Capítulo 25

2.2K 347 123
                                    



     153 anos depois


     A primeira coisa que sinto é o calor.

     Ah, calor...

     Quente, acolhedor, aconchegante. Um corpo humano carregando um coração humano que pulsa e que vive. Há quanto tempo não sinto esse calor? Quantas horas faz que estou dormindo? E o que pode ter conseguido se esgueirar pelo gelo até invadir as fronteiras do reino de Omem e me despertar dessa maneira?

     No instante em que o humano pisa em meu palácio, meu despertar se concretiza, provando a mim mesma que até meus feitiços têm limites e podem ser quebrados. Abro os olhos e fito meu exuberante lustre de gelo pendurado no alto do teto do principal salão do palácio, onde estou enterrada há... quanto tempo? Será possível que um dia inteiro se passou?

     Ouço passos e meu coração acelera.

     Há alguém aqui. Um humano de verdade. Não, não apenas um. Há mais deles e carregam algo consigo: tochas acesas com fogo brilhante. Há quanto tempo não vejo ou sinto o calor do fogo?

     Não me movo até que seja necessário, até que eles adentrem meu salão glacial e toquem as beiradas de meu caixão de gelo, fascinados. Quando veem que estou viva e olhando para eles, saltam para trás, espantados. Um deles derruba uma tocha e, ao entrar em contato com o piso de gelo, o fogo é consumido e apagado. 

     - Céus! - silva um deles, recuando com a tocha ainda acesa. - Alin disse a verdade. Há mesmo uma jovem adormecida aqui.

     Reparo rapidamente em seus rostos e suas roupas, achando curioso o modo como se vestem.

     - Pode nos compreender? - um dos homens aproxima o corpo com cautela. Suas sobrancelhas loiras estão franzidas e suas mãos tremem. Ele está com medo, mas algo o mantém aqui. Algo que deve trazido esses homens de muito longe até meu palácio isolado.

     Devagar, eu descongelo minha cama da morte e envolvo meu próprio corpo numa névoa gelada que me ajuda a ficar de pé diante dos homens. São quatro, muito magros e muito cansados. Devem ter escalado a montanha por dias e ficam apavorados ao testemunharem o uso dos meus poderes.

     - Não temam.

     Minha voz soa como se eu nunca tivesse parado de usá-la. Como se tivesse passado cinco minutos adormecida.

     Os homens arregalam os olhos quando me ouvem falar.

     - Quem são vocês e por que interromperam meu descanso? - pergunto. Estou verdadeiramente intrigada. Curiosa, até. Com que poder eles quebraram um feitiço tão poderoso?

     - Senhora do gelo!

     Eles ficam de joelhos diante de mim e fazem reverências encostando as testas no chão. Por um momento, sinto compaixão pelos desconhecidos - estão tão cansados que suas pernas mal suportam seu próprio peso. Com qual propósito chegaram tão longe?

     - Fomos enviados por Alin, a Grande Anciã do Último Clã Vidente do sul - diz o homem que deixou a tocha cair. - Ela... ela viu a senhora em suas visões e nos colocou em uma missão para encontrá-la.

     Olho para cada um deles, impressionada. É claro que apenas humanos com um toque de magia poderiam chegar até aqui.

     - Vocês são videntes - sussurro.

     Eles erguem as cabeças para olhar diretamente para mim e um deles - o que falou - confirma com um aceno.

     - Somos os últimos de nosso tipo, senhora. Estamos sendo caçados há cinquenta anos e a maior parte de nós foi morta. Alin, nossa anciã, teve um vislumbre de um futuro em que videntes estariam seguros aqui ao norte, no reino de Omem. Mas também somos caçados aqui...

[DISPONÍVEL ATÉ 09/05/25] Dever e Fidelidade #2Where stories live. Discover now