01: Nada de novo

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           Vesti a blusa de mangas longas que minha mãe comprou nas férias do ano passado

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           Vesti a blusa de mangas longas que minha mãe comprou nas férias do ano passado. Ela é aconchegante e preta, um pouco larga para mim, mas ideal para que eu possa me esconder do mundo. Sempre que passo pelos corredores da escola, cubro as mãos com a manga da blusa e coloco os fones de ouvido. Escondo o cabo por dentro da roupa e imagino algumas músicas.

Não tenho um celular. Sou uma adolescente de 15 anos de idade que tem um fone de ouvido, mas não tem um aparelho celular. Escuto músicas escondida no porão de casa, quando meus pais estão discutindo ou estão ausentes. Pelo menos tenho um notebook, no qual salvo todas as minhas listas de reprodução do YouTube. É portátil e contém todos os meus mais profundos segredos.

Começo a caminhar e a imaginar uma letra de música.

Ninguém pode ouvir.

Ninguém além de mim mesma.

Definitivamente, é uma das coisas que mais amo fazer.

Presa na minha imaginação, atravesso o corredor sem ouvir o que dizem sobre mim. Isso funcionava na minha antiga escola, no Alabama, talvez também funcione aqui. Não importa quantos lugares você já esteve, aposto que morei em mais cidades do que você. Tenho um pai em casa que sempre está focado no trabalho e uma mãe meio paranoica. Para eles, o fato de ter estudado em dez escolas desde o primário é normal. Dizem que além de ser "aparentemente divertido", o fato de sempre estarmos viajando vai me ajudar a ser responsável e a ganhar o que os outros chamam de cultura. Entretanto, na prática, as coisas não são tão fáceis assim. Viajar, como nós viajamos, não é muito parecido com as viagens dos filmes aos quais assistimos na televisão.

Não gostava muito do Alabama. Fazia muito calor, e meu pai sempre estava resfriado. Chupava tantos picolés de uva que até fazíamos nossos próprios picolés em casa. A escola era enorme, e eu me perdia todos os dias na biblioteca. As meninas não gostavam de mim, os rapazes me apelidavam, e os professores não sabiam meu nome. Mesmo assim, estava me acostumando com o lugar e não queria ter que me mudar novamente. Passamos três anos lá, minha mãe podia me levar ao cinema, meu pai não trabalhava tanto e, o melhor de tudo, ele não bebia. Estava tudo no seu devido lugar e, pela primeira vez em anos, pensávamos ter encontrado a nossa casa perfeita.

Então houve aquela noite... Aquela noite mudou nossas vidas. Houve uma noite em que meu pai voltou para casa tarde. Minha mãe estava preparando o jantar, e eu estava sentada lendo meu livro de contos. Sempre gostei de fadas, e aquele era meu livro favorito. Eu já disse que era?

Quatro meses antes...

— Se a senhora comprar as saias de babado, a bolsa e o casaco, os sapatos sociais saem pela metade do preço — disse a vendedora para minha mãe, que procurava a carteira dentro da bolsa.

— Podemos fechar assim — respondeu minha mãe, encontrando a carteira. — Sempre é bom ter um par de sapatos sociais, você não concorda, filha? — Eu apenas balancei a cabeça em sinal de concordância.

A Garota Que Não Tinha Cores: YellowWhere stories live. Discover now