Ato I: A volta dos que não foram

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Lidar com os julgamentos e as expressões de pena quando você volta de um recesso não é nada fácil, principalmente quando você não é nada sociável ao ponto de interagir com os que trabalham fora do campo. Ele era um completo desconhecido ali, sabendo que mal parava em sua sala e vivia enfurnado em seu carro perseguindo os bandidos depois de uma longa investigação.

Ou seja, voltar ao trabalho nunca foi tão difícil.

A rotina seguinte seria focada em trabalhar em casos pequenos como averiguar denúncias e auxiliar na organização dos papéis, o que era totalmente entediante; não voltaria à ação das perseguições tão cedo e teria que lidar com a papelada que os esnobes detetives deixavam; era estranho, já que meses atrás ele era um dos esnobes. As coisas mudam e deixam uma desordem enorme que quase não é limpa.

Assim como o chão de sua mesa, aquilo ali estava uma nojeira. Não fazia ideia de qual foi a última vez que se prezou em limpar sua sala.

"Você é patético por esperar que façam suas coisas por você." Ele resmungou, se pegando falando sozinho em seguida. Ao olhar pela janela de vidro com a cortina semiaberta, percebeu que os colegas de trabalho estavam cochichando entre si enquanto olhavam para o interior da sala. As coisas iriam ficar bem difíceis. Era de se esperar, não é? Um novato que não era tão novo assim aparece depois de vários meses de recesso e, para piorar, era um estrangeiro. Além das condolências que pairavam nas expressões (e nas palavras ditas a ele, óbvio), era imperceptível não sentir todos os olhares intolerantes sobre ele.

Com seu belíssimo histórico com olhares, ele não ligou nenhum pouco. Não chegou àquela posição sem julgamentos precoces, o que poderia ou estava passando naquele momento. Seus valores estavam mais acima do que qualquer um naquele ambiente pudesse imaginar. E ele não estava nada a fim de expor isso num noticiário, mas seu parceiro sim.

— Feche a porta antes de fazer seu escândalo, por favor — pediu, sabendo o que viria pela frente após os pés intrometidos e saltitantes adentrarem a sala.

— Você não faz ideia do quão feliz eu fiquei quando soube que você voltou, cara!

O homem não hesitou em puxá-lo para um abraço, o que, certamente, não o deixou muito confortável. Relevou o ocorrido, afinal, tinha ficado em coma por um bom período e sem contato físico com as pessoas.

Foi uma ótima experiência, deve-se ressaltar.

— Pelo menos estou aqui, não? Mesmo que não seja de volta ao trabalho de campo.

— Vai ser melhor para você, imagino que ainda sinta dor.

— A dor de cabeça não me incomoda muito, só aquela sensação de vazio.

— Você perdeu a memória, Minho, não está totalmente recuperado — disse seu parceiro, fazendo o outro rapaz revirar os olhos com a fala. — Eu não sei que tipo de barganha você fez para conseguir voltar.

— Experimenta ficar em casa por longos meses, Pennie. Nos primeiros dias você muda todos os móveis de lugar e começa a dormir em um cômodo diferente 'pra ver se o tempo passa mais rápido.

— Cara, você é muito dramático. — Peniel gargalhou, sentando-se na poltrona confortável do escritório de Minho, que permanecia encostado na mesa. — Inclusive, sua casa é enorme. Você demorou para se acostumar com ela de novo?

— Não foi fácil, tenho que admitir. Demorei um bocado para me localizar dentro daquele espaço, que sinto vazio há tempos. Eu comecei a ter alguns lapsos de memória sobre minha casa e acabou facilitando o processo, mas nada tão gratificante. É como se eu desse um passo fora da estaca zero e voltasse em seguida.

Fora de ordem {LEE KNOW}Where stories live. Discover now