Capítulo 4

502 27 0
                                    

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.



Só voltei para casa na segunda-feira, depois da faculdade, porque me sentiria culpada se deixasse minha mãe sozinha por mais tempo. Mas a verdade é que o fim de semana na casa da tia Alice havia sido como pequenas e merecidas férias para mim. Era ótimo poder estar em paz, não ouvir ninguém gritando, ou chorando, ou resmungando, ou implicando com qualquer coisa... Aquilo sim era vida. Algumas famílias simplesmente são felizes, e não imaginam a sorte que têm.

Outra vez, a semana passou por mim sem que eu notasse. Entreguei outros trabalhos na faculdade, dei banho em outros bichinhos de estimação de pessoas desconhecidas, me deprimi outras noites por viver sob o mesmo teto que um terrorista, lamentei a teimosia da minha mãe... Enfim, mais uma semana completamente absorvida pela rotina.

No sábado, Chiara me telefonou logo cedo, me convidando – na verdade, praticamente me intimando – a ir com ela ao cinema assistir Os Homens São de Marte... E é Pra Lá Que Eu Vou. Aparentemente, o Fernando iria passar o sábado inteiro trabalhando de novo, e ela estava louca para ver esse filme. Era um entusiasmo até um pouco exagerado, embora o trailer também tenha me feito salivar para ver essa comédia; e olha que eu não sou muito fã do cinema nacional. Mas Chiara era mestra em me contagiar com sua empolgação. Não à toa, ela era minha melhor amiga.

Pegamos a sessão das quatro da tarde. O cinema estava lotado de adolescentes e de casais com cara de primeiro encontro. Não sei explicar como consegui detectar isso; apenas me pareceu que a maioria dos casais que estava ali não tinha muita intimidade um com o outro, mas certamente pareciam loucos para "tatear" algum reconhecimento naquela tarde.

Chiara e eu nos sentamos exatamente no meio da sala de cinema: nem muito na frente, nem muito atrás, e começamos a devorar nosso balde de pipoca antes mesmo do filme começar. Eu tinha desligado meu celular, mas Chiara checou o dela duas vezes em menos de dez minutos. Quando estiquei o pescoço para espiar, ela fez a tela se apagar, e sussurrou que o Fernando estava desejando um "bom filme". Francamente, não sei quem é que escreve esse tipo de mensagem, e me perguntei em que contexto ele queria que interpretássemos isso: se estava sendo irônico, ou lamentando ter que trabalhar, e não ter podido vir com a gente.

Mas deixei isso de lado assim que o filme começou, e passei a próxima hora e meia me revezando entre mastigar porções de pipoca, e rir com os relacionamentos azarados da personagem da Mônica Martelli.

Quando o filme terminou, Chiara fez um pouco de cera para se levantar da poltrona, esticando-se toda, cheia de preguiça. E então saímos calmamente da sala de exibição.

Demos uma volta curta pelo shopping, e ela parou, toda animada, diante de um quiosque de bijuterias. Deu uma olhada nos brincos e pulseiras, e insistiu que eu levasse uma pulseira artesanal preta – dessas tecidas com tear –, que tinha um pingente com o meu nome por cima, preso com uma correntinha dourada. Eu disse que era meio exagerada, mas ela insistiu que ficaria linda no meu pulso, e decidiu comprar.

– Presente de aniversário atrasado – disse ela, prendendo o fecho no meu braço.

– Meu aniversário é em outubro – observei.

– Adiantado, então!

Franzi o cenho, desconfiada.

– Ah, qual é? A pulseira é linda! – argumentou ela. – E como eu disse, ficou ótima em você.

Na verdade, tinha ficado mesmo.

Chiara pagou pela minha pulseira e por um par de brincos para ela, e nós seguimos para a saída do shopping.

Passava um pouco das seis da tarde, e já começava a escurecer. O celular da Chiara tocou, enquanto caminhávamos pelo estacionamento em direção ao seu carro.

– Oi? – perguntou ela, depois de ter dito alô duas vezes. – Não estou conseguindo entender... – Verificou a tela do celular, e começou a murmurar para si mesma. – Nossa, o sinal aqui é horrível...

Ela começou a se afastar, procurando um lugar onde tivesse mais sinal, falando sem parar que não conseguia entender, que a ligação estava ruim... Eu caminhava um passo à frente dela, e ela fez sinal para que eu esperasse no carro, que ela já me alcançava.

Então comecei a caminhar na direção do carro dela.

– Alô? – disse Chiara, um pouco mais alto, de costas para mim, parecendo ligeiramente zangada com a recepção ruim do telefone. – Fala um pouco mais devagar...

Esta foi a última coisa que eu a ouvi dizer. O farol de um carro escuro ao meu lado se acendeu subitamente, e a porta do motorista se abriu. No instante seguinte, eu estava sendo agarrada pelas costas por dois braços fortes, e arremessada no banco de trás do veículo. O sujeito tinha agarrado minha bolsa, e travado a porta antes que eu conseguisse alcançar o trinco. Em seguida deu a partida, e arrancou a toda para longe do shopping.

RaptadaWhere stories live. Discover now