Capítulo IX

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I

Compartilhando sua atenção entre eu e Helena, parecia cada vez mais estranho, perto de entender nossa moléstia. Silencioso. Observando. Doente. Quando me carregava para ficar na sala para ficar sentada à lareira, tinha uma ligeira desconfiança de algo, mas não me contava. No seu silêncio resguardava seus pensamentos. Ele trazia até Helena, dizendo algo como: ela não pode mofar naquele quarto, isso vai fazer mal para ela!, e se entendem mais do que eu. Uma bela desculpa para nos ter sob seus olhos.

Ele parecia um tanto fraco, apático...

Pálido...

E numa noite em questão, a qual não lembro a data, seu nariz sangrou... Um sangue preto e estranho...

Cecília nos servia, e trêmulo, tocou o nariz. Seus olhos verdes pareciam tomar um brilho escuro, sem vida, olhando-a, esfregando entre os dedos aquele sangue. O ar pesou no pulmão de todos. Uma pressão assustadora, estranha e aterradora, da profundeza dos mares. Abissal.

"Cecília... Por que maquia tanto elas?"

Nunca tinha o visto daquele jeito antes.

Uma pergunta estranha.

A lenha estalava conforme mexia usando a vara de ferro.

"B-bem..."

Tensa, assustada, gaguejava:

"P-porque é bom para elas... Para elas se sentirem... melhor! É... Meu trabalho, não?"

"Verdade..."

Seus olhos cravaram-se na alma dela, parecia que nenhum movimento escapava de seu radar. Cecília segurava a barra da saia, de cabeça baixa. Teu tom tão calmo causava medo até em mim.

"Natsu, por que isso do nada?..."

"Nada... minha cara Carla. Uma dúvida apenas, sabe? Só vocês duas adoeceram... Cecília me ajudava... Ela deve ter a saúde de um boi! Tem bons genes, garota..."

"Está me assustando, senhor..."

"Sério? Ah. Mil perdões, Cecília! É que, sabe? Helena adoeceu depois que você chegou-"

"Estaria insinuando que eu fiz isso?!"

"Não! Jamais!..."

"Natsu, onde quer chegar com isso?"

"Vocês duas desenvolveram sintomas de insuficiência renal crônica; mas até aí ok... Ok... Porém, ao mesmo tempo?... Pior: fraqueza nos nervos; a perda do paladar; dores. Anemia! Sintomas estranhos e peculiares. Depois veio o inchaço e as coceiras. Pensei em pernilongos trazendo doenças, em ratos desgraçados, porém, aqui é limpo e estamos em pleno inverno... Cecília, se ousar dar mais um passo para trás, juro, te pego pelos cabelos e te queimo o rosto nessa lareira."

Nenhuma hesitação. Aquilo se tratava de um aviso claro e em bom tom. Helena estava assustada, eu estava apreensiva; aquele homem não era o que eu conhecia. Parecia um caçador brincando com a presa, seu olhar exalava isso: calma; desdém; indiferença. Me agarrava na poltrona, enfiando-me fundo nela. A protagonista, Cecília, lembrava um cervo. Estática. Apavorada.

"Lady... O... O senhor-"

"Por que esse medo? Fez algo errado, Cecília? Venha, isso mesmo... Boa garota... Cécilia, fui aos poucos usando o fio de Ariadne para chegar a uma resposta. Não tinha como ser realmente uma doença, alergia muito menos; pensei, depois de excluir as alternativas, em veneno... Carla e Helena, as duas únicas afetadas por essa misteriosa moléstia... Não batia. – E pensando em Veneno, aí pensei: por que Helena também? Percebe? Ou ela foi de tabela, ou... Alguém queria o lugar dela... E só você tinha coragem de ficar com elas, até pedia para isso."

Promessas de primaveraWhere stories live. Discover now