Seis dias antes

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— Valentina?????

Levantei em um salto com o grito. Olhei para a porta revirando os olhos, jogando minha cabeça contra o travesseiro, já pronta para reclamar.

— O que é coisa?!

— O Dia dos Namorados é daqui a seis dias! Porque não me avisou?

— Tenho cara de calendário por acaso? Me deixa dormir... — Resmunguei para minha irmã e enfiei a cabeça no travesseiro novamente.

Eu havia pegado dois turnos da madrugada no bar, ou seja, eu estava sem condições de socializar pela manhã. Na verdade, minha meta era acordar bem tarde.

— Não! Eu preciso comprar algo para o Teozinho... — Ela choramingou me sacudindo pelo braço. — Vai Tina! Você sabe que sou péssima escolhendo presente! Ele corre o risco de ganhar um chaveiro... Ou sei lá, eu nem sei o time que ele torce...

— Tá! — Gritei me sentando. Se eu ouvisse mais uma reclamação, eu estrangularia Vitória. — Que horas são?

Minha irmã estava no seu primeiro relacionamento, aquele tipo grudento de adolescente que não sabe respirar sem o outro. Por obra de Deus, Samuel o namorado, tinha uma paciência divina! Porque se fosse eu no lugar dele, já havia mandado minha irmã pastar a muito tempo.

— Quase onze... Mamãe vem me buscar mais tarde. Precisamos ir agora! Ela não quer ir comigo, principalmente hoje que está caindo o mundo lá fora...

Fechei sua boca com a mão. Além de carente eu havia ganhado uma irmã tagarela, apesar disso, era a melhor parceira de crime que eu poderia ter. Minha mãe sempre trabalhou em tempo integral no hospital, assim como meu pai. Eles eram enfermeiros no hospital central de Gramado. Conheceram-se na época da faculdade. De uma gravidez na adolescência, eu vim ao mundo, e longos anos depois minha irmã veio para importunar meu sono.

— Vai se agasalhar e me espera na porta em cinco minutos! — Avisei, recebendo um abraço apertado. Meu corpo caiu para trás entre os travesseiros.

— Você é a melhor de todas! — Ela gritou, já em pé sumindo para além da porta.

— Eu sei... — Sussurrei com um sorriso, distraída.

Voltando a mim, prendi meus cachos em um coque abacaxi e me guiei até o banheiro fazendo o necessário.

Deixando a toalha de lado, observei meu guarda-roupa bagunçado e escolhi uma calça térmica e um jeans. Apesar de não estar chovendo, o vento parecia quase gélido quando abri uma brecha da janela.

Ergui os braços passando a blusa de gola alta, e complementado com um hidrante labial cereja.

— Amei a blusa! É nova? — Minha irmã perguntou parada na porta. Seus olhos castanhos estavam delineados com algum lápis branco, que traziam um efeito diferente ao preto de cada dia.

— Nova e você não pegará! — Sorri, enquanto ela fazia uma careta de indignação. — Pega o casaco. Estou pronta!

— Tá! — Ela falou seguindo pelo corredor. Fui atrás catando algumas peças de roupas.

Meu apartamento era relativamente pequeno. Ok, na verdade, ele era minúsculo. Era o único imóvel acessível ao meu bolso. O bar apesar de me sustentar não era um Oásis, para render algo eu tinha que ficar madrugadas servindo bebidas.

— Traga o livro que pegou na biblioteca, passaremos lá antes das compras. Marta pediu que eu fosse pegar a Lili — Agachei perto da porta pegando as cartas do correio, as verificando enquanto falava. — Ela precisará viajar de novo.

O feriado da desilusão (Conto)Where stories live. Discover now