Sorrisos

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– Então, quer mesmo fazer parte?

– Sim – digo. – Estou decidida.

– Tudo bem. Mesmo que eu seja sua amiga, tenho que fazer alguns testes com você – ela avisa, me pedindo para acompanhá-la.

Caminhamos até o ginásio, onde todas as meninas da torcida estão nos aguardando, elas me devoram com o olhar. Ainda assim, sei que estou devidamente preparada, ensaiei bastante nos últimos meses.

– Primeiro passo – Tara arrasta um banquinho de madeira até o centro da quadra.

Ela respira devagar, e sobre nele. Num estalar de dedos, a garota encaixa o pescoço no laço da corda e chuta o banco sob seus pés, o que imediatamente a faz se debater com a falta de ar enquanto é mantida suspensa apenas pela corda. Todos assistem inertes, tento me mexer, levantar, mas as minhas pernas não saem do lugar. Jerry e os dois amigos estupradores surgem atrás da garota, observando Tara se matar calmamente e dão risada. As suas zombarias ecoam dentro dos meus ouvidos, e tudo vai escurecendo.

Ao desviar o olhar daquela cena cruel, vejo Ben sendo espancado pelos dois garotos de novo, eles o chutam sem parar, mantendo o foco dos golpes no estômago e no rosto. As lágrimas escapam do meu rosto, ao mesmo tempo em que grito para que parem, sem sucesso.

Tudo desaparece no momento em que meus olhos se abrem de uma só vez. Olho ao redor, a cama está com os lençóis remexidos, o travesseiro jogado no chão e eu completamente banhada de suor. Ou seja, mais uma noite normal. Os pesadelos estão cada vez mais frequentes. Pelo menos dessa vez não foi um que me fez chorar de verdade.

Ponho-me de pé, ignorando a foto da minha amiga falecida pregada na parede e vou até a a prateleira de livros e faço o de costume: leio os primeiros trechos da minha obra literária favorita. Não é mais como antigamente, não suspiro de paixão. Pensar no meu futuro marido, entretanto, tem se mostrado mais eficaz, o que é estranho. Normalmente, nós leitores nos interessamos mais pela fantasia criada nos livros do que na realidade. Se eu acabar morrendo no final ou ter um belo e melancólico fim, com direito a uma fala marcante é porque sou, de fato, uma personagem, penso, me divertindo.

Durante o banho, o que me vem à cabeça é a decisão do nome dos meus filhos com Ben. Emily e Harry parecem uma boa opção, é discreto e com boa sonoridade. Será que estou indo rápido demais? Espero que não. Aproveito para treinar um pouco e repetir em voz alta o que quero falar para ele. Não é uma boa ideia dizer um texto decorado, mas eu realmente não quero passar vergonha. Mesmo que não vá falar nada do que estou ensaiando, quando penso que tenho um plano, me sinto mais confiante, e é isso que me interessa. Por essa razão continuo praticando, apenas pela sensação de segurança que traz. Imaginar algumas situações com o Taylor também me deixa cabisbaixa, principalmente quando se trata do fato de eu não ter dito ainda que vi o que houve na festa. Ele lutou tanto para no fim ser ignorado e ainda ter que carregar essa verdade sozinho. Até mesmo Helena conseguiu dizer para mim, uma estranha, que acredita na versão da história da Tara e do Ben, e eu não.

Desço para tomar o café da manhã, ter esses pesadelos me faz querer ficar menos no meu quarto, consequentemente, não me atraso.

Ao cruzar o batente da cozinha, mamãe me segue com o olhar enquanto me aproximo e me sento.

– Bom dia, filha – diz, forçando um sorriso.

Logo de cara, percebo sua intenção de fazer uma conciliação forçada, visto que raramente recebo um "bom dia" dessa forma.

– Bom dia, mamãe – respondo sem muita animação.

Nossos olhares se encontram rápido, porém fujo dos dela. Desde o dia que recebi o tapa, ficamos ainda mais distantes uma da outra. Embora não seja algo que me agrade, não posso fingir que nada aconteceu. Sei que disse umas coisas bem pesadas para um coração de mãe ouvir, mas não fui eu a agressora, nem quem começou a briga.

Meu Amor Adolescente [Completa]Onde histórias criam vida. Descubra agora