender". Sou muito pessimista, outro ponto que meu psicólogo sempre fez questão de apontar.

O lance de não falar ou entrar no carro de algum estranho nem passou pela minha cabeça.
(Não tem volta, e sinceramente, eu não faria esforço algum para voltar!)

Meu apartamento era uma coisinha minúscula e sem vida, mas Fábio se sentia bem confortável, enquanto eu me arrepiava a cada toque de seus dedos pesados. Parecia um déjà-vu, uma memória e que não havia outra opção além de estarmos aqui, nesta hora, em Shady City.
Entre uma caricia e outra ele me encarava, da mesma forma que um predador contempla a lua cheia em uma noite estrelada.

Esse louco selvagem! Ele estava ardendo em prazer, eu podia perceber pelos gemidos. Mas não era um prazer ordinário como os que vocês estão acostumados a ver ou a sentir. Fábio queria tocar minha alma. Queria mais que um sexo selvagem e casual.
Queria minha sanidade, da mesma forma que desejamos um chá quente depois de sermos apanhados por uma tempestade.

Àquela altura, eu tinha total noção que eu poderia morrer em suas mãos, ou talvez apenas desejasse isso, morrer em deleite, morrer em gozo. Deus, minha vida era tão monótona...
Ou será que eu já era dele? Muito cedo pra pensar assim? Estou indo rápido demais? Existe uma medida para a velocidade da paixão?

Enquanto tirávamos nossas roupas, encarei sua nudez. E ardia. Ardia meus olhos.
Criatura negra e brilhante que ninguém conseguiria apanhar de tão escorregadia. Só ele que tinha todos nas suas mãos. Nessa noite eu senti o sobrenatural e gostei do que experimentei.

Controlador e arisco, beijava minha testa e lambia minha orelha. Ele dançava.
Sim, começou a dançar para mim, e cada passo daquele estranho tinha a suavidade de uma folha de outono. Se movimentava como uma pluma, flutuava como uma borboleta.

Borboleta Monarca Onde histórias criam vida. Descubra agora