ESCOLHAS

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Aparentemente quando um capitão informa no quartel que o filho sofreu um acidente enquanto estava indo na padaria de bicicleta, este mesmo filho não precisa apresentar nenhuma atestado para justificar a ausência no trabalho durante a semana.

Afastado do quartel durante a recuperação, fui obrigado a ficar em casa trancado no quarto para não correr o risco de esbarrar com o meu pai, minha mãe trazia as refeições, sempre com um olhar de culpa misturado com um leve tom de desprezo, era imperceptível, mas eu conseguia sentir ali.

_ Mamãe mandou avisar que está te esperando – falou o Eduardo enfiando apenas a cabeça pela porta do meu quarto.

_ Eu já falei que vou de ônibus – bufei e voltei a amarrar os cadarços da bota.

_ Mano para de ser teimoso – recomeçou ele aquela discursão já entrando no meu quarto e fechando a porta devagar atrás de si.

Eu não estava mais com disposição para discutir, continuei amarrando o cadarço da bota sem a menor pressa, eu estava com tempo, mesmo que tivesse que andar alguns quarteirões até a parada de ônibus mais próxima, me levantei e peguei a mochila que estava jogada na cama, quando passei pelo espelho me virei e dei uma conferida no bumbum, senti o olhar do meu irmão pela nuca, mas quando me virei pra ele o Eduardo olhava pro chão tentando disfarçar a vergonha, fui em direção a ele e só quando eu parei em frente a ele e coloquei minha mão direita em seu peito esquerdo que ele me encarou.

_ Eu já me decidi, não quero essa droga de emprego, mas hoje ele é a maneira mais fácil que eu tenho de conseguir pagar um aluguel – senti o peito por baixo da camisa regata que ele usava, era um dia quente como todos os outros na nossa cidade – então é melhor me acostumar a pegar ônibus.

Dei dois tapinhas no peito dele e o deixei no meu quarto, saí com minha mãe gritando atrás de mim que eu nunca tinha andado de ônibus, que iria me perder e que era perigoso ainda mais no "meu estado", sim ela baixou um pouco a voz quando disse "meu estado" como se eu tivesse com alguma doença e que se ela falasse alto demais poderia estourar algum tumor em algum lugar, eu parei e senti ela parando também, por um segundo pensei em gritar que era gay para os vizinhos todos ouvirem, tenho certeza que a dona Dolores do número 16 estava parada na janela da cozinha ouvindo a conversa e iria adorar soltar uma indireta no grupo do condomínio, então suspirei e continuei andando em direção à portaria, quando chegasse lá perguntaria pra que lado ficava a parada de ônibus.

O primeiro que encontrei no quartel foi o mais furioso ainda tenente Braga, que já veio me informando que eu iria ficar de serviço todos os dias que fosse possível me escalar, e me mandou me arrumar para o treinamento, sim eu voltei no pior dia possível, fui direto para o vestiário colocar a roupa adequada e dei de cara com o Felipe, ficamos nos escarando por um instante.

_ Olha, me desculpe não ter te mandado mensagem – começou ele.

_ Não tem problema – falei dando passagem para um cadete que eu não lembrava o nome sair do vestiário, o Felipe já tinha trocado de roupa, mas mesmo assim entrou no vestiário atrás de mim.

O vestiário estava vazio, com exceção de nós dois, ele deve ter percebido a minha hesitação em tirar a roupa na frente dele então falou.

_ Na verdade João, eu queria pedir desculpas mesmo pelo que aconteceu lá, você sabe no acampamento, eu sei que fui muito precipitado, não deveria ter feito aquilo – então ele estendeu a mão em minha direção e deu o melhor sorriso que tinha – amigos?

_ Acho que sim – sorri de volta.

_ Então é melhor se trocar logo porque estamos atrasados.

SENHOR! SIM SENHOR!Where stories live. Discover now