A Confissão

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— Perdoe-me, padre, porque eu pequei.

— Confesse seus pecados diante do pai - disse o padre —, e sairá daqui livre para uma nova vida.

— Por onde começar? — disse — Outrora já tive um nome diferente, um nome de anjo, dado por minha mãe, mas que agora carrega a culpa de demônios.

— E qual o seu nome?

— Chamam-me de Bael. Pode ser esse, se assim preferir.

— Pois bem, Bael. Diga-me o que o trouxe aqui.

A pergunta fez com que Bael olhasse em volta. Estava em uma igreja conhecida, mas que no momento, parecia não ter ninguém além do padre. O confessionário ficava ao lado de uma imensa cruz onde um Jesus de mármore jazia pregado. A divisão que separava o padre dos pecadores se dava por uma fina parede de compensado, com uma pequena janela na altura das cabeças, com vários furinhos redondos nela, que não permitia ver o rosto de quem estava do outro lado, mas que deixava entendido a presença de alguém lá.

Bael olhou na janela tentando ver o rosto do padre, mas sem sucesso. Sua voz era familiar, mas de certo, a voz de todos os padres deveriam ser.

— Passaríamos a eternidade aqui caso resolvesse contar todos os meus pecados, ou até as mortes que causei, que são tantas que nem lembraria de todas. — Bael falou. — Mas a primeira, sem dúvida, nunca saiu nem por um momento da minha memória. — Olhou para baixo. Estava segurando uma mão na outra, estalando os dedos — Tinha apenas 14 anos quando matei o primeiro homem. Lembro-me do modo como ele se contorceu quando o acertei com uma barra de ferro e do momento em que um dos olhos saltara para fora do corpo.

— E por que o matou? — O padre quis saber.

— Ódio. Só lembro disso. — Bael respondeu.

Mas Bael lembrava de mais. Lembrava-se que naquela época havia sido escolhido para integrar uma gangue de ladrões, transporte de drogas e, de tempos em tempos, até assassinato. Estava morando na rua, sujeito a todo tipo de perigo e passando fome. Quando a oportunidade surgiu, com a promessa de comida e proteção em troca, a oferta pareceu tentadora demais para recusar.

— O lance é simples — Tinha dito o recrutador dos novos meliantes — Vocês irão receber missões. Quanto mais missões vocês cumprirem, mais privilégios vocês ganham.

Quando Bael entrou para a gangue, ela contava com seis garotos. O mais velho entre eles tinha dezessete anos, e o mais novo apenas seis.

A primeira missão de Bael havia sido simples; roubar uma loja sem ser visto. Os garotos passavam o dia inteiro dentro de um porão escuro, e saíam na hora de cada refeição para cumprir uma nova missão. Quem conseguisse, comia um prato cheio de uma comida simples. Quem não, deveria ir atrás de roubar sua própria comida. Roubar, nunca comprar ou mendigar.

Foi quando a gangue chegou aos seus trinta membros de pequenos infratores que Bael conheceu o traficante Bogue e seu irmão Mancha. Mancha tinha lábios grossos, um nariz achatado e uma imensa barriga gorda que saltava para frente, enquanto que o irmão Bogue era magro, alto, com olhos esbugalhados que exalavam maldade. Bael lembrava-se do modo como Mancha vivia sorrindo, sempre fazendo piadas em que somente ele ria com vontade, enquanto que os outros claramente riam por medo ou por pura vontade de bajulá-lo, mas ele não parecia perceber isso. Era burro como um toco.

Bogue, por outro lado, nunca sorria, e os outros calavam-se quando ele falava, abaixando a cabeça e esperando-o terminar de falar. Andava sempre sério e furioso, proferindo ameaças a todo momento, e esperando sempre um motivo para cumpri-las.

— Eu era um pequeno infrator que roubava para terceiros para ter onde dormir. — disse Bael ao padre — Estava em uma gangue que precisava roubar para ter o que comer. Traficar para ter onde dormir. Aquilo por si só já é vida difícil para um garoto de apenas treze anos, padre. Mas quando os dois irmãos se apresentaram para a nova gangue, a partir daí tudo mudou.

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⏰ Última atualização: Feb 04, 2018 ⏰

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