Desejos Entrelaçados

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Era hoje.

De regra, os guardas Volturi nunca tiravam férias. Nunca mesmo. Vampiros não precisam dormir, sentar, ou sequer fechar os olhos. Seu corpo pode ir para sempre, sem qualquer interferência além de sua sede. E até mesmo isso era providenciado dentro das paredes do Palazzo, raramente sendo necessário que qualquer guarda se aventurasse para fora da cidade ⎯ a não ser em missões oficiais, é claro. Férias poderiam ser pedidas, mas os motivos sempre estariam sujeitos ao deboche de Caius e ao escrutínio de Aro. E mesmo assim, essa era uma ocasião que nem mesmo eles se atreveriam a destilar contra. Uma vez por ano, durante uma semana, quando Alec e Jane exigissem sair, eles os deixavam. Não importa o quão desprotegidos poderiam ficar sem suas melhores armas, ou o quanto seus corações mortos se preocupassem com os dois, sozinhos em um mundo com cada vez mais inimigos.

Os gêmeos nunca aceitaram qualquer companhia, discreta ou não. Era seu direito, também. Uma parte tão pessoal, tão violentamente humana e dolorosa. Ninguém poderia ver, não mais do que Aro. Eles iam, capas esvoaçantes atrás de si, se embrenhando em um mundo que já tinha se esquecido deles, os pés traçando o caminho afundando e feito pelas suas pegadas.

Para a tumba antiga e paga pelo clã, eles mergulharam. Todo o caminho até sua antiga Inglaterra. Eles iam andando, os olhos atentos a qualquer coisa que valesse a pena olhar e pegar durante o caminho. Às vezes, conversavam. Às vezes, cantarolavam. Muito raramente sorriam. As espirais de memórias que os agarravam e eles tentavam agarrar ainda mais forte. Tudo foi a muito tempo e, naturalmente, não devia ser mais do que borrados em suas mentes. A transformação fazia isso, chegaram a conclusão. Em um esforço evolutivo para abandonar a vida humana, o fogo que os castigou e transformou no predador dos predadores também rasgou suas memórias humanas, enterrando as cinzas de suas antigas vidas muito abaixo do lodo do oceano.

Mas não isso. Não sobre isso. Nunca sobre isso.

Ficou preso neles, apesar de tudo. A dor os fazia lembrar, a raiva também. Eles tentavam, ao longo de toda caminhada, mudar a direção de tais sentimentos. Ela não gostaria disso. Não gostaria do ódio, da vingança, do sangue. Às vezes, eles se perguntavam se ela gostaria da criatura que haviam se tornado. De tudo que já haviam feito em nome dos Volturi, as espadas do clã, muito rápidos e afiados ao cair com precisão no pescoço de seus inimigos. Ela os odiaria? Gostavam de pensar que não. Gostavam de pensar que ela os amaria da mesma forma de antes, pois não houve um dia que ela não havia feito. E então mudavam de assunto, recuando ao invés de avançar, mergulhando e cavando com mãos que nunca se cansam, remexendo o lobo de suas memórias.

E eles lembrariam e lembrariam e lembrariam...

A família Corbyn era amaldiçoada, todo mundo sabia disso.

Para começar, o primeiro filho do casal havia sido uma mulher e todos sabiam que isso significava a própria maldição do demônio. E então, quando a criança abriu os olhos, todos viram a marca da bruxa: as cores amaldiçoadas de roxo e azul, mescladas em algo feito apenas nas profundezas do Inferno. Depois disso, seus pais sequer se preocuparam em esconder qualquer coisa e, ao invés de batizá-la com algum bom nome cristão, como Mary ou Madeline ou mesmo Abigail ou Anne, escolheram Elowyn. Elowyn. Um nome de bruxa, é claro, todos sabiam. De qualquer jeito, porém, sempre foi um motivo muito maior de pena do que de raiva, então eles os deixaram em paz com sua miséria.

Então a mãe ficou grávida, outra vez, e estavam todos curiosos para ver que criatura sairia de tal ventre putrefato. Os gêmeos nasceram tão condenados quanto sua irmã, mas desta vez levaram ainda mais desgraça, com a mulher que lhes deu à luz morrendo nem um ano depois. Ficou muito doente depois do parto, dizem, com as crias dos demônios tendo lhe roubado a vida. Na verdade, ela morreu de febre tifoide de um pedaço suculento de porco que comeu alguns meses depois, mas com Jesus Cristo tendo morrido apenas trezentos anos antes, ninguém realmente se importava com a verdade. Uma casa sem uma mãe é um colapso total, todos sabem disso, então assim não se pode ficar.

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⏰ Last updated: Aug 23, 2022 ⏰

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Carmesin PrataWhere stories live. Discover now