Capítulo 24

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Seis meses antes – A Armação

Empurro a porta do banheiro da escola com força. O ambiente está vazio e uma das cabines se abre instantaneamente. Benjamin, com seus olhos quase angelicais, vem na minha direção tão precisamente que perco o ar por alguns segundos. Sua mão é rápida ao agarrar a gola da minha camisa e me puxar para um beijo longamente revigorante. Estou completamente sem ar e excitado quando encerra o ato com pequenos selinhos na minha boca, saboreando a região como se fosse um sorvete delicioso.

Olho em volta mais uma vez, apenas para me certificar de que estamos sozinhos. O sinal para o início das aulas soou há quase vinte minutos, mas ele e eu estamos acostumados com detenção por atrasos. Na maior parte das vezes que isso ocorreu foi devido aos nossos encontros clandestinos nos lugares mais inusitados dessa escola. Muito mais do que eu, Benjamin adora viver perigosamente e às escondidas. Desde quando sua mãe me proibiu de vê-lo quando éramos crianças, encontrava maneiras de ir escondido à sua casa todos os dias. A sensação de que poderíamos ser pegos fazendo algo proibido era a liga da nossa amizade. A partir daquele dia, ele me convenceu que era mais divertido todos acharem que nos odiamos.

— Estou cansado dessa cidade e todas essas pessoas, Lyno. — Sua voz é terna, como se fosse capaz de canalizar toda a energia do mundo. — O que você acha de uma jornada pelo Oriente? — Sua voz empolgada me deixa ainda mais atento às suas palavras. Concentro-me nos seus olhos encarando-me pelo espelho do banheiro. — Não seria incrível deixar essa cidade e viver como pessoas completamente diferentes em outro continente?

— Certamente, mas tenho me empenhado para deixar essa cidade há anos e meus pais sempre encontraram formas de impedir. — Relembro-o, mas há algo em seu olhar que me garante que tem mais convicção das suas palavras do que transparece. Conheço Benjamin profundamente e sua aparência de garoto inocente é seu álibi perfeito para as inúmeras travessuras que já fez. Muitas delas, inclusive, eu fui responsabilizado. Mas tudo bem, porque somos parceiros. — O que você tem em mente? Por que falar sobre isso agora? Até onde sei, sempre foi tragicamente apaixonado por Lie Place.

— Eu era. — Diz sutilmente. — Mas tudo mudou. Meus pais estão mais implicantes do que tudo e, honestamente, somos grandiosos demais para as amarras desse lugar. Há anos você me alerta sobre isso e somente agora percebi. Preciso de mais, Lyno, e tenho um plano infalível para nos tirar sem rastros de Lie Place. Com sua determinação inescrupulosa e a minha sutileza ácida, ninguém pode ficar no nosso caminho para a liberdade.

— Definitivamente, participo de qualquer plano que tenha como objetivo a nossa saída daqui. — Falo empolgadamente e fico atrás dele enquanto nos encaramos pelo espelho.

— Ótimo. Será o maior jogo que já fizemos. Aposto minha vida que será memorável. — O sorriso que me lança caminha entre dois extremos: repleto de felicidade e beirando à insanidade. Não sei dizer exatamente como, mas certamente é essa dicotomia alucinógena presente em todos os seus atos e pensamentos que me enfeitiça piamente.

Nos próximos dias, Benjamin e eu não nos encontramos mais no banheiro ou em qualquer outro lugar. Enquanto ele termina de amarrar as pontas soltas do nosso plano, me certifico de aprofundar minhas pesquisas sobre os segredos dos meus pais, da família Wilkinson e do prefeito Jeremiah. Essa é minha especialidade: brincar com a vida das pessoas como se fossem bonecas colecionáveis, mas, em certa medida, também descartáveis. Dominei a arte de esconder minhas fraquezas ainda na infância e, enquanto fazia isso, desenvolvi um talento nato para ver o que as outras pessoas fazem quando acham que ninguém presta atenção.

Mais uma semana depois, entro com o carro na garagem de casa após voltar da festa no campus universitário. Atravesso a porta e caminho lentamente pelo corredor quando ouço vozes graves vindos do escritório do meu pai. À medida que me aproximo, reconheço o timbre: é o prefeito da cidade. As frases que dizem são bastante desconexas, mas parece uma briga entre os dois. Às duas da madrugada? O que poderia ter acontecido de tão urgente e sério para ele vir à minha casa tão tarde? Mal tenho tempo de processar o pensamento quando os passos vindos do escritório ficam mais alto. Me afasto rapidamente e fico escondido atrás da coluna à esquerda.

O Renitente - O Preço da MentiraOnde histórias criam vida. Descubra agora