Capítulo 4

222 29 3
                                    

Na terça-feira, me vejo obrigada a cumprir a carga horária total de trabalho na oficina. E na quarta, chego em casa tão cansada que tiro um não tão breve cochilo, antes de desabar em frente à escrivaninha para lidar com toda a enxurrada de conteúdo ministrado pelos professores nos últimos três dias. Havia adiado ontem e agora já possuía uma infinidade de assuntos para revisar, mas só conseguia pensar em ficar deitada pelo resto da semana.

No fim, acabo arrastando toda a tralha pendente comigo até o colchão. Ao menos desse modo me sentiria mais confortável. Horas mais tarde, de bruços com o caderno aberto e o dever de sociologia ainda incompleto, o observo sem a mínima disposição e decido não terminá-lo por hoje. Tecnicamente a entrega seria para a próxima sexta, entretanto, com dois dias ainda pela frente só podia imaginar que se não eliminasse as obrigações ainda nesse fim de semana, ficaria impossível cumprir tabela em tempo recorde. E eu tinha uma reputação a manter.

Levando isso em consideração, bufo e reabro o caderno. Tudo bem. Era verdade que eu fazia parte do ranking de melhores estudantes desde a época de caloura, mas sempre fui uma negação na matéria. Além do mais nosso novo professor, Sr. Garcia, também não facilitava o aprendizado. Era do tipo que esperava de seus alunos uma conexão profunda para com o conteúdo e elaborava perguntas capazes de gerar uma tese de faculdade.

Em qualquer outro dia, enviaria uma mensagem pedindo as respostas de Zoe, pois ela ao contrário de mim possuía muita facilidade em despejar aquelas baboseiras que preenchiam folhas rapidamente. Mas justo hoje? Difícil.

O Sr. Di Martino atuava como cirurgião plástico fora dos Estados Unidos, enquanto que a Sra. Di Martino era a editora-chefe de uma revista de moda em ascensão. Ambos super atarefados, então os momentos em família estavam sempre em segundo plano. Poucos eram os dias nos quais conseguiam coincidir horários para um jantar, por exemplo. Mas ao menos os pais de Zoe se esforçavam para que essas ocasiões acontecessem. Esta noite sendo uma delas, aliás. Sabia bem a importância que tinham. Era algo que ambas sempre possuímos em comum. E também a razão do porque eu jamais ousaria interferir... Ou assim pensei, pois, quinze minutos se vão até que recebo uma ligação da mesma.

— Seu pai está em casa? — Ela pergunta no segundo em que atendo.

— Não, pra variar. Por quê?

— Blake se meteu em alguma merda séria. Estou indo buscá-lo.

— O que aconteceu?

A propósito, não era a primeira vez que recebia esse tipo de ligação. Mas levando em conta os eventos de sexta, imaginei que demoraria um pouco mais até que ele se envolvesse em problemas outra vez.

— Apostou numa corrida de rua e agora deve dinheiro pra algum imbecil miserável. O cara não vai deixar Blake sair até que o pague.

— Como ele foi parar numa corrida de rua?

Tinha ouvido sobre as corridas ilegais no condado de Santa Barbara antes, mas nunca dado atenção de fato. Ninguém que conhecia jamais havia ido até uma.

Zoe cai em silêncio. — Muita coisa aconteceu durante o verão com Blake. O comportamento dele anda estranho já há algumas semanas.

— Pode ser mais específica? — Questiono enquanto ainda procurando meus tênis e xingando Blake mentalmente, por sempre acabar nos arrastando em conjunto para suas pequenas aventuras.

— Agindo em segredo, checando o celular a cada dez segundos, desaparecendo por dias... Mas nunca mencionou corridas de rua antes.

— Por que não disse nada durante nossas conversas pelo FaceTime?

— E faria diferença? É tudo sobre aquelas malditas apostas dele. Juro, qualquer dia vai acabar morto por isso.

Blake possuía uma certa obsessão com jogos de azar. Tanto que no aniversário anterior planejou uma viagem até Las Vegas ao lado de Zoe, Eric, eu e mais oito amigos. O aguardamos por horas na boate enquanto ele gastava uma quantia imensa no cassino próximo. Arrastou o dobro logo de início, mas então perdeu tudo na fase seguinte. E continuou a madrugada inteira, parando apenas após esgotar o último centavo em sua conta. Fazendo com que o Sr. Talbot tivesse de viajar ao local para livrar o pescoço dele pela manhã. Depois desse episódio, os pais o ameaçaram levar à um centro de reabilitação e ele prometeu abandonar o vício. Há alguns meses não ouvia sobre novas ocorrências desse tipo. Mas pelo jeito, foram só palavras.

Nunca Previ Você » noanyWhere stories live. Discover now