O Primeiro Sangue de um Homem - Parte 1

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Era um prédio antigo, típica construção do centro do Rio de Janeiro. Conservarei maiores detalhes a respeito do local para momento mais oportuno. Por hora, creio que seja melhor deixá-los com o seguinte diálogo:

- Você garante?

- Mas é claro que sim! Pode confiar! Por um acaso, já te meti em alguma furada?

- Ah, não duvido de você. É que fico meio receoso por mim, sabe...

- Precisa confiar no seu taco, rapaz! O endereço que passei é bem o que você precisa.

- Olha, talvez não seja uma boa ideia. Acho que vai ser um grande constrangimento.

- Pff, para com isso. Se o problema for dinheiro, pode deixar que eu mesmo pago. Mas não vou permitir que continue do jeito que está!

- Não, não precisa. É sério... Tudo bem. Eu vou. Chega dessa pressão, tá bom? Nessa semana mesmo vou lá.

- Ótimo! Não vá se esquecer, hein. Depois me conte a experiência.

- Certo... Obrigado pela ajuda.

Agora, acredito que algumas palavras de explicação fazem-se necessárias.

Na conversa reproduzida acima, dificilmente o leitor – faço este pequeno diário com a esperança de ser lido algum dia – identificará a qual dos interlocutores pertence esta voz. Pois bem. Sou o tímido moço de 26 anos que aceitou uma infeliz indicação de um amigo. No entanto, seria injusto de minha parte culpá-lo por suas boas intenções (ainda que o inferno esteja repleto delas). Caso ele tome conhecimento desta narrativa, peço que fique tranquilo, pois não é meu desejo expô-lo. Guardarei sigilo de nossas identidades, bem como do lugar onde se desenrolou o fatídico diálogo. Faria pouco sentido, por outro lado, omitir o cenário no qual ocorreu a maior parte dos eventos dessa história, justamente o prédio mencionado no início; portanto, retornemos para seguir em frente.

Aquele edifício provavelmente remontava ao começo do século XX. Não possuía altura maior do que três andares, tamanho suficiente para servir aos propósitos escusos de seus habitantes; a fachada sofrera graves lesões ao longo do tempo, em decorrência das intempéries, o que se fazia visível nas manchas enegrecidas e pedaços desnudos de reboco. Entretanto, quase ninguém poderia notar o que descrevi (exceto, é claro, quem frequentasse o local ao menos uma vez) simplesmente pela construção ser invisível aos transeuntes. Com isto, não pretendo afirmar que o local é dotado de propriedades mágicas. Apresso-me a explicar tal assertiva: primeiro, o prédio ficava espremido por outros dois, maiores e mais corpulentos; depois, ele havia sido construído mais para dentro da calçada em relação aos seus vizinhos, tornando sua fachada ainda mais encoberta; por fim, acrescente a lâmpada queimada do poste que iluminaria aquela parte e temos o resultado: um trecho envolto na escuridão. Mas e se alguém passar ali de dia? Bem, além de ser improvável, por se tratar de um beco afastado e de pouquíssimo movimento em horário solar, ocorre que o edifício não existe de dia; a noite se ligava de maneira inerente àqueles tijolos, constituindo-se como elemento indissociável – mais até do que as vigas e o cimento. As trevas residiam na natureza daquele lugar.

Foram necessárias 72 horas até que a escrita do parágrafo anterior fosse possível. A indecisão somada com minha habitual insegurança produziu um resultado torturante; travei duelo com ambas ao longo desse tempo, muitas vezes perto de ser derrotado e me render à inércia. Porém, sentia meu ânimo renovado a cada vislumbre de nocaute (isso nunca ocorrera antes) e dava prosseguimento à luta. Ao final de três dias, algo surpreendente ocorreu: venci meus adversários. Assim, na mesma noite, resolvi gozar dos louros recebidos.

Chegaste ao fim dos capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Aug 08, 2019 ⏰

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