Faces da Paixão (DEGUSTAÇÃO) - Livro 1

Capítulo 1 - Wisconsin 2003

Era um fim de tarde nublado na cidade de Wisconsin, quando o garoto magro e sorridente conseguiu, depois de muita insistência, convencer seu pai a dar uma volta de moto pelas redondezas. Bruce e Maggie, mãe do Flynn, tinham se divorciado quando ele tinha apenas seis anos e acabou se mudando para outra cidade. Ele se manteve presente na educação do filho, mas via o garoto com bem menos frequência do que gostaria, então sempre aproveitava ao máximo os momentos que podia estar com ele e acabava mimando-o e fazendo tudo que ele queria.

— Tá bom, tá bom — disse Bruce cedendo, observando seu filho pular de alegria.

Ele havia aprendido a gostar de motos clássicas com seu pai, que por sua vez aprendera, com o pai dele, e por esse motivo, decidiu que quando tivesse um filho, passaria aquela tradição para frente. Naquele momento, ele soube que tinha conseguido alcançar o objetivo e não pôde deixar de sentir uma pontada de orgulho.

— Mas antes, precisamos pegar os capacetes lá dentro — ele informa, vendo a animação desaparecer do rosto de seu filho de dez anos.

— Ah não, pai! — ele protesta rapidamente. — Nós não vamos muito longe! E temos que ir logo, antes que comece a chover — Flynn argumenta, fazendo o pai olhar para o céu e ver que ele tinha razão.

As nuvens escuras denunciavam que uma tempestade cairia a qualquer momento.

— Certo! — Bruce cede mais uma vez. — Mas não conte para sua mãe que fizemos isso! — comenta ele tirando a chave do bolso e fazendo os olhos do filho brilhar.

— Isso! — disse Flynn jubilante.

Bruce então sobe na moto, com um empolgadíssimo Flynn na garupa e dá partida, sentindo a brisa fria se chocar contra seu rosto, conforme ele acelerava. Flynn estava radiante, mesmo com o vento frio bagunçando seu cabelo. Ambos sentiam uma verdadeira paixão pela sensação de liberdade que a velocidade proporcionava, tanto que o que era pra ser um passeio breve acabou se prolongando até o anoitecer.

Distraídos pela adrenalina do momento, nenhum dos dois percebeu que as nuvens escuras estavam cada vez mais próximas e assustadoras. Um forte barulho da trovoada os alertou.

— Está na hora de voltarmos! Vou ter que ir mais rápido. Segure firme em mim! — trovejou Bruce através do vento para que o filho possa escutá-lo, quando o clarão de um raio ilumina o céu, não muito longe dali.

Flynn concorda prontamente, assustado com a tempestade que se aproximava, abraçando a cintura do pai, que pilota a moto no limite da velocidade. No entanto, as nuvens são mais rápidas e começam a derramar grossos pingos de chuva, fazendo com que a visibilidade da pista ficasse quase em zero. Naquele momento, Bruce praguejou, percebendo que fora uma péssima ideia sair de casa naquelas condições, principalmente sem capacete. Com a visão comprometida pela chuva, ele pilotava quase que por instinto.

Foi então que tudo aconteceu tão rápido que Flynn se lembraria daquele momento como um borrão: Primeiro, um raio caíra no meio da pista, assustando o garoto, que soltou a cintura do pai por reflexo; Bruce, por sua vez, atordoado, perdera o controle da moto e fora arremessado para fora da pista, rolando em alta velocidade por um barranco. Durante a descida, sua cabeça se chocara fortemente contra uma pedra pontiaguda e na sequência seu corpo foi parado por uma árvore robusta. O impacto foi tão forte que sua coluna fora quebrada e ele morreu no local. Flynn tinha ficado preso à moto e deslizara alguns metros com seu rosto arrastado pelo asfalto áspero, perdendo a consciência, enquanto a chuva caía impiedosa sobre seu corpo inerte.

Não muito longe do local, indo para seu estágio, um jovem de vinte e cinco anos, estudante de Medicina mantinha a atenção redobrada, estreitando os olhos para conseguir enxergar a pista em meio à tempestade.