INTRODUÇÃO

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Hospital de New York, 20:44 PM

Quarto 1317, Sina Deinert

Eu preciso respirar.

Oxigênio. Ar. Falta. Dor.

Ás vezes a dor é tão grande que esqueço de quem eu sou, De onde eu vim, do por que estou aqui. Entram enfermeiros e médicos em meu quarto, quase como se esperassem que eu melhorasse ou morresse de uma vez. pessoas precisam desse leito. Meus pais me ligam duas vezes por dia, ansiando que minha oxigenação esteja melhor. Eu rio. Há um ano atrás eu não fazia ideia da existência dessa Palavra... Oxigenação; Hoje, parece um poema recitado todos os dias pelos médicos nos corredores desse hospital. Pessoas estão morrendo ao meu lado a todo momento. Me pergunto quando chegaria a minha vez.

Respira. Dor. Alívio. Dor.

O coração começa a bater mais rápido. 20:44. Há quatro semanas atrás, eu estaria deitada no chão do topo do edifício do meu prédio, olhando as estrelas e a grande arte que elas são. A minha visão enxerga apenas branco no momento. O teto do hospital tem algumas manchas pretas, talvez de alguma infiltração. Eles deveriam averiguar isso.

Quando penso em fechar os olhos e esperar para que o próximo dia seja menos angustiante que esse. A doutora Jeong entra mais uma vez no meu quarto.

A vestimenta completa contra o maldito vírus. Todos se vestem igual nesse lugar, mais parecem máquinas vagando sem saber exatamente o que fazer com todas aquelas pessoas que insistem por um mísero segundo de ar puro nos pulmões.

Eu não quero desistir. Mas não consigo lutar.

- Hey, boa noite. Queria vir aqui antes de ir a cantina. - Falou me olhando com um brilho nos olhos. - Como tá se sentindo?

Como você faz para ainda ter esperança em um mundo desses?  Esperança em mim. Quero perguntar, mas apenas sorrio levemente.

- Não mudei nada em 20 minutos, doutora.

Ela ri.  Não posso fazer o mesmo, meus pulmões não aguentariam.

- Pois... - Senta ao pé da minha cama - Trate logo de mudar esse quadro médico. Quero ver você saindo desse hospital xingando todos esses médicos que acham que tudo é preto no branco.

Ela segura minha mão por cima daquelas duas camadas de luvas latex. Tenho certeza que isso é contra o protocolo. Quero lhe dar vários puxões de orelha por não estar respeitando uma regra que lhe protege... De mim. Mas nada disso sai. Eu não costumo falar tanto quanto antes.

- Com - Puxo ar - Como estão as estrelas hoje? - Pergunto.

Conversar sobre como os astros estavam organizados no céu, parecia ser uma momento só nosso. Um momento só meu, em que somente ela poderia me proporcionar. O céu é a minha paixão e a doutora Jeong é minha luneta exclusiva aqui dentro desse quarto.

- Hoje, Orion está bem visível acima de nós. - Aponta para o teto do quarto - O céu está limpo, perfeito. Como se não... - Abaixou o olhar e puxou sua mão de volta pra si, ela não iria completar, porque se o fizesse tudo pareceria mais real do que já é.

- Como se não - Tento puxar mais ar - Tivesse milhões de mortos embaixo de tanta pureza?

Ela me encara com o olhar cansado e vejo uma lagrima cair de seus olhos. Queria poder a abraçar, queria que nada disso estivesse acontecendo, ansiava para que o final de nosso encontro não fosse triste. Mas de nada disso tenho controle. E não posso ao menos dizer que vai ficar tudo bem. Pois não parece que vai.

- Você não tem noção de como tudo isso está me afetando... Melhora logo, por favor. - sussurra a ultima parte.

- Prometo que vou dar o meu - Mais uma tentativa de puxar oxigênio - melhor. 

Tento lhe dar um sorriso reconfortante, o que parece ter dado certo, pois seu olho quase fecha por completo. Ela estava sorrindo para mim.

-Você consegue ser a melhor coisa nesse caos. Isso é errado? 

Eu sorrio para ela.

- Tendo o fato de que (...) eu estar aqui é uma luta para mim, eu diria que sim. - Respiro fundo.

- Mas se você não estivesse aqui, não teríamos nos conhecido.

- Sabia que eu posso morrer por estar aqui, certo? - Brinco.

- Cala a boca, Sina. Você não vai morrer! - Ela se levanta da cama e senta na cadeira ao meu lado. - Você não pode morrer... - Sussurra mais uma vez, sem olhar diretamente para mim.

- Por quê não? - sussurro de volta sem desviar meus olhos de seu rosto.

- Porque se isso acontecer... - Seus olhos castanhos se encontram com os meus verdes - Meu coração se partiria em dois. E ele não está pronto para tamanha dor.

Meu coração começa a acelerar muito rápido, o aparelho ao meu lado denuncia meu estado ansioso. Ótimo, agora ela sabe que isso me afetou.

- Se eu fosse (...) te comparar com algo do universo... Seria Júpiter, doutora.

- Júpiter? Por quê?

- Se não fosse o gigante vizinho, não poderíamos estar vivendo (...) (...) Com ou sem pandemia. - Puxo ar mais forte, meu pulmão sente o esforço e resolve se vingar de mim.

 A dor me dilacera. 

Heyoon levanta rapidamente da cadeira ao ver minha careta de dor. O estetoscópio em milésimos de segundo se encontra no meu peito.

- De 1 a 10 qual a intensidade da dor? - Pergunta.

- 11, desde que eu cheguei. A dor nunca diminuiu. Bom (...) só quando conversamos sobre corpos celestes - rio fracamente, o que faz com que meu pulmão se contraia novamente.

- Pare de fazer piadas!

- Está vendo? Meu Júpiter... - Falo

Vejo que minha fala lhe deixou com vergonha, então mudo de assunto e tento saber como está as ruas de New York, enquanto ela continua preocupada ajustando minha medicação. Como seria possível se apaixonar durante um caos tão grande como essa pandemia? Seria possível? Espero que sim, pois essa é a única explicação plausível para o coração acelerado, mãos suadas e sorrisos bobos direcionados a uma única pessoa. A minha medica, Heyoon Jeong.

JúpiterWhere stories live. Discover now