A Princesa Mestiça

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Quando as flores desabrochavam na floresta e as fadas surgiam cantando no céu, o povo de Escaravelha sabia que a Primavera estava chegando. Pan, a menina raposa, filha do décimo Rei Raposa das Caças e da Fada do Arco Íris, sabia que essa era a melhor época para ver as Estrelas cantarem. Do alto da sua cabana no monte, Pan escutava atenta o canto baixo daquelas que há tanto tempo tinham dito adeus.

"As estrelas costumavam ser as fadas mais brilhantes de toda a Escaravelha. Eram admiradas por onde passavam, adoradas, como deusas da luz, da noite e da floresta. Se alguma delas se apaixonasse por você, dois desejos podiam ser concedidos: Um quando o Sol se levanta e outro quando ele adormece."

- Por que as Estrelas não descem mais até nós, mamãe?

- Antes da Grande Escuridão, algo terrível aconteceu, e uma fada Estrela não voltou para casa ao anoitecer. Suas irmãs convocaram os ventos, as nuvens e todas as fadas noturnas. Mas ninguém foi capaz de encontrá-la. A Estrela Mãe se partiu de tristeza, pois sentia em seu corpo que algo de terrível havia acontecido a sua estrelinha e jurou nunca mais descer a terra ou cantar para suas criaturas mais uma vez. As Estrelas mais velhas sabem o que aconteceu e nunca aparecem, mas as novinhas, desentendidas, ainda brilham fraquinho, cantando no céu."

Pan não sabia porque gostava tanto daquela história, mas desconfiava que vinha da magia do interesse pelas coisas impossíveis. Quando amanhecesse, seria o dia da Fabulosa Caçada, comandada por seu pai, e pela primeira vez ela participaria. Pan não era muito considerada em sua Vila. Mestiça, meio fada, meio raposa, a menina que não era nem uma coisa nem outra nunca encontrava seu lugar. Bicho demais para as Fadas, mágica demais para as Raposas: Pan tinha as orelhas de seu pai, laranjas e empinadas, o rosto fino e delicado da mãe, um corpo de mulher até as pernas, que voltavam a ser de raposas da coxa para baixo. E claro, seu grande rabo. Seus pais viveram um amor impossível, mas é óbvio que ela pagou a conta.

- Vocês deverão trazer a coisa mais valiosa que encontrarem. – Seu pai dava as instruções para os participantes. – Tudo será convertido em tesouro para o reino e cada um ganhará sua recompensa. O Grande Vencedor terá direito ao Espelho das Cores e muitas regalias no castelo. Vocês têm um dia e uma noite para completar a Caça.

Quando o apito ressoou anunciando a partida, Pan correu com toda a velocidade de suas pernas de raposa. Ela estava na corrida como um bom exemplo: Seu pai achou que seria bom alguém da realeza mostrar ao povo que aquela era uma tradição que devia ser mantida. Ela não era uma competidora de verdade. Mas isso não importava agora. Ela queria vencer. Queria a noite na sala do Espelho das Cores porque ele era o único que podia responder aquilo que ela queria escutar: Quem ela era? Quando os vencedores saíam da Sala dos Espelhos, estavam mais bonitos, mais sábios, adorados. O Espelho lhes mostrava a verdade e depois os concertava. Pan ganharia e seria então uma menina ou uma raposa, mas não uma aberração.

Qual era a coisa mais preciosa que Escaravelho poderia querer?

- Eu vou capturar uma Estrela.

- Não é certo capturar prêmios com vida. – A Coruja branca falou, a seguindo, as grandes asas fazendo sombra sobre a cabeça da menina.

- Não lembro de estar falando com você, Coruja.

- Canopus. Pode usar meu nome.

- Não vou precisar usar seu nome se não for vê-la.

- Vou lhe acompanhar.

- Não preciso da companhia de uma coruja bisbilhoteira e julgadora.

- Se quiser mesmo capturar uma Estrela, Princesa Raposa, acredito que vai precisar de mim.

A Princesa MestiçaWhere stories live. Discover now