Capítulo VII

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I

O dia chegou. Uma dor, lembrando um prego sendo martelado em minha cabeça, me despertou. Dor latejante e leitosa. Irritante. Ah, foi doloroso me levantar, caminhar até a porta, sair e pedir por um bom chá para essa dor. Foi uma das empregadas que me levou de volta para o quarto, usando um tom incisivo, dizendo que deveria descansar naquele dia.

Natsu veio, e nem lembrava que tinha dormido por lá, em casa!

"Não entre!..."

Mandei antes dele abrir toda a porta.

"Por favor..."

Clamei, me cobrindo com a coberta. A dor não me deixava me concentrar; não me deixava também me vestir para ele, não queria que ele me visse daquela forma. Seria humilhante. Desejaria a morte a isso, mas cabeça dura como era, virou a maçaneta e empurrou a porta.

Passo a passo, se aproximou...

O peso na beirada de meu colchão me fazia saber onde ele estava.

"Por que se esconde de mim?..."

"E-eu... Você não entenderia."

"E por que acha isso?"

Sua mão pesou sobre minha cabeça, e isso me agitou.

"Está tudo bem, Carla. Me diga, como está se sentindo?..."

"Fraqueza e dores nos ossos. Mas o que mais dói é a minha cabeça! É como se pregassem pregos nela à marretadas."

"Que estranho, ontem estava tão bem. Tenho que medir sua temperatura, posso?"

"Não!... Não pode..."

"Sabe, nunca falei com uma manta antes..."

"Hum..."

Ele se deitou ao meu lado. Tocou meu ombro, subiu a mão, deslizando os dedos pelo tecido da manta felpuda, buscando meus dedos. Eu agarrava aquela coberta quase como escudo, cobrindo meu corpo todo.

"Saia, por favor... Se você... Se você-"

"Se eu tiver?..."

Sua mão tocou a minha. Tremia toda, sentindo puxar lentamente para baixo, revelando-me. Minhas pernas lembravam as de um gato, meus braços, cobertos por tufos de pelos brancos; contrastavam com o restante do meu corpo. Inspirava rapidamente, enterrando meu rosto contra o travesseiro, tentando me encolher e me esconder.

"Não! Você não vai mais me amar!..."

"Boba."

Com um movimento, fez-me virar meu rosto para ele. Quase chorando, com os olhos lacrimejando. Envergonhada, nem ao menos conseguia o olhar, pois... Natsu enxergava meu verdadeiro eu. Um monstro.

"Você é linda."

Isso marcou minha alma. Seu sorriso tão verdadeiro, tão doce.

"Mentiroso..."

"Por que acha isso?"

"Todos acham isso..."

Se aconchegando ao meu lado, puxando-me para seu peito, me abraçou. Sentia seu corpo com minhas costas. De conchinha... ele perguntou:

"Mas sou todo mundo agora? Minha mãe dizia que não sou."

"Pare de ser idiota..."

Tentava resistir.

"Mas esse é meu ponto forte."

Seus dedos entrelaçaram-se aos meus.

"Tenho que medir sua febre... Tem que se virar."

"Não quero..."

"Carla..."

Sussurrou ao pé de meu ouvido, arrepiando meu corpo, tocando meu cabelo. Relutante o fiz. Nos encaramos por um bom tempo. Um pouco chorosa, tentava não o olhar. Encolhida entre os ombros igual uma tartaruga em seu casco. Num movimento tocou a testa na minha. Podia sentir seu hálito suave e calor. Meu coração atacava. Batia firme, talvez até dando para escutar.

"Está com um pouco de febre. Vou pedir para fazerem um chá de salsinha para você..."

Beijou minha testa, depois tocou meu rosto.

"E não pense essas bobagens... Você é a mais linda mulher que já vi nessa vida."

Minha cauda balançava levemente por debaixo da manta.

"Verdade?"

"Uhum. Agora descanse, eu volto com seu chá; ou pediu um já?"

"Eu tinha pedido um... Mas... Quero esse que falou."

Murmurei fraquinha, porém, fazendo um pouco de manha.

"Ok. Volto logo. Vamos ficar observando essa sua... gripe..."

II

O chá ajudou, porém bem pouco. A dor mingou – só estava leitosa, um pouco pastosa, doendo; pulsando num só lado da cabeça. – Natsu me fez companhia a quase todo o momento, somente descendo para ver Helena, pois sua situação dia a dia estava cada vez mais preocupante. – Tinha um olhar sério no rosto quando se virava, pensativo em algo.

Cecília seguia bem quietinha com seu pano na boca também.

Um dia, depois outro, mais um. Adoeci e fiquei de cama. Meus pés estavam trocados, caia às vezes, e sentia dores no estômago. Cecília me maquiava para que eu pudesse parecer, mesmo que pouco, mais saudável. E o inverno só tendia agora, na época, a piorar. A nevasca brutal amedrontava os médicos e afugentava os viajantes. Sendo, então, a razão de meu professor alongar sua estadia... 

Promessas de primaveraWhere stories live. Discover now