44. O Filho Que Ainda Existe.

315 24 1
                                    

O gosto do chá de camomila é suave ao esquentar a minha língua. Olho para minha mãe, sentada na poltrona ao lado da minha, colocando duas colheres de açúcar na xícara cheia dela. Decido tomar mais um gole.

- O León é gay, não é? - ouvir ela perguntando isso tão rápido faz com que eu quase afogue-me.

- Sim, sim. Ele me contou - respondo, desconcertado.

Ela dá de ombros e beberica um pouco do líquido.

- Bom. Isso já diz tudo. É óbvio.

- Como assim? - peço para que ela explique-me.

- Quando estávamos juntos, ele e eu, ocorriam momentos em que ele se esforçava para corresponder ao meu afeto. Principalmente durante as relações sexuais. A intensidade com a qual eu me entregava não era a mesma vindo dele. Mas uma coisa eu ainda não entendo: o que o levou à tentar uma coisa que jamais daria certo?

- Eu acho que vocês vão ter que conversar sobre isso.

Ponho a xícara com pires na mesinha a frente e vejo através da vidraça atrás da gente o céu parecendo um oceano pleno.

- Você mudou - diz ela, analisando-me com mais atenção. - Seu aspecto está mais forte. Seu olhar, adquiriu uma dureza. Ainda sim, há uma parte do antigo Anthony em você.

- Minha jornada até aqui foi de muitas transformações. Precisei aprender lições muito mais difíceis das que eu poderia esperar. Doeu. Em troca, estou mais resistente.

- Qual foi a pior parte? - ela se inclina um pouco para frente, curiosa.

- Sair de casa. Ficar longe de você. Eu meio que mereci esse choque. Fez com que eu enxergasse a minha vida de uma outra forma.

- Onde estão morando?

- León tem uma cabana na floresta, perto da estrada. É bem estruturada e equipada. Tranquilo para morar. Já foi lá uma vez?

- Ele nunca me levou lá - ela bebe mais chá.

- Devia ir lá um dia desses.

- Talvez.

Isso não me pareceu sincero, nem falso. Só algo incerto. Como se ela estivesse buscando sentido ao dizer "talvez".

- Você me odeia? - indago, engolindo em seco.

- Talvez - de novo.

- Vai me perdoar algum dia?

- Talvez.

- Eu não sou mais o seu filho?

Desde que essa pergunta vem chicoteando no ar, o clima da sala fica ambíguo. Ela põe a xícara com o pires ao lado a minha sobre a mesa. Trocamos uma espécie de olhar que temos um pelo outro desde que tomei consciência dos meus primeiros dias na terra, o olhar de conexão.

- Como posso te negar, Anthony? Eu senti você crescendo dentro de mim. Vi você nascer. Eu criei você. Não tenho uma razão para apagar sua existência da minha vida.

- Então, aquilo que você falou antes de eu ir embora com o León...

- Não é verdade. Eu estava muito puta. Minha cabeça era uma erupção apocalíptica. Nesse caso, peço perdão por tudo o que eu falei naquele dia para você.

Ela disse isso mesmo? Processo várias vezes essas palavras, ao mesmo tempo que minha visão vai ficando turva por conta das lágrimas. À partir daqui, não tenho mais como segura-las.

- Ainda não estou disposta voltar à confiar em você. Só você pode me provar se posso. Eu não sou uma pessoa de guardar mágoas. Então... Eu te perdoo.

Uma torrente já desce dos meus olhos e sou envolvido por soluços. Ouvir aquilo é mais que libertador, é divino. Entretanto, um lado meu diz que não sou merecedor, mas eu sei que sou. Eu vim até ela, e não foi à toa. Algo me fez crer que já era a hora.

- Eu nunca quis te fazer mau nenhum, mãe.

- Eu sei, querido - a voz tranquilizadora dela suscita aquelas lembranças de quando eu tinha 6 anos e brincávamos na areia da praia.

- Eu nunca quis seduzir León. Não tinha planos para rouba-lo de você. Mesmo assim, eu estraguei com tudo.

- Ou vai ver, ele não era para ser meu.

Ela se levanta e eu faço o mesmo. Os braços dela se fecham entorno de mim. Percebo que ela também está chorando.

- O que acha de vocês dois irem lá em casa mais tarde?

- Vai ser um prazer, mãe.

E assim, ficamos abraçados por um logo tempo, recompensando a distância que já não existe mais entre nós.

Da mesma maneira como vim para o centro da cidade com Rick, solicito um motorista pelo aplicativo Uber e volto para a cabana pagando uma corrida de carro. No banco de trás, agarro-me naquela sensação quente que o abraço da minha mãe deixou em mim. Um sorriso vitorioso cresce em meus lábios. Fico tão fascinado que nem me vejo chegar em meu destino.

Pago o motorista e dou cinco estrelas. Desço do veículo correndo direto para dentro da cabana. Não consigo me conter em querer contar para León tudo o que rolou naquele consultório.

- León! - chamo por ele ao passar pela porta. - León - passo pela cozinha e a sala de estar, nenhum sinal dele. Subo até o quarto, nada. Banheiro, vazio.

Onde ele se enfiou?

Retorno ao andar de baixo e de repente algo duro e pesado atinge com tudo minha têmpora. O mundo vai sumindo enquanto tombo no chão. Eu apago.

Vou recobrando a consciência aos poucos. Tudo está desfocado e minha cabeça lateja. Caralho. A porrada foi valendo. Mas que filho de uma puta teria feito uma coisa dessas comigo?

Logo descubro-me deitado com amarras em volta dos meus braços, prendendo cada um nos ferros de uma maca hospitalar. Contudo, não estou em um hospital. O local é uma sala com iluminação muito parca, suja e bagunçada. Um porão abandonado. Vendo mais em volta, meus olhos se arregalam para o que está na minha frente.

Há quatro homens comigo, também amarrados em macas. Nathan, Gavin, Edgar e León. Todos desacordados e com fitas adesivas sobre as bocas. Tento chamar por eles, sem sucesso, pois minha boca também foi tapada.

Em menos de um segundo, a ficha de que fomos sequestrados cai para mim.

Meu Padrasto Irresistível (Romance Gay) - Agora No KINDLEحيث تعيش القصص. اكتشف الآن