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     _ Bom dia, Lena.

     _ Bom dia, D. Marina. A senhora já pode sentar que o café já está quase pronto.

     _ O Carlinhos já passou por aqui?

     _ Eu não o vi desde o final da tarde de ontem. A senhora quer que eu vá chama-lo?

     _ Não precisa, Tia Lena.

     As duas olharam o belo garoto e este já foi sentando numa da banquetas da ilha diante da mãe.

_ Pelo adereço nas mãos, já vi que hoje tem treino de basquete. 

     _ Não falaram nada sobre isso, D. Marina. Esse ano o São Paulo vai focar mais em Volley e Basebol. A turma do Basquete não terá vez naquela droga de Colégio.

     _ Fico triste por você, filho.

     _ Não preciso da sua pena, senhora.

     Eu decidi me calar porque não estava afim de mais um bate boca com meu único e amado filho. Eu não sei onde estava com a cabeça quando decidi lhe contar sore sua origem, e consequente adoção. Eu pensei que ele ia ficar feliz em saber que era amado e querido... Só que o tiro saiu pela culatra. Carlinhos nunca mais foi o mesmo. 

     _ O que tá olhando? Fiz minha higiene como você me ensinou. Tirei as remelas dos olhos direitinho e escovei os dentes também. 

     _ Não estava olhando pra você atrás de alguma imperfeição, filho. Só estava pensando no quanto você mudou nesses últimos meses e que sinto falta daquele lindo garoto que ao me ver me beijava o rosto e me dava o mais apertado abraço após me desejar bom dia. ...

     _ Corta esse papo, D. Marina. Acho que já somos bem grandinhos pra esse tipo de coisa. Tia Lena, suspende o café tô indo nessa. A sua querida D. Marina já vai começar com as mesmas baboseiras de sempre.

     O vi se levantar da mesa e uma enorme sensação de impotência tomou conta de mim. Eu tinha que fazer algo... Tava cansada e de saco cheio de me sentir perdedora. Olhei pra ele com firmeza e disse:

     _ Não, Luiz Carlos. Você não vai sair de casa sem tomar o seu café junto comigo e a Lena como sempre fizemos. Esse comportamento rebelde acaba aqui e agora.  Senta e...

     _ Rsrsrsrs... E o quê? Será que você não entende que eu já sou maior de idade e que não tô mais afim de viver esse conto de fadas postiço? Por que é tão difícil pra você aceitar as pessoas como elas são, D. Marina?

     _ Eu não entendo muita coisa sua, rapaz desde o dia que fui franca e honesta com você. Você pode não aceitar, mais eu sou sua mãe... Eu amo você, garoto idiota. Eu não tenho culpa se você não pode entender isso, ou o que sinto por você. Mais eu não vou permitir...

     _ Eu não preciso da sua pena, das suas esmolas, ou mesmo da sua permissão para mais nada...

     _ Mais eu preciso de você, de saber que você está bem, de vê-lo seguir em frente com a cabeça erguida... E do seu amor. Não tá longe o dia em que aqui mesmo nessa sala, sentados em volta dessa mesma ilha, você disse que me amava e faria qualquer coisa pra ficarmos juntos e viver como uma verdadeira família...

     _ Isso foi dito em outra vida e outras circunstâncias. Graças a Deus isso já é coisa do passado, D. Marina...

     _ MÃE... EU SOU SUA MÃE, CARLINHOS... EU SOU A DROGA DA SUA MÃE...POSSO NÃO SER A MELHOR, A MAIS ALTA, A MAIS BONITA, MAIS EU SOU A ÚNICA QUE VOCÊ TERÁ NESSA DROGA DE VIDA, E NADA VAI ME FAZER DEMOVER DESSA IDEIA. VOCÊ PODE ATÉ NÃO QUERER OU ACEITAR O QUE SOU, MAIS SAIBA QUE NO MEU CORAÇÃO E NA MINHA VIDA EU TENHO UM FILHO E ELE É VOCÊ.

     Ele se assustou com meus gritos e a doce Lena deixou cair a caixa de cereais assim que me exaltei. Ele ficou lá me olhando e pude vê-lo lutar com ele mesmo por alguns minutos.  

     Num passado não muito longe a nossa vida era um verdadeiro mar de rosas. Pouquíssimas pessoas fora da nossa família sabiam sobre a adoção, e foi justamente numa droga de festa em família que uma prima solteirona e seca por pura maldade e despeito falou de como os outros netos dos meus pais se pareciam com o avô, menos o Carlinhos. Ele então começou a me enlouquecer pra saber sobre quem era o seu pai, se a família do pai sabia da existência dele, se eles moravam em Savana... Esse tipo de coisa. Aí, eu por querer jogar limpo e acalmar de vez o seu coração falei toda a verdade pra ele, e nossas vidas se tornaram um verdadeiro inferno.

     Ele finalmente voltou a sentar na banqueta, nossa querida Lena pegou a caixa de cereais do chão, e eu disse:

     _ Você não vai conseguir me fazer odiar você, me afastar de você, ou mesmo te tirar da minha vida, Carlinhos. A gente pode não ter o mesmo sangue, filho, mais o elo que nos trouxe até aqui é muito superior a uma droga de DNA.

     O café foi tomado no mais completo silêncio. Finalmente a buzina do transporte escolar soou lá fora e ele simplesmente saiu sem nada dizer, sem um desejo de bom dia, e sem me beijar o rosto como sempre fez. Assim que a porta fechou...

     _ Ele tá rachando, D. Marina. Eu posso lhe garantir isso. Nas outras vezes ele nem lhe ouvia e batia essa porta com tanta força que quase quebrava o vidro. Hoje foi bem diferente. Acho que dessa vez ele ouviu a mensagem por trás dos seus gritos. O tempo está do seu lado, e ele logo logo vai voltar a ser o nosso lindo garotinho.

     _ Tenho medo de não ter mais tempo, Lena. Ele já está de maior, e se quiser sair e nunca mais voltar, eu nada poderei fazer para impedi-lo. Aí eu te perguntou, minha querida amiga... O que eu vou fazer do resto da minha vida? Eu amo meu filhote, eu não vou suportar se ele for embora...

     A boa Lena apenas me abraçou e tentou do seu modo me enxugar as lágrimas.

*

     Olá. Essa sou eu, Marina Carvalho Lopes. Secretária Executiva na Chantal's, mãe sofredora e esperançosa, amiga dos meus amigos e uma eterna apaixonada pela vida. Tenho poucos e queridos amigos, e sempre procurei ser uma pessoa correta, ética e que graças a Deus vivia uma boa vida ao lado do meu único filho, que ultimamente está me deixando louco por conta de uma revelação que fiz sobre sua origem. Acho que ser correta demais, nesse caso em particular, não foi uma boa ideia. O garoto amoroso, carinhoso, educado, sensível que amo e crio desde que ele tinha 01 ano de idade... Infelizmente não existe mais. Por mais que eu tente fazê-lo entender que nada mudou e sou a mesma mãe e amiga que ele sempre teve e terá, ele parece não mais se importar com isso. Se não fosse pelo apoio de duas queridas amigas, Saori e Chantal, que considero da família, com certeza eu já teria sido internada num asilo.

*

Fui tirada dos meus pensamentos quando a doce Lena disse:

     _ D. Marina, o táxi chegou.

     _ Obrigada, Lena. Não vejo a hora do meu carro chegar do conserto. Toma conta de tudo por aqui, minha querida e me ligue se precisar de qualquer coisa. Hoje é dia da posse da nova Diretoria lá na Chantal's e se você puder ficar pelo menos até as 19h00, eu seria eternamente grata.

     _ Fique tranquila e vá. Eu estarei por aqui e farei o meu melhor pelo nosso menino.

     O Motorista buzinou duas vezes seguidas e logo saí de casa para lutar por mais um dia. Que Deus nos abençoasse. 

Ponto de Fusão  - Romance GayWhere stories live. Discover now