ᏖᏒᏋᏕ

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— ℭantando mais uma vez, pequeno monstrinho?

É um deles, ele outra vez. Como sempre chega sorrateiro munido de provocações.

— Sabe que ninguém pode te ouvir, não é? Cantoria irritante e desnecessária.

Humano desgraçado, e ingênuo.

Mal sabe ele que quando canto, tenho a certeza de que me ouve, não importa a distância entre nós. Minhas ondas vocais nadam como enguias atravessando obstáculos e paredes até a quem está sendo dedicado, chega mesmo que em nota por uma fração de segundos.

Sei que quando canto você pode me escutar e essa é uma das coisas que me tranquilizam quando a ansiedade me bate forte nesse lugar asqueroso.

— Um dos experimentos deram certo, peixinho, seu sangue está sendo muito útil para nós. Mas, sabe porque venho, precisamos de mais.

Nunca troquei uma só palavra com esses energúmenos, desde que me capturaram não conseguiram arrancar nada de mim além do meu físico, que só conseguem a força. Presumo que o lugar em que estou seja no subsolo, os sons daqui são abafados. O aquário em que me colocaram recebe água salgada por dutos, não tem uma parte que me dê brecha. Toda vez que chegam para iniciar as sessões, eles esvaziam o aquário primeiro, e assim que minhas pernas surgem, abrem o vidro de cima, atiram-me tranquilizantes e me erguem pelos fios que me prendem. Eu só acordo cheio de dores e fraco.

São mais de trinta homens trabalhando no local, há militares entre eles. Mas, dentre esses, só tem um que consegue ser o mais podre de todos: Estevan. E é ele que se encontra aqui, montando, analisando fichas e se preparando para me arrancar mais extrações.

Ele aperta um dos botões de comando para esvaziar o aquário antes de vir até mim, com petulância, e me parece nervoso, mais do que de costume.

— Antes de começarmos, gostaria de ter uma palavrinha contigo.

Eu não o olho, continuo na mesma posição, sentado e curvado, escondendo minha cabeça entre os braços e a cauda.

— Preciso que olhe para mim, sua aberração! É sobre seu brasileirinho de merda que quero falar.

Ok, agora ele tem a minha atenção.

Levanto a cabeça devagar e olho diretamente em sem olhos, sem desmontar medo. Afinal, é o que ele sempre quer.

— Agora sim você me olha...bom saber o que lhe chama atenção.

Ele dá dois passos até a cadeira que beira o painel de comando e a arrasta até perto de mim, se senta diante o vidro, quase um metro de distância de mim.

— Não deve ter ideia do que está acontecendo fora daqui, não é? — ele dá uma risada debochada — É lógico que não...

Estevan se aproxima mais antes de continuar, arrastando a cadeira de ferro junto de seu corpo, que faz um som irritante demais pros meus ouvidos.

— Sabia que seu namoradinho está fazendo manifestações?

Meu coração repentinamente bate acelerado. Ao mesmo tempo que fico feliz em saber que você está bem, fico desconfortável e apreensivo pelo que acabo de ouvir.

— Ele conseguiu juntar uma galerinha que está a seu favor, tem feito uma bagunça em seu estado, na internet... — ele pausa e me encara nos olhos antes de prosseguir  — Porém, fique sabendo, isso só vai piorar a situação de vocês. Se ele comprometer nossa operação a coisa vai ficar feia para o lado dele.

Me movo brutalmente em direção ao seu rosto e bato fortemente meu punho no vidro. A raiva que sinto está me subindo, não admito que ele fale assim de você, muito menos nesse tom ameaçador.

ᴄᴇᴅᴏ ᴏᴜ ᴛᴀʀᴅᴇ • ᶜᵒⁿᵗᵒWhere stories live. Discover now