O barulho

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- Uma vida sem o Silêncio -

Me acostumei com o barulho do alarme e a todos que gritavam meu nome, as conversas com estranhos na fila do caixa do supermercado. Eu até comecei a escutar as pessoas falarem "Rita esta mais comunicativa, você não acha?" O Silêncio tinha me largado, tive que preencher esse vazio deixado. No Silêncio eu costumava conversar comigo mesma, já que ele não me respondia. Eu era capaz de entender às respostas apenas me ouvindo perguntar.

Mas é agonizante e um pouco aterrorizante, todos os meus pensamentos gritam quando estou sozinha e as vezes eles não se calam quando estou acompanhada. É uma briga constante entre mim e as pessoas falando e enfiando mais pensamentos dentro da minha cabeça e os pensamentos que já estão aqui. Comecei a falar acelerado, coisas que as pessoas não entendem e coisas que nem eu mesma entendo. É sufocante viver assim.

Ao invés do Silêncio me perseguir por todo o dia, agora eu carrego um Barulho incessante, ele não costuma parar, ele não diminui. Estou ficando tão cansada. Procurei pelo Silêncio mais uma vez por toda à casa. Mais uma vez não o encontrei.

Tão frustada me lancei sobre a cama, olhando o teto. O barulho permanecia, me contorcia por toda a cama gritando com o rosto no travesseiro, fiquei alguns minutos brigando com o Barulho. Quanto mais eu gritava mais ele gritava de volta.

Me questionei "será que devo caçar o Silêncio?"

Fui interrompida com um barulho vindo da porta

- Filha?

- Oi, esta tudo bem! Só estou tentando encontrar o silencio ?

- Silencio ? Você esta gritando ! Acredito que o silencio se assuste com esse tipo de comportamento.

- Abri a porta - Mãe você sabe como eu posso encontrar o silencio ?

- Você não esta bem , como assim achar o silencio?

- Ok, eu pareço uma louca - Fechei a porta novamente - Eu estou louca - me joguei sobre a cama mais uma vez -

Adormeci e mais uma vez me levantei sobre o despertar do barulho que já não era somente o despertador.

Estava decidida a caçar o Silêncio. Me levantei e já fui colocando o fone, pesquisei por músicas de meditação, fiz respirações pausadas, me exercitei, tomei chá ao invés de café, fui a escola de bicicleta.

Experimentei o vazio por alguns instantes, mas logo o Barulho apareceu novamente. Por todas às aulas fiquei em silêncio, mesmo com o massacre do Barulho me atormentando.

Quando larguei, peguei minha bicicleta e fui ao parque, sentei sobre a grama e fiquei por algumas horas apenas olhando o céu, suas constantes mudanças em frações de segundos, às pessoas passando, e os pensamentos aleatórios estavam com tudo "porque alguém é capaz de caminhar essas horas?" "será uma regra que toda pessoa que se exercite precise usar alguma roupa no tom neon?" "olha esse sapato verde limão!" "porque essa senhora correr mais rápido que eu?"

São tantos pensamentos, tantos barulhos. Saí daquele lugar e fui até o parquinho das crianças, sentei no balanço. Naquela ausência de crianças pensei que talvez seria mais fácil encontrar o Silêncio lá. Fiquei observando todos os cantos, ainda com aquele amontoado de barulho, fechei os olhos e me concentrei nos movimentos de balanço como se minha alma estivesse se deslocando de dentro pra fora de acordo com o descer e levantar do balanço. E fiquei em completo silêncio, sentindo a sintonia da minha alma e do meu corpo, todos os pensamentos apenas se redirecionando para o pensamento de estar conectada a minha alma. Durou muitos minutos.

Mas me toquei que precisava estar de volta em casa antes de escurecer, peguei minha bicicleta de volta e percorrir todo o caminho com a mente em vários lugares, os barulhos dos carros se entrelaçavam no barulho da  minha mente. E lá se foi mais uma vez a chance que tive de me reconectar ao tão procurado Silêncio.

Estava tão cansada de lutar contra esse barulho que deixei para lá.

Quem sabe amanhã eu o encontre!

RITA A CAÇADORA DE SILÊNCIO Место, где живут истории. Откройте их для себя