Capítulo Um: Interlúdio Noturno

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O canto dos grilos pulando na noite se intensifica nos campos rodeando a velha casa da madeira aonde eu vivo desde que nasci. No meu espírito desorientado, suponho que faz pelo menos três horas que a lua está no céu e me dou conta que alguém me chama, ao longe, alguém está soprando meu nome.

-Mel. Mel.

Me contorço ligeiramente, tentando recuperar o sono profundo que está fugindo de mim. Eu não quero me levantar, não agora...

-Melinoé estou te chamando.

Uma voz masculina entra no meu ouvido, o que é suficiente para que eu abra os olhos e levante a cabeça. Não é preciso muito tempo para eu saber a quem pertence essa voz masculina, eu a reconheceria entre mil. Ela é grave, séria, como se toda palavra que é pronunciada fosse uma ordem.
Meu pai me olha enquanto tento lamentavelmente despertar.

-Estou aqui.-Respondo, a voz rouca pelo o sono e me coçando os olhos afim de caça-lo-. Estou aqui.

-Temos uma nova chegada inútil. Você sabe o que tem que fazer.

Ele estava ao lado do meu colchão estufado de palha, a postura direita como um I. Meu pai era sempre assim: ele nunca explicava demais as coisas e quando o trabalho devia ser feito, ele devia ser feito, mesmo se agora é provavelmente duas ou três horas da manhã.

-Eu não gosto disso e você sabe.-O olho, o rosto inchado de sono-.

A decisão dele não parece mudar. Viro a cabeça afim de observa-lo, mas não vejo a sua expressão facial. Realmente está de noite. Uma noite obscura. Os grilos não estão prontos para se calarem.

-Eu sei, mas é o seu trabalho. Se você pensa que você não é obrigada de fazer tudo, você nunca saberá como ser a melhor em qualquer situação. Ainda mais, estarei levantado toda a noite sem dormir, você tem que fazer isso por mim.

-De qualquer forma eu sei que não sou a melhor para as chegadas inúteis.

Me levanto lentamente enquanto meu pai ri baixo em resposta do que eu disse.

-Vamos, irei contigo se você quiser. Hoje estarei acordado toda a noite.

Um sorriso se desenha nos meus lábios, e mesmo se através do escuro eu não o vejo, imagino que ele também está sorrindo.

-Vamos.

Enquanto ele sai de casa, tiro minha camisa de noite desgastada pelo o tempo e me visto, ainda um pouco dormente. Não ponho mais nada que uma camisa à quadrados vermelha e uma calças, pondo em seguida umas botas de couro marrom.

Essa é minha vestimenta todos os dias. Eu sorrio, lembrando que minhas duas irmãs mais velhas também usaram a mesma roupa todos os dias durante anos com a mesma idade que eu. É desse jeito no Distrito 10: não temos nem tempo nem dinheiro de comprar nova roupas, passá-lo aos seus irmãos mais novos é 1 solução que muitas famílias encontram, a minha incluída.

Olho ao meu redor. Em suas camas respectivas, Thanatus et Eyal dormem profundamente. Eu não sinto injustiça do estado deles: daqui três horas eles vão trabalhar tão duro quanto eu, principalmente Thanatus.
Não ter nada a fazer no Distrito 10 é pura mentira, pura imaginação, isso apenas pode acontecer em sonho.

Saio de casa de um passo decidido.
Ao abrir a porta, cheiro o ar fresco da noite de Panem e olho para o céu pintado de estrelas. Confirmo então minha teoria ao olhar a inclinação da lua: realmente é três horas da manhã, hoje irei então começar a trabalhar às três horas da manhã.
Isso acontece às vezes, ainda mais nos dias que tem chegadas inúteis.

-Melinoé !

Eu viro a cabeça no momento que meu pai me chama e o olho ao longe, o capim está engulindo as pernas dele até a meio delas e ele tem uma lâmpada na mão.

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