As Sombras São Tentadoras.

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"A escuridão me invade assim,

como uma dor que não tem fim

Eu sou um rei que tem fama e poder

que apenas queria não mais sofrer"

O quarto era simples, constituía de, uma cadeira, uma mesinha, uma cama e um abajur, e em meio a esse quarto uma pequena luz emanava do pequeno abajur de Charlie. A luz era fraca, leve e sutil, suave e não iluminava muito o quarto, mas o pobre menino estava se contentado com o pouco que tinha, pois seu abajur era a única coisa que o protegia dos monstros traiçoeiros e amedrontadores que se escondem nas sombras de seu quarto.

Ele se escondia debaixo dos seus cobertores e evitava olhar para as sombras, pois toda a vez que o fazia um tremendo arrepio passava por todo o seu corpo, o seu medo era tamanho que toda a vez que olhava par para elas o mesmo tinha vontade de gritar pelos seus pais e implorar socorro, abrir a porta e correr para longe, mesmo sem senti-las, o menino cresceu vendo a imagem do homem alto de sobretudo e chapéu que estava sempre o observando perto da porta do pequeno quarto, ele nunca conseguiu se acostumar com tal figura que parecia alimentar-se do medo, e da tristeza do menino.

Charlie nunca tentou ao menos dizer algo para a imagem a sua frente, o medo sempre levou o melhor de si, sempre o impediu de tentar falar com o homem nas sombras, Charlie se perguntava se era esse o certo a se fazer, não falar com a figura, talvez ela o ajudasse.

Mas o pobre menino sabia que não era esse o caso, pois durante todos esses anos as sombras o chamaram, para envolve-lo nos laços apertados da loucura, para levá-lo para os confins da escuridão, sempre prometendo coisas maravilhosas, prometendo as coisas que ele mais almejava em sua idade queria ser normal ele queria poder comer doces, queria poder brincar sem estar sendo vigiado, queria poder sair de casa e fazer amigos. Queria poder ser uma criança, queria brinquedos, doces, amigos e brincadeiras.

Porém Charlie sabia que isso não ia acontecer, sabia que o seu pesadelo não ia acabar, como poderia uma sombra lhe dar brinquedos? Ele não poderia comer mais de uma bala por dia graças a sua deficiência, quem ia querer ser amigo de alguém que não consegue ao menos se mexer ou interagi, e pior, como poderia brincar sendo que ele mal pode se mexer.

As sombras continuariam esperando ansiosamente para no último dia de Charlie, apossar-se de sua alma com suas grandes e afiadas garras, mas enquanto esse dia não chega, bastava apenas aguardar. Ou poderia acabar ali! O sofrimento dele poderia acabar ali! Ele passaria a sua vida toda trancafiado naquele quarto, nunca teria amigos, estudaria, trabalharia, nunca conheceria alguém que o amasse, nunca teria uma namorada, amigos, e muito menos filhos, sua mera existência sempre seria vazia, e sua vida não teria nenhum rumo o máximo que teria, seu pequeno quarto, e seu abajur

Então ele se ajeita na cama, tenta limpar os seus pensamentos pois sabe que o que está prestes a fazer será irreversível, então ele solta um suspiro, engole o resto da saliva que sobrou na sua boca, e diz:

-O que você pode fazer por mim?

O menino termina a sua fala, e em contrapartida a sombra apenas o encara, Charlie sente o barulho ensurdecedor do silêncio a sua volta, depois de uma longa pausa as sombras apontaram para a janela ao no canto do quarto, ele seguiu o movimento do dedo da sombra com os olhos, e reparou na linda visão da cidade, então a sombra movimenta-se até perto da cama de Charlie. Ele nesse ponto fica apavorado, com medo do que possa acontecer, então a imagem que era toda a escuridão que Charlie poderia imaginar, diz:

-Não é o que eu posso fazer, é o que eu vou fazer, por três anos eu observo você deitado aqui, quando você perdeu o movimento das pernas, eu assisti de perto seu corpo definhando, eu vi cada vez mais a sua doença avançando, e você ficando mais sensível, ops, sensível é uma palavra que você não gosta não é? Pois em todos os lugares que você ia todos diziam que deveria ficar de canto, sozinho, por ser "sensível demais", todos eles, médicos, colegas, família, e todos os outros que te conhecem, todas as pessoas que olham pra você com pena nos olhos, apenas com um mesmo pensamento "Sorte que não estou no lugar dele" ou "Deus, acabe com o sofrimento dele"- a imagem nas sombras ri do pobre garoto enquanto Charlie chora, depois de uma pequena pausa aquela "coisa" continuou a sua frase- Você não se cansa de ser desprezado, você não cansa de ter uma existência vazia e sem sentido, sem algo pra lutar, sem liberdade, apenas preso aqui, eu irei ajuda-lo, libertando-o desse quarto, irei ajuda-lo levando você para fora e acabando com todo o seu sofrimento, dando a você toda a liberdade que você sempre quis, te mostrando o mundo, sem quaisquer interferência de ninguém, sem ninguém dizendo que você não pode!

O menino fica indeciso, sabe que é um caminho sem volta, sabe que se aceitar provavelmente morrerá, mas como você já viu, o que ele seria, o que ele teria, o que ele faria, nada! nunca faria nada! Então como dizem os velhos ditos populares, é tudo, ou nada, se morrer agora não sofreria mais tarde, e não se pode descordar "The Shadows Are Tempting" as sombras são tentadoras

Ele coloca as duas mãos no rosto como se estivesse o cobrindo, e lamentando por ter conversado com aquela coisa ele apenas lembra de tudo o que já passou, em apenas 10 anos de vida o garoto já tinha ficado internado inúmeras vezes, nunca comeu bem pois seu estômago era muito fraco, os médicos sempre disseram que o garoto nunca poderia ficar sem a supervisão dos pais, e Charlie já sabia que o seu corpo não ia aguentar para sempre então fecha os olhos, e tenta dormir pensando em tudo o que ouviu, porém engasgando nas suas próprias lágrimas o mesmo sabe que não conseguiria fazê-lo então ele olha para figura a sua frente, e apenas uma frase sai de sua boca

-Por favor, me livre disso!

A imagem formada nas sombras ri de uma forma descontrolada e diz:

-Você escolheu bem!

Agora é como se toda a escuridão tivesse tomado o quarto de Charlie, envolvendo cada canto do quarto, ele se pergunta se escolheu bem, mas caso o tivesse escolhido mal, não adiantaria nada agora, um caminho sem volta, ele olha em volta, dando adeus a tudo o que conhecia.

Ele sente algo estranho em seu corpo... sente as suas pernas? Como isso seria possível, com um sorriso no rosto e sem acreditar o que eram lágrimas de pesar agora são soluços de felicidade, ele senta na sua cama e passa um tempo olhando para os seus pés descalços, ele nunca tinha reparado nos detalhes de relevo entalhados no seu pijama azul, ele levanta da cama e anda pelo quarto, pulando, brincando! Ele não tinha brinquedos, mas isso não o impediu!

Rolava pelo chão, cantarolava, e ficava repetindo para si mesmo coisas como: "Isso não pode estar acontecendo!", ou "Deus, eu não posso acreditar", ele brincava até que olha para o seu abajur, e dando pequenos paços ele não consegue completar o seu caminho pois assim que chega perto do objeto, ele olha para trás e vê a enorme figura.

O medo toma conta dele novamente, não sabia o que dizer, não sabia se agradecia ou se gritava novamente e enquanto pensava, a criatura diz:

-Assim você é feliz?

-S...sim -Respondeu o garoto

A sombra ficou imóvel, sem dizer nada, e então o garoto olha novamente para as suas pernas e percebe que elas estão completamente envolvidas pelo que parece uma névoa preta, totalmente escura. O mesmo começa a ficar ofegante, ele olhou novamente para a sombra, que continuava estática, enquanto o seu corpo era dominado ele sentia que estava perdendo as energias, não estava mais tendo forças para ficar de pé, a névoa preta tinha se espalhado por todo o quarto e pela primeira vez em todo aquele tempo naquele quarto, o garoto não vê mais a sombra

Então, quando percebe que tudo está perdido, ele se arrasta para perto de sua cama, já não pode mais andar, a escuridão dominou tudo a sua volta, e ele sabe que o seu corpo já está sendo dominado também, mas ele olha para o seu pequeno e belo abajur, e lembra-se que ele sempre o protegeu, a luz era fraca, leve e sutil, suave e não iluminava muito o quarto, mais agora de nada adiantaria, pois o mesmo já foi dominado, então ele tira o seu abajur da tomada, ele era em formato de lua, cabia na mão de Charlie, ele abraça o pequeno objeto enquanto a sua luz o deixa aos poucos, e quando isso acontece, Charlie fecha os olhos, e nunca mais os abre.

The Shadows Are TemptingWhere stories live. Discover now