Cian

16: Líder

Ele havia desmaiado. Achei até que estivesse morto antes de checar sua pulsação, que também não estava das melhores.

Com dificuldade, coloquei-o sentado no chão para trancar a porta, arrastando-o até a praia. Minha respiração estava ofegante,mas a adrenalina tornava um pouco mais fácil para carregar seu corpo incrivelmente pesado. "Graças a Deus não tem ninguém por perto..." Agradeci mentalmente: não seria nada fácil explicar por estava carregando o corpo de um homem desmaiado e, possivelmente, quase morto.
Já com as lágrimas escorrendo pelas bochechas, arrastei Cian até a água, permitindo que minhas roupas se molhassem, engolidas pelas águas, já não tão azuis,da praia inundada pela escuridão parcial da noite que chegaria a pouco. O desespero começou a a me corroer quando seus olhos não se abriram. Fui em direção às águas mais profundas, mergulhando agarrada ao seu corpo, que foi mudando a temperatura.

Finalmente vi seus olhos azuis se abrirem, iluminados pelo pouco brilho que o mar ainda tinha antes do cair completou da noite. Então ele gritou e grunhiu,um grito estridente que durou até ele se transformar inteiramente. Percebi mais detalhadamente sua cauda se mover para frente e para trás, como uma dança. Cian sorriu, colocando a mão no próprio peito e depois no meu.
Sorri de volta, agarrado-o e puxando seu corpo escorregadio em direção ao meu. Aparentemente muito surpreso,o tritão fixou seus olhos nos meus, tocando meu rosto. Então,ele me abraçou novamente, logo se separando.

Ele deu um último sorriso antes de nadar rapidamente para longe. Notei que já estava prendendo o ar a muito tempo, então voltei a superfície, dando uma última olhada no mar antes de pensar em voltar para casa.

🌊🌊©️🌊🌊

Cian nadava rapidamente em direção aos outros de sua espécie. Ele não sabia,mas duas delas haviam visto seu momento de carinho com a humana poucas horas antes. Que nojento!! Como o futuro líder da tribo estava tão envolvido com assassinos?! Neres e Vite,as sereias que presenciaram esse fato, alcançaram sem muita dificuldade,o tritão:

-Vimos você.-Vite afirmou em uma língua de sinais que só pertenciam àquela espécie.

-Não sei do que está falando.-Ele respondeu da mesma forma. Neres chiou, mostrando as pressas. O que fez Cian repetir o ato para a companheira de tribo.

-Eles pegaram Nahala.-Ela disse em lamúrias.

-Eu sei!!! Já disse que irei encontrá-la.

-Você será o líder. Nahala vai morrer, como sua mãe!!!-Vite destilou o veneno, fazendo com que Cian agarrasse sua garganta com olhos de fúria. Apertou até a cauda dela balançar mais rápido.

Quando se cansou de vê-la agonizar,a soltou com um sorriso mortal:

-Eu não sou seu líder. Nahala vai voltar! A humana Aolani é amiga. Ela me levará até a líder.-O tritão cuspiu, nadando rapidamente para longe das duas sereias inconformadas, que se entreolharam sem saber o que fazer a seguir.

🌼 Aolani 🌼
...

Acordei como se tivesse sido atropelada por um trem. Cian ainda não voltou do mar, consequentemente, os pesadelos me assombraram novamente. "Já estou dependente de você, Cian." Falei mentalmente, coçando os olhos enquanto dava um longo e pesado suspiro.
Lavei o rosto sem vontade alguma de trabalhar. Tomei banho frio para "acalmar os ânimos", porém, não adiantou muito. Sem esperança alguma,me vesti e prendi o cabelo em um rabo de cavalo baixo, logo indo até a cozinha para tomar café.
Me assustei ao me deparar com "meu tritão favorito", andando de um lado para o outro,sussurando em uma língua estranha:

-Oi, por que não veio pra casa?-Perguntei com um sorriso.

-Essa não é minha casa!-Ele apertou os dentes, franzindo as sobrancelhas. Arregalei os olhos, não esperando por essa reação. Vendo meu semblante assustando,Cian suavizou os traços, suspirando.-Desculpa. Não quis descontar em você.-Ele se aproximou, tocando minha cabeça e me abraçando em seguida. Sentir seu corpo, agora quente, em sua forma humana,me fez fechar os olhos instintivamente,como se eu acabasse de entrar no paraíso.-Preciso encontrar minha irmã! Rápido!-Ele exclamou,se separando de mim.

-Eu vou ajudar,vou tentar saber onde ela  está.-Afirmei, estranhamente tímida.

-Obrigada. Meu povo precisa dela, estamos sem um líder,e querem me colocar no lugar dela.-Ele se sentou à mesa, abaixando a cabeça. Peguei alguns pães e manteiga,me sentando ao lado dele.

-Por que você não quer ser o líder?-Perguntei, passando manteiga no pão e o fechando.

-Não posso. Não quero fazer isso... significaria... que ela se foi...-Sua voz saiu baixa e melancólica.

-Acho que significaria que ela te treinou bem.-Afirmei depois de morder o pão. Ele sorriu fracamente, fixando os olhos em mim,me fazendo ser engolida por aquele oceano azul em sua iris.

-Mas eu ainda preciso dela.-Ele terminou, olhando para o nada.