Capítulo 1

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Estou limpando o chão enquanto Marcus, o colega da batata frita, se lamenta que queimou os dedos. Coitado, eu o entendo. Também detesto quando tenho que ficar nessa parte. Mesmo que o chão precise de cinquenta esfregões, o que nunca precisa porque tem sempre um de nós limpando, eu prefiro estar nele que mexer com óleo quente.

— Para de se lamentar, jovem — Amélie, a garota das louças incessantes, o atenta. Ela tem isso de ver a vida com olhos positivos, apesar da pouca idade. Juro para você que os 17 anos que Amélie tem não influenciam na sua vida tão cheia de positividade.

Em minha opinião pessoal, acho que ela ainda não passou por buracos da vida que a farão se tornar um pouco mais casca grossa. Embora ela diga que é seu destino ser assim, que seus pais já sabiam disso quando a batizaram pelo nome de Amélie, uma forte inspiração sobre Amelia Earhart – a primeira mulher que viajou sozinha sobre o Oceano Atlântico.

Amélie se orgulha muito disso e garante que um dia fará algo tão grande para o mundo assim como a Earhart. Eu não duvido disso, porque força de vontade a garota tem.

— É fácil você dizer que estou me lamentando quando está com a parte fria da casa. Água não te esquenta e não te faz suar como um porco — Marcus reclama, ríspido. — E você não precisa evitar que esse suor caia na caramba do óleo para não ser queimada com os respingos subindo, e nem com a possibilidade de ser demitida por isso!

— Você só está estressado assim porque está com a temperatura do corpo elevada por estar perto de fogo — Amélie ri. — Tome cuidado.

— Amélie — Marcus tira um segundo das batatas para encará-la. — Vai se ferrar.

Ela dá mais uma risadinha, o que quase me faz rir, mas minha atenção é roubada dos dois quando, conferindo o zíper da calça do uniforme, Livia entra na cozinha. Depois de perceber que está ok, ela nos olha e começa a estalar os dedos.

— Vamos, vamos! Estou ouvindo muito chiado de vocês. A casa está cheia. São oito da manhã e está chovendo. Por que não tem ninguém no balcão e pegando os pedidos?

— Você não estava fazendo isso? — questiono, instintivamente. Porque de fato Livia estava na frente hoje, até o momento em que eu pudesse me juntar a ela. Isto é, depois de acabar com o chão.

Mas, infelizmente, sua mania de achar que dormir com o superior a faz uma chefe nossa, não a deixa perceber que ela é tão funcionária quanto nós.

— Não — ela faz careta para mim. — Vai atender! — ordena.

Minha língua coça para rebater, mas o dono do lugar, Paul, entra na cozinha logo depois e está agoniado enfiando a blusa dentro das calças, o olhar meio perdido enquanto se atenta em nós.

— Pessoal, vamos trabalhar — ele diz, a voz querendo sair enérgica, mas não conseguindo. — Esther, larga o esfregão e vai pegar os pedidos. Amélie, muita lerdeza com as louças. Seja mais ágil. Marcus, as batatas dos clientes não podem estar frias! Não frite tantas! — ele se vira para Livia. — Você fica nas louças e Amélie prepara os pedidos.

— O quê? — Livia parece ofendida e horrorizada ao mesmo tempo. — Fiz minhas unhas ontem!

— Grande merda — Marcus sussurra em seu espaço, o que deixa o nosso chefe desconcertado. Particularmente, acho corajoso da parte dele.

— Não tenho escolha — Paul se justifica para ela. Que irônico. — Esther, por que ainda está aqui?

Me apresso em largar o esfregão e ir pegar os pedidos. Como imaginei, todos os assentos estão ocupados e sei que esse vai ser um dia daqueles.

Vendaval de Areia #4 (NA AMAZON)Where stories live. Discover now