CAPÍTULO IV

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Solidão e solitude
◈⊶⊷❁⊶⊷◈

Era a primeira vez que Miranda a recebia em sua casa. Tratando-se dela, era um verdadeiro símbolo de reverência.

Para o jantar, ela preparou um peixe regado com azeite e shoyu e temperado com ervas finas. Fazia muito tempo que ela não cozinhava para alguém, de certa forma, a refeição alimentou também sua alma.

Depois do jantar, ela pegou uma garrafa de vinho e duas taças enquanto Andrea aguardava na sala. A música ecoando no ambiente era a gravação tranquila de um piano, permitindo à jovem que seu coração permanecesse sereno ao som de Nocturne.

"Você gosta de vinho?" Perguntou Miranda, entregando-lhe uma taça.

"Eu não sei, nunca bebi antes."

"Às vezes esqueço que você só tem dezenove anos. Mas não tem problema, ficarei de olho em você a noite inteira, assumo essa responsabilidade."

Miranda piscou para ela e serviu o vinho em sua taça. Andrea começou a beber, primeiro devagar, experimentando a novidade. Ela pareceu gostar, já que o próximo gole não demorou a vir.

"Calma, menina, ou vai ficar alta muito rápido." Disse Miranda, rindo. "Eu acredito que você tenha algo para mim."

Andrea levou um instante para entender, mas logo recordou-se dos escritos que havia selecionado para mostrar a Miranda. Ela rapidamente pegou a pasta e entregou à mulher. Ficou bebendo em silêncio enquanto suas íntimas palavras eram lidas.

Demorou algum tempo, mas Miranda leu cada linha escrita, com sua expressão inescrutável e calma. Depois sorveu o último gole de sua taça e olhou para a jovem com certa contemplação.

"Você odiou, não é?" Perguntou Andrea, muito insegura. "Sim, eu vejo, você odiou."

"Eu não odiei, minha cara. Eu gostei muito, tem muita sensibilidade, fez-me desejar estar perto da morte."

"Isso é horrível!" Exclamou, horrorizada.

Miranda então começou a rir, e tratou de tranquilizá-la.

"Não, não é. É algo bom tocar as pessoas com a nossa arte. Você está em uma fase de inspiração mais sombria, deprimida e pessimista, o que não quer dizer que seja ruim. É claro que precisa de alguns ajustes estruturais, farei algumas anotações, depois podemos enviar para algumas publicações. Nada muito grande ainda, mas tenho alguns contatos que podem se interessar por seu material."

"Isso seria ótimo, Miranda. Sempre me perguntei se alguém um dia leria o que escrevo."

"Combinado, serei sua mentora de agora em diante."

Andrea sorriu brilhantemente. Ninguém nunca havia despertado interesse nela, a não ser por seus atributos físicos. Ela sentia: Miranda queria beber de seu cérebro, e não de seu corpo.

"Você vive aqui sozinha?"

"Sim."

"Não é solitário?"

"Às vezes."

"Você é muito evasiva quando se trata de falar sobre si mesma. Não é justo, já compartilhei tanto sobre mim."

Miranda esboçou um leve sorriso de lado.

"Você não disse que as respostas tinham que ser elaboradas. Eu não estou acostumada a falar sobre mim." Revelou Miranda. "Eu vivo sozinha desde os meus dezesseis anos, já me habituei a ser minha própria companhia."

"Tão jovem. Como isso aconteceu?"

"Eu me emancipei, acusei minha mãe de negligência e consegui acesso a herança deixada pelo meu pai."

O Amor e a Alma (Mirandy)Where stories live. Discover now