I

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Se não fosse pela escuridão, os raios e relâmpagos ao longe no horizonte, essa viagem já seria terrível. Agora, estava apavorante com o chacoalhar do barco de um lado para o outro nos empurrando para direções das quais nem queríamos ir.

O vento forte batia contra meu rosto como se fossem agulhas afiadas me atingindo e provocando pequenos cortes em minha pele. Meu cabelo esvoaçava ao seu comando para longe de mim, me permitindo ver no que tínhamos nos metido.

Agora no meio do que em breve se tornaria uma enorme e terrível tempestade, meu estômago embrulhava só com possibilidade de algo ruim nos acontecer.

Tinha dito inúmeras vezes que essa ideia não me agradava, que deveríamos todos embarcar em um avião e em poucos minutos tudo estaria acabado. Mas não. A lei dizia que deveríamos fazer o tour em um navio. E esse era meu carma.

Não é apenas pânico que me assola por saber que apenas a água me envolve e não há mais nada além disso por quilômetros de distância até chegarmos a terra firme. É muito mais que isso.

Minhas mãos suam com a força que faço para segurar em uma das barras de ferro das grades que circundam o navio para nos manter longe de uma queda livre nesse mar desconhecido. E ver toda a tripulação correr de um lado para o outro, gritando coisas que eu não entendo não me deixa nem um pouco tranquila.

Aonde estava Éric uma hora dessas?

A primeira gota de chuva cai sobre meu ombro me arrepiando com sua frieza e após a violenta explosão de um trovão todo o resto da água que está presa nas nuvens densas e escuras sobre nós começa a cair rapidamente, me deixando encharcada em questão de segundos enquanto corro em direção a um abrigo.

Minhas costas batem contra a parede e mesmo que me doesse o baque, agradeço por não ter escorregado em direção a beirada e sim a algo sólido que me freia.
Isso não é a compostura de uma princesa. E isso pouco me importa. Meu corpo todo treme de frio e medo por estar ali sozinha. Aonde Éric estava?

Não fazia nem alguns dias que tínhamos nos casado e ali estava eu apavorada com medo de cair na água e desaparecer em sua imensidão, enquanto meu marido devia estar em nossa cabine traçando uma rota segura até o lugar onde atracaríamos.

Agora não tinha como negar o quão estúpida eu tinha sido por sair do conforto de minha casa, por ter me deixado a ser convencida a fazer algo que detestava.

"Mas, é uma tradição!" Todos me disseram com tom de desaprovação. "Todas fizeram isso antes de você. Até mesmo sua mãe." Como se isso fosse o bastante para me convencer.
E como eu diria 'não' ao meu recém marido que via isso como uma espécie de aventura?

"Ariana!" Escuto me chamarem ao longe. Mal consigo enxergar nesse breu e me nego a dar um passo se quer para qualquer direção. "Ariana!" Gritam outra vez e reconheço a voz. É de Éric, ele veio ao meu resgate.

Com esforço vejo um vulto se aproximar, agarrando a grade de proteção para não escorregar e cair. Ele tem dificuldade de andar com o chão repleto de água da chuva e do mar, que o deixa escorregadio.

Um relâmpago acende o céu e consigo vê-lo encharcado da chuva, com uma expressão no rosto que me deixa agoniada. Algo não está certo.

"Dê-me sua mão." Ele me pede esticando a sua em minha direção. "Precisamos sair daqui, não é seguro ficar aqui fora."

Mesmo temendo o que pode me acontecer, me desencosto da parede e lhe estico minha mão, onde nossos dedos se encontram rapidamente.

Em uma fração de segundos, no momento em que fecharia sua mão entrelaçada na minha e me puxaria para ele, sinto um solavanco que empurra meu corpo contra as grades, me fazendo chocar contra ela, perdendo o fôlego com a pancada e a dor que sinto em meu estômago.
Olho a minha volta e não vejo Éric, ele não está mais ali. O único vislumbre que tenho dele é de seu corpo se chocando com violência na água e desaparecer.

Oceano profundo (completo)Where stories live. Discover now