O que será de nós? Parte IV

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Ver aquela cena foi além do meu auto-controle, é mais que o evento, tudo isso regurgita uma lembrança ruim e apavorante. Foi assim que meu pai morreu, ele era bombeiro em Londres, entrou pensando ter ouvido uma voz e a estrutura desabou. Eu tinha pouca idade na época, mal lembro das feições dele, no entanto, acompanhei de perto os estágios do luto, presenciei cada choro nos cantos do estoque e, alguns anos depois, vi a gravação do noticiário. Inegavelmente, associo fogo em grande escala ao momento. Enquanto assistia o vídeo um sentimento desesperador tomou conta, pois, eu já sabia o desfecho, porque ele não voltaria, não pediria desculpas por chegar atrasado no meu aniversário.

Nós fizemos as malas, logo que chegamos do enterro simbólico, tenho 'flashes' desse dia, quando usei preto pela primeira vez. Recordo-me da fala paciente dela, explicando que íamos passar uma temporada na casa do vovô. Suponho ter dificultado um pouco, pois fui uma criança que pergunta muito, curiosa e vivia atrás dela.


☆ ☆ ☆


Um ano e alguns meses se passaram que havíamos nos mudado para essa remota cidade, muito longe de Londres. Eu já estava na escola. Recordo-me dos meus avós estarem entusiasmados no jantar falando muito sobre coisas que eu gostava. Balões e decorações coloridas. Tio Will compareceu, o único irmão da minha mãe, não era muito comum vê-lo em casa, menos ainda disposto a conversar. Apesar de tudo, era uma boa pessoa, foi quem me explicou assuntos de tecnologia pela primeira vez, abriu meus olhos para meu tema favorito hoje. Antes de aprender a ler efetivamente já sabia ligar, desligar e adequar quase tudo em casa ao meu alcance.

Talvez nossa família tenha azar relacionado a comemorações, quem sabe nunca possa estar perfeito demais, porque o dito jantar, véspera do aniversário da loja-matriz, está na lista das minhas memórias mais alegres.

Não me lembro das exatas palavras, mas enquanto conversava com meu avô, após a sobremesa, Will disse algo, risonho, fiquei sabendo depois que havia bebido vinho durante o jantar, o mesmo sempre foi fraco para bebidas. O fato é que, o comentário inoportuno, fez aquele senhor de rosto bege clarinho ficar vermelho. Não me lembro do meu avô com raiva antes, alterar o tom ou levantar do lugar bruscamente, a ponto de quase dar um soco na mesa e talvez só tenha tantos detalhes desse dia porque fiquei realmente assustada.

Minha avó foi rápida se ponto entre os dois antes que a discussão se tornasse algo maior. Não duvido, segundo minha análise anos depois, que teriam se atacado ali. Houve gritos, minha mãe segurou o tio Will, enquanto dona Alba apoiava a mão no peito do marido vermelho como tomate. Fiquei sentada na cadeira sem saber o que fazer, escutando e aprendendo novas palavras. Isso perdurou até que uma frase, afiada como um machado de lenhador, vazou dos lábios do anfitrião.

— Você só nos dá desgosto, parece que puxou tudo de ruim da família! — Gritou meu avô, em plenos pulmões. Foi quando Will se calou, parou tudo que fazia, o fitou breves instantes e saiu pela porta, transtornado, batendo-a com força. Meu avô subiu as escadas, seguido pela minha avó.

Que eu possa te alcançar...Where stories live. Discover now