INTRODUÇÃO

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Eu realmente não acredito que meu pai havia feito isso comigo. Já não bastava a situação que ele havia deixado a nossa família, mas agora ele me barganhar como uma mercadoria? Me obrigando a entregar minha vida e o meu coração para alguém que eu não amo. Eu estava destruída, meu peito doía e a tristeza me sufocava, as lágrimas estavam ali mas não caiam e tudo que me restava era uma dor de cabeça insuportável.

Antes de que eu possa continuar contando a vocês como meu pai tirou nota 10 em ser um grande traste, permitam que eu me apresente. Sou Any Gabrielly Rolim Soares, pros mais próximos, Any, tenho 17 anos e atualmente moro com minha mãe e minha irmã em um bairro escondido e perigoso no centro de São Paulo, mas nem sempre foi assim.

Minha mãe vive me contando histórias de como éramos felizes quando eu era mais nova. Na época nós tínhamos o suficiente para ter uma vida digna.

Meu pai era um grande apostador. Ele tinha um talento nato pra aquilo, e até um certo momento isso nos ajudou muito, mas já ouviram aquele ditado de que "Tudo que é de mais faz mal"? Pois é.

Com o passar do tempo meu pai ficou viciado em apostas, já não parava mais em casa e nem tinha tempo para familia, a sua vida era ficar nos bares apostando sem parar.

Até que derrepente, um dia ele parou.

Sem explicação alguma papai nunca mais apostou. Minha mãe desconfiada disse que sempre perguntava pra ele se estava tudo bem ou se havia acontecido algo, mas a sua boca permanecia fechada como um túmulo.

Estranhamente após o ocrrido, o tio Jeorge, um amigo de longa data do meu pai, passou a frequentar nossa casa constantemente acompanhado do seu filho.

A aparência deles deixava nítido que eles eram de fora. Ambos eram loiros da raiz da cabeça até os fios das sobrancelhas', e os olhos azuis eram tão claros e transparentes como a água da chuva. Sem falar que suas roupas aparentavam ser feitas feitas à mão.

Com o passar do tempo, acabei me tornando muito amiga do filho do tio George, ainda que, por algum motivo, ele nunca o havia deixado revelar seu nome.

Sempre que eles apareciam em casa, eu e ele brincávamos o dia todo no jardim como se não houvesse amanhã, nós até fantasiávamos que iríamos nos casar um dia. Nós éramos apenas crianças inocentes que não faziam ideia de que no mundo real as coisas não aconteciam da maneira que queríamos.

Quando eu estava para completar dez anos, minha mãe resolveu dar uma festa para comemorar meu aniversário, e como o tio George e seu filho estavam sempre em casa ela havia os convidado.

Mas para a surpresa dela e a minha eles não apareceram. Pensamos que podia ter acontecido algum imprevisto e por isso eles não tinham conseguido ir, mas uma semana havia se passado e eles não deram mais notícias.

Eu me lembro como se fosse hoje, todos os dias quando estava para marcar 13:30 no relógio eu ia para o portão de casa e ficava sentada no gramado do jardim esperando o Tio George aparecer com ele, e ali permanecia até escurecer, mas eles nunca apareciam.

Eu chorava todas as noites com saudade dele e minha mãe ficava sentada ao meu lado na cama me consolando até que eu adormecesse. Assim foram o passar dos dias e após dois meses sem noticias eu precisei aceitar que o tio Jeorge e o seu filho não apareceriam mais.

Quando cheguei aos meus 15 anos meu pai foi diagnosticado com AVC. Estávamos em casa rindo e conversando quando papai começou a reclamar de fortes dores de cabeça, enquanto um lado de seu rosto havia paralisado, minha mãe ligou para emergência e fomos todos para o hospital.

Ao chegar, o médico nos contou a situação e disse que o estado do meu pai era grave. Segundo o médico ele tinha apenas uma semana de vida, ou até menos.

Aqueles dias foram os piores. Ficávamos dentro do hospital dia e noite, e aos poucos, víamos meu pai perder a capacidade de comer, de andar e de falar. Um dia quando menos esperavamos, sua máquina que antes mostrava alguns morrinhos com alguns bips fracos, mostrou uma linha reta com apenas um bip ensurdecedor.

Ele morreu.

Minha mãe ficou desolada, ela estava completamente sozinha e como se isso não bastasse tinha acabado de descobrir que estava grávida.

O seu único consolo era saber que por conta das apostas, meu pai vinha guardando algumas economias em uma conta há alguns anos, então ela não precisaria se preocupar com dinheiro por um tempo e poderia focar em arrumar um emprego melhor, pelo menos era isso o que ela pensava.

Quando chegamos em casa depois de uma longa semana no hospital, começamos a receber chamadas de cobrança de todos os lados. Eram bancos, amigos do papai, nossos tios e até mesmo agiotas, todos atrás de dinheiro.

Minha mãe não fazia ideia do que estava acontecendo, e resolveu checar a conta poupança que tínhamos no banco só por segurança, só que para o desespero dela, estava totalmente vazia.

Minha mãe estava perdida e não conseguia entender como teríamos ido parar naquela situação.

Ela começou a investigar e a frequentar os lugares que o papai costumava fazer suas apostas, e em um deles ela encontrou um homem chamado Benjamim, ele era o dono do bar e afirmava conhecer muito bem o meu pai.

Em um de seus relatos, o homem teria dito que nunca havia visto alguém tão insano quanto ele. Disse que ele aparecia la com quantias absurdas de dinheiro como R$ 30.000,00 e apostava tudo sem pensar.

Minha mãe ainda sem acreditar, começou a ir ainda mais fundo. Estava checando tudo, extratos dos bancos, conversando com todos com quem papai havia pegado dinheiro emprestado, e no final descobriu que estávamos totalmente endividados.

Parecia que meu amadissimo pai, havia feito empréstimos nos bancos e estava devendo aproximadamente R$ 500.000,00.

Fora os R$ 50.000,00 que ele havia pegado com amigos e familiares, e para fechar com chave de ouro os R$ 80.000,00 que ele estava devendo para os agiotas.

Somando tudo estávamos devendo um total de R$ 630.000,00 e minha mãe não fazia ideia de como iriamos pagar.

A partir dali nossa vida virou um inferno, o banco tomou nossa casa para cobrir parte da dívida, e tivemos que vender o carro para pagar os amigos e a familia, que inclusive não deram a mínima para nossa situação.

Também fomos obrigadas a nos mudar uma vez por mês para que os agiotas não nos encontrassem. Basicamente nós sobreviviamos.

Como eu tinha apenas 15 anos não conseguia arrumar empregos registrados por ser menor de idade, então para poder ajudar a minha mãe procurei trabalhos de meio período e acabei com 6 deles.

Quando me sobrava algum tempo livre estudava em casa para o Enem, e estudava idiomas, desde pequena sempre gostei, até então eu era fluente em Inglês, Tailandês e Mandarim. 

Assim permaneci até meus 17 anos.

E cá estou eu, lutando para ajudar a minha mãe a quitar o império de dividas que meu pai nos deixou, e tentando passar em medicina para que a belinha - minha irmãzinha - que agora possuí apenas dois aninhos de idade, possa ter uma vida digna.

Nossa situação era péssima mas ainda assim levávamos a vida com alegria, tudo o que eu queria era restaurar essa família, mas eu não sabia que meu queridíssimo pai havia deixado mais uma surpresa preparada para nós. 

THE BEGINNING OF THE ENDWhere stories live. Discover now