Prólogo

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Capítulo 1 – Eu.

Este romance pode não ser convencional, como qualquer outro, é complicado, e como uma impactante e marcante história de amor, não tem um final feliz.
Essa é minha carta pra você Morgana, nosso amor se tornou um livro. Eu ainda te amo, com todo "nosso" coração.

Antes

2003

Eu nunca entendi o amor, e também sempre tive medo de senti-lo. A primeira ideia de amor que muitas pessoas têm é dentro de casa, dentro da família, mas comigo não foi assim. Cresci vendo meu pai bater na minha mãe, e ela descontar essa dor em mim.
Mesmo assim, me arrisquei algumas vezes. Namorados vieram, e namoradas se foram. E em cada uma das vezes que me atrevi ao amor, me machuquei mais.
Agora, no auge dos meus 17 anos, tenho a mais plena certeza de que não posso me dar ao luxo de querer viver um amor verdadeiro. Porque ele não existe.

Sempre busquei a perfeição. Não importa como, e não importa onde, sempre fui uma aluna perfeita, mesmo com problemas, fui uma filha perfeita. E como era cansativo.
Para fugir daquela inóspita e cruel realidade, escrevia cartas. Não como as de Lara Jean, que escrevia para seus amores, mas sim, para as pessoas. Como se eu estivesse me despedindo. Porque a minha vida inteira foi uma maldita despedida. Ter saúde frágil é assim, não saber se uma simples gripe pode me matar.

O alarme do celular tocava, nada melhor do que "Ideologia do Cazuza" para acordar. Último dia. Últimas aulas, última visita à escola. Última vez como aluna.

"Meu partido
É um coração partido
E as ilusões
Estão todas perdidas

Os meus sonhos
Foram todos vendidos
Tão barato que eu nem acredito
Ah, eu nem acredito

Que aquele garoto que ia mudar o mundo
Mudar o mundo
Frequenta agora
As festas do Grand Monde
Meus heróis

Morreram de overdose
Meus inimigos
Estão no poder
Ideologia
Eu quero uma pra viver
Ideologia
Eu quero uma pra viver"

A verdade estava em minha frente, em duas semanas iria me formar. Ganharia meu diploma, e finalmente, poderia cumprir a profecia que criei para minha vida.
Finalmente poderia voar. E pra bem longe.
Olhando para o espelho, vendo-me, analisando cada pedaço do meu corpo, cada centímetro do meu rosto, olhei no fundo dos meus olhos verdes. Era inevitável não pensar em como tudo chegou aquele momento.

Eu nasci, vim de uma família de classe média alta, pais nada amorosos, uma mãe drogada, e um pai que gostava de espancar Eva, minha mãe. Cresci, aprendendo a me moldar sozinha, criei minha própria visão das coisas, vi meus limites, criei minhas barreiras, aprendi que o mundo não é tão colorido assim.

Com 13 anos, o motivo da minha maior desilusão aconteceu, meu pai foi embora de casa e vi minha mãe se afundar cada vez mais nas drogas. E me vi cada vez mais sozinha. Sem pais. Sem amigos. Fui diagnosticada soropositivo aos 14. Depois disso, nada mais foi igual. Mesmo assim, as minhas aventuras com o amor começaram, e cada uma foi mais dolorosa e cruel. Agora, me vejo com a vida totalmente planejada. Ainda sem pais. Ainda sem amigos, e determinada a não me apaixonar, porque aprendi que não vale a pena, me tornei impermeável.
Quem não sente o amor, não precisa sentir a dor.

Até agora, só vi como esse sentimento machuca e como ele pode se tornar ódio, rancor.
Descobri que sim, as pessoas mudam do dia pra noite, assim como eu. O barulho da porta me distraiu. Era a Eva, não consigo a chamar de mãe tem tempo, ela havia chegado mais uma vez bêbada, depois de ter enchido a cara no bar que fica na esquina de casa. Era assim. Eu saía, ela chegava.

Uniforme posto, sempre com o moletom preto para esconder as "cicatrizes".
A caminho da porta, vi a Eva jogada no sofá, com uma garrafa de Heineken na mão. Respirei fundo. E segui. Era estranho sempre me sentir sozinha convivendo com alguém, dentro da própria casa.

O sinal bateu, estridente e irritante. Com certeza, não sentiria saudades. Sempre gostei de me sentar na última fileira. Não tinha amigos, e duvido que alguém lembre de mim. A única pessoa que talvez se lembre é a Ana, uma garota do tipo padrão, sem graça, e completamente interesseira. Minha única "amizade", ou o mais próximo que tenho de uma.

" - Oiiii Morgana!" ela chegou atrás de mim. O problema da nossa "relação", é que ela não é pública. Simples, ela é popular e eu não. Logo ela não fala comigo em público, só quando extremamente necessário.
" - Oi. Precisa de alguma coisa?"
" - Como você sabe bem, preciso de ajuda na prova final de matemática. Se você puder... E não vai ser de graça, eu prometo! Vou te convidar para minha festa." Ela me entrega um convite rosa claro, bonito e detalhado. Clássico da "menina rica"
"- ah. Okay, tanto faz" falei botando o fone, preciso de música para aguentar meus dias.

"- Otimooooo, obrigada meu amor!" E assim como ela chegou, ela saiu. Funciona assim, não acho que ela seja uma má pessoa, só é uma pessoa que não tem problemas. É filha de um magnata rico, Alexsandro Dimmont, e ainda é inteligente, tem um irmão mais velho, que não estuda aqui, mas pouco me importo.

No fone, "cool kids - echosmith", que sinceramente, combina com o momento, é complicado pensar em como seria tudo mais fácil se eu pudesse ser como as "crianças legais", coloquei o volume no máximo, e só foquei em me desligar de tudo.

"In the fast lane, living life without knowing
And he says

I wish that I could be like the cool kids
'Cause all the cool kids, they seem to fit in
I wish that I could be like the cool kids
Like the cool kids

I wish that I could be like the cool kids
'Cause all the cool kids, they seem to get it
I wish that I could be like the cool kids
Like the cool kids"

Mesmo tentando ao máximo fugir da realidade enquanto estava na escola, sempre tive notas perfeitas, por isso, todos me conhecem como "CDF", não podia fugir dos olhares de pena e ódio, não podia evitar as zoações, não podia evitar de ir para aquele lugar.
As horas se passaram em segundos, e o dia se tornou noite. O último dia havia acabado. E por algum motivo, eu não me sentia diferente, nem mais alegre, ou coisa assim.
Saí da escola, enfiei todos os cadernos e livros - desnecessário - na mochila, parei por um tempo e analisei o convite. Adolescente. Eles buscam prazer em drogas, festas, bebidas, e eu nunca entendi o porquê.
Às vezes até adultos que não cresceram buscam prazer nessas coisas fúteis.
No caminho pra casa, ao som de "streets - AVIVA" via o sol se pôr, a rua deserta, à luz dos postes começando a acender.

"Don't ever walk alone, boy, alone, boy, alone, boy
(I'll find you)
Now you are on your own boy, your own boy, your own boy
I know where you will be hiding, there's nowhere to go
Yeah I know where you will be hiding"

Olhando para o lado podia ver os cachorros de rua passando. Às vezes me sentia como eles, perdida num lugar deserto e não sei pra onde fugir. Ainda vendo o convite da festa me perguntava como seria. "E se eu fosse?". Talvez ser – ou tentar – uma adolescente normal, por uma noite não seria tão ruim. 

Até Eu Partir - Até a ultima batida do "nosso" coraçãoDonde viven las historias. Descúbrelo ahora