CAPITULO 11 - LOCKE

149 37 0
                                    

Passo o rolo em cima da massa com força, esticando até ficar quase do tamanho da mesa. Ela é amarelada e pelo o que eu vi ela é para fazer biscoitos de canela, apesar de que ainda não vi ninguém colocando canela nela. Bellucci passa por mim apressado, com seu chapéu branco de confeiteiro, um avental diferente do meu porque ele é o chefe. Ele tira os óculos parecendo estressado antes de apoiar as mãos no balcão da cozinha enorme.

Eu preciso perguntar se está tudo bem, já que o meu trabalho é esse e não ficar abrindo massas e lavando vasilhas para ele.

- O senhor está bem? - Limpo as minhas mãos no avental.

Seus olhos faíscam quando olha para mim, duas lâminas afiadas em chamas. Se eu não soubesse que ele odeia todo mundo, acharia que o problema sou eu.

- Vá lavar as mãos. - Ordena.

Vou até a pia de madeira escura, lavo as mãos com sabão já me preparando para ser o substituto de alguém em algum serviço, depois volto a ficar na frente do homem. Ele caminha apressado novamente até o nosso segundo balcão, tira da geladeira dois bolos quase feitos e revira várias gavetas atrás de utensílios.

- O que exatamente eu vou fazer? - Pergunto, ainda o observando andar de um lado ao outro.

- Decorar.

Decorar?

Eu não sei decorar bolos. Eu nunca fiz isso na minha vida antes.

Bellucci me entrega uma espátula de metal, pega uma bacia dentro da geladeira com alguma coisa branca, tipo espuma e me encara com ansiedade.

- Rápido! - Indica o bolo e seu tom de voz fica exaltado. - Meus funcionários me deixaram na mão, eu preciso entregar dois bolos ainda. Decorados.

Já está em horário de almoço, por isso todos já foram embora. Eu sou o único que fica até alguém chegar e tomar o meu lugar, porque não podemos fechar o local completamente para o almoço.

Sem protestar eu imito o que ele está fazendo, passo a espuma branca no bolo, cobrindo tudo sem prática. Acho que ainda não é a coisa mais difícil. Olho para o lado e ele está alisando tudo com a espátula, deixando nenhuma parte marrom do bolo aparecer. Ele faz isso com a mão tão leve e uma atenção enorme. Na verdade, Bellucci não parece ele agora, está calmo e concentrado, não um urso zangado querendo quebrar tudo.

- Melhore, garoto. - Fala sem me olhar. - ainda está falhado na lateral.

Paro de observá-lo e volto ao meu trabalho. Pego uma espátula quadrada de metal que vi o Sr. Bellucci também usando. Passo em cima e nas laterais, até achar que terminei. Ele se afasta um pouco, observa o meu trabalho sem expressar nada, me deixando nervoso na espera.

- Bom. - vira de costas para pegar outras coisas no balcão de trás. - Agora é a melhor parte.

O vejo sorrir pela primeira vez, mas por algum motivo isso não me alivia.

É colocado na minha frente um vidro bisnaga, potes de vidro com coisas coloridas, frutas e flores. Levanto as sobrancelhas, sentindo as minhas mãos suando de ansiedade. Eu estou ansioso e não sei o porquê.

- O seu bolo é para uma senhora - Ele não me olha nos olhos e eu agradeço por isso. - Ela não me pediu algo específico, então apenas tente não deixar feio.

Limpo as minhas mãos no avental para tirar o suor. Começo pegando a bisnaga. Está escrito chocolate na tampa, então jogo no topo do bolo, fazendo como se fosse uma calda escorrida. Assim que o chocolate toca no bolo, ele endurece. Uma calda endurecida. Começo a colocar dois mirtilos, duas amoras, uma bolacha que está mais afastada de mim. Repito isso até contornar todo o bolo. Quando noto que estou me empolgando demais, dou um passo para trás e olho para a janela.

- O que foi? - Bellucci pergunta, enquanto raspa uma barra de chocolate em cima do bolo.

Aperto a ponta do meu nariz e me forço a voltar a decorar.

Certo. Só eu não me empolgar demais.

Encontro algo parecido com "grama" em um dos potinhos. Por algum motivo sorrio quando pego apenas três fiapos e faço um montinho em cada separação dos mirtilos.

- Não fica animado demais, precisa concentração para não deixar os enfeites tortos. - Ele avisa e então desmancho o meu sorriso, notando que passei dos limites.

Limpo as mãos no avental e flagro o Sr. Bellucci me observando, não parecendo nada com o homem estressado de antes. Limpo a garganta.

- Pronto.

Ele olha para o bolo agora, balançando a cabeça para cima e para baixo.

- Você tem talento, garoto.

Talento.

Levanto as sobrancelhas e observo o meu bolo. Todo branco com calda, uma mistura de cores escuras, como marrom e preto. Está... bonito. Com certeza um profissional consegue notar que não está perfeito, mas o Bellucci disse que tenho talento.

Talento.

Quando foi que eu escutei isso antes?

Passo a mão no meu cabelo, o jogo para trás em um movimento. Sinto meu coração batendo tão forte que penso ser algum tipo de adrenalina contida, minhas mãos não param de suar e estou nervoso.

- Vou para casa. - Arranco o meu avental, coloco ele no pino junto com todos os outros, depois passo disparado pela porta.

Não posso ficar me empolgando com essas coisas.

Qual é o meu problema?

Antes de Você Dizer Te Amo - Eva RabiOnde histórias criam vida. Descubra agora