capítulo vinte e três.

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Chego em casa e agradeço por Jorge ter comido na casa de Louis. Eu acabei deixando todas as coisinhas dele no carro, e não tive como pegá-las. Não sem precisar acordá-lo.

Assim que fecho a porta, eu me ajoelho e abro a portinha da caixa. Ele sai e começa a dar uma volta pela sala, descobrindo cada móvel e já afiando as unhas no meu sofá. Solto uma risada baixa quando ele volta e passa o corpinho na minha perna.

ㅡ Sua nova casa não é grandes coisas, filho. Mas prometo que você vai ser muito feliz aqui. ㅡ Coço levemente suas costas, enquanto ele dá uma cabeçada na minha mão, ronronando. ㅡ Papai deixou suas coisas no carro do Louis, mas assim que as lojas abrirem, eu vou em um petshop antes de ir trabalhar para comprar um pouquinho de ração pra você comer por hoje.

Me levanto e vou até a cozinha, pegando uma vasilha com água, e deixando no cantinho da sala. Vou até o banheiro, e Jorge me segue. Deixo a porta aberta para que ele fique comigo no banheiro e percebo que adotei um fiscalzinho de banho. Ele se deita no tapete e fica olhando os pingos de água que escorrem no box de vidro.

Lavo o cabelo e fecho os olhos, deixando a água cair sobre meu rosto. Penso em Louis, e percebo que ultimamente ele tem sido a coisa que mais ocupa a minha mente. Ele me pareceu tão frágil, tão indefeso, tão aberto, que percebo que talvez ele tenha mostrado a mim, uma versão dele que quase ninguém conhece.

Meu coração se aperta tanto quando penso em tudo que ele me contou. Eu não consigo imaginar o tamanho de sua dor, não consigo sequer ter uma ideia de tudo que ele precisou enfrentar.

Pude ver por detrás da camada que ele criou para se proteger. Pude ver o que não é bonito, e o que ele esconde a sete chaves… pude ver através da máscara que ele usa como refúgio para sua dor, e sinto como se tivesse me conectado a ele de uma forma tão profunda, que talvez eu jamais consiga desconectar.

Saio do banho, enrolando uma toalha na cintura e uma na cabeça. Jorge começa a miar e percebo que talvez ele ainda esteja com fome. Olho no relógio da sala e percebo que já são seis da manhã.

ㅡ Papai vai só trocar de roupa, e vai achar algum lugar para comprar ração pra você. ㅡ Digo baixinho para ele.

Ouço a campainha tocar e levo um susto. Quem em sã consciência toca a campainha dos outros nesse horário? Reviro os olhos e ignoro, mas ela toca mais uma vez. Fico receoso, e olho no olho mágico. Meu coração acelera ao ver que é Louis.

Abro a porta rapidamente, sem me importar que estou apenas de toalha. Seu olhar viaja até o meu, antes de descer pelo meu corpo de forma lenta e calculada. Engulo em seco quando seus olhos voltam para os meus. Afasto meu corpo levemente, o escondendo atrás da porta.

ㅡ Oi. ㅡ Digo sentindo minhas bochechas queimarem.

ㅡ Oi. ㅡ Ele diz sério. Percebo que seus olhos estão inchados, e ele está de farda. Seu cabelo, porém, está molhado. Ele provavelmente já está indo para a delegacia. ㅡ Você esqueceu isso..

Ele ergue os braços com as sacolas em mãos, e as coloca ao lado da porta na parte de dentro do apartamento. Tento controlar a respiração e meu coração acelerado, e limpo a garganta.

ㅡ Você está bem? ㅡ Pergunto mordendo os lábios devido a ansiedade, e ele me olha com um semblante mais neutro.

ㅡ Estou, e… ㅡ ele faz uma pausa ㅡ me desculpe por ontem. Normalmente eu não sou frágil daquele jeito, mas também não costumo tocar naquele assunto, justamente por esse motivo.

ㅡ Está tudo bem. Você não precisa se desculpar. ㅡ Asseguro.  ㅡ Você não tem motivo nenhum para se desculpar, Louis.

Ele permanece me olhando por um tempo e então observa Jorge na sala. Ele dá um sorriso mínimo, e me olha novamente.

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