Capítulo II

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                        *P.o.v Sara*

A casa onde os meus tios vivem, sempre foi o tipo de casa onde sonho morar.
Uma vivenda rasteira com um quintal que dá a volta à casa. E ainda tinha espaço para uma horta na lateral direita.
Era simples, mas notava-se o cuidado que tinham com ela.
No meio do nada e isolada de tudo. Era um dos lugares mais sossegados que conhecia.
Quando era mais nova, passava grande parte dos dias nesta casa.
Quando começaram as disputas entre os meus tios e o mau pai comecei a evitar estar com eles.
Não porque tivesse o mesmo desprezo que o meu pai tem por eles. Mas porque sempre que estava com eles o tópico de conversa parava no meu pai.
Não me levem a mal, mas cada um tem a sua versão da história, a meu ver. E não é o do meu interesse saber qual delas é a verdade e a mentira.
Concluindo, não são temas que queira ter na minha vida.
A meio da minha reflexão enquanto admiro a casa, decido que seria melhor entrar e mostrar a minha presença.

Antes que pudesse bater à porta, já tinha o cão deles a ladrar para dar sinal de que havia chegado uma pessoa. O meu primo, Afonso, abre-me a porta e recebe-me com um abraço.
Em mais novos éramos mais chegados. Agora nem tanto, mas o carinho que sinto por ele não muda. É o único rapaz da família, e também o mais mimado.
Logo a seguir recebo um abraço da minha prima, Maria. Era a mais nova do grupo, e aquela que decidiu continuar a ver-nos. Independente da situação familiar em que nos encontrávamos. Por isso gostava tanto dela.
Apesar do remorso que sentia pelo meu pai, tio dela, nunca demonstrou esse sentimento na nossa presença, nem contra nós.
Retribuo o abraço com força, e sou levada para a sala.
Vejo a minha irmã sentada num dos sofás, com os meus pais atrás dela em pé. Ambos nervosos. Os meus tios estavam no sofá ao lado, sentados. E do outro lado da sala estavam dois homens. Não os conhecia.
Ambos estavam vestidos com um fato formal preto. Cabelo bem arranjado, curto em estilo militar. Estavam os dois numa posição muito rígida. Não os conhecia, e pela reação da minha família, não era a única que os tomava como desconhecidos.
Enquanto analisava toda aquela imagem à minha frente, senti a mão do Afonso pousar sobre o meu ombro.
Ele olha-me de forma séria e pede que me sente. Escolho ficar ao lado da minha irmã, Rita.
Ele fica com a Maria ao pé dos meus tios.

Ao ver que nos encontrávamos todos quietos a aguardar um sinal da parte dos senhores, um deles pega na pasta que estava entre ele e começa a remexer no seu interior.

- Bom dia. O meu nome é Frederico. Estou na vossa presença para vos propor um acordo.

Frederico parecia um homem inteligente, mas mais que isso, um homem decidido. Via-lhe pelos olhos que tinha um objetivo a cumprir. E se não tivesse o que queria até ao final deste encontro acredito que não haveríamos de esperar boas despedidas da parte deles os dois.

- Vou ser breve. Não quero tomar muito do vosso tempo, nem desperdiçar o meu. - claro e assertivo.

As palavras dele pareciam como uma faca afiada a passar entre a minha pele. Viste chegar até ti, mas não deste conta de quando se enfiou na pele, nem sentiste a dor. Só quando está dentro é que começas a sentir a dor. Mas mesmo assim é muito suave.
Foi esta a imagem que me apareceu na cabeça quando o ouvi falar.
Agressivo, mas de uma forma tão suave que não te apercebias disso.

- Este encontro tem como propósito marcar um trato entre duas famílias. A vossa e a do nosso chefe. - fez uma pausa enquanto passava o olhar sobre todos nós.
- Crianças, os vossos pais têm conhecimento do que vos vou falar. Por isso, antes de interromperem, aviso já que qualquer dúvida é melhor falarem com eles. - recebemos o aviso do segundo homem presente.

Tanto eu como os restantes assentimos com a cabeça. Estava mentalizada de que contrariar o que quer que fosse da parte destes dois homens não seria boa ideia. Era preferível esperar até ao fim para depois questionar.
Enquanto a Rita e a Maria se entreolhavam, o Afonso focava o olhar nos meus tios. Isso indicava que ele não aprovava o que quer que estivesse a acontecer.

- O nosso chefe, que mais tarde vão conhecer, pretende fazer uma aliança com a vossa família. Após uma cuidadosa análise, decidiu que o acordo seria mais facilmente aceite entre vocês dada a vossa situação financeira. - dizia enquanto olhava dos meus pais para os meus tios.

Que eu tivesse conhecimento, a situação financeira não estava mal. Aliás, iria melhorar quando a partilha de bens terminasse.

- Desta forma, apresento-vos a proposta feita. Esta família deve escolher um dos elementos da segunda geração para produzir matrimónio com o nosso Senhor. Do sexo feminino. Deixamos nas vossas mãos a escolha ...

A dada altura, deixei de ouvir o que quer que estivesse a sair da sua boca. Eu via os lábios a mexerem, mas não conseguia ouvir. O meu olhar passava dos meus pais até aos meus tios.
Eles estavam sérios, não havia emoção a passar pelas suas faces. A minha irmã e a minha prima estavam em choque. O meu primo não tirava os olhos dos dois homens.
Os homens que decidiram invadir a nossa vida com um tratado para benefício de alguém a quem eles chamavam Senhor.
A meio dos meus pensamentos, sou puxada para a realidade com um abanão da minha mãe.
Olho para ela que me olha de forma preocupada. Viro a cara até aos dois senhores, e percebo que estão prontos para sair. Levanto-me, imitando os restantes membros da família. Mas ao contrário deles, que os seguem, ou com o olhar, ou até à porta para se despedirem, eu apenas me mantenho no mesmo sítio. A olhar para o nada.
A tentar processar esta nova informação.
Como assim produzir matrimónio?

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⏰ Last updated: Jun 06, 2021 ⏰

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